Após perder brilho, gestoras veem momento oportuno para alocar em precatórios federais com decisão do STF

Mudança também pode ser boa para investidores de fundos que sofreram desde 2021 e que agora poderiam ver uma recuperação dos retornos no curto prazo

Bruna Furlani

Fachada do STF, em Brasília

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A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), anunciada no fim do mês passado, que derrubou alterações implementadas em 2021 sobre restrições ao pagamento de precatórios federais, promete dar novo respiro a um mercado que perdeu liquidez nos últimos anos.

A reviravolta deve incentivar mudanças na indústria: gestoras que alocam em precatórios federais (títulos de dívida do poder público que originam de condenações judiciais definitivas) voltam agora a olhar para os papéis com maior otimismo e acreditam que o momento é favorável para a compra.

“O Governo agora fica liberado para pagar os precatórios sem estourar o limite do teto e para pedir um crédito extraordinário para regularizar o estoque”, observa Leonardo Barbosa, sócio-fundador da Score Capital, ao comentar a decisão do STF.

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O executivo lembra que a promulgação das Emendas Constitucionais 113 e 114 — como consequência da aprovação da PEC dos Precatórios em 2021 — introduziu um novo regime ao estabelecer um limite ou “teto” anual para o pagamento dos precatórios federais entre 2022 e 2026.

Apenas parte da dívida vinha sendo quitada a cada ano – o restante era rolado para o ano subsequente.

A medida, conta Barbosa, fez com que um estoque relevante de precatórios expedidos deixasse de ser pago desde 2022, o que criou uma verdadeira “bola de neve” que fez o mercado de precatórios federais perder liquidez e o preço dos papéis recuar.

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“A decisão é boa para os dois lados. Os preços [dos precatórios] tendem a subir mais agora”, diz. “Também devemos ter um mercado mais ativo e estabelecido para quem vende e para quem compra, com mais previsibilidade”, acrescenta o profissional.

Por ter sido uma pauta que exigiu “grande esforço do Governo no alinhamento entre as diferentes instituições” para a aprovação, o executivo afasta riscos de eventuais reversões ao longo da gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

De olho nos potenciais de ganho e no menor risco oferecido pelos ativos, a casa disse que voltou a comprar precatórios, com foco em alimentares. A vantagem é que tais dívidas possuem preferência na hora do pagamento, porque originam de processos que discutem salários, vencimentos, proventos, pensões, benefícios previdenciários e indenizações por morte e invalidez.

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“Tem muito precatório disponível de 2022 e de 2023, mas já estou olhando precatórios do Orçamento de 2024, que ainda não estão em atraso”, destaca Barbosa.

O Ministério da Fazenda informou ao InfoMoney que agora caberá aos tribunais organizar uma lista de pagamentos e informar à Fazenda e o Ministério do Planejamento e Orçamento os valores para elaborar medida provisória (MP) para solicitar a abertura de crédito extraordinário.

A pasta, porém, não respondeu quanto tempo isso levará. Nos bastidores, a expectativa é de que a MP seja apresentada nos próximos dias, já que o pagamento estimado em R$ 95 bilhões deve ocorrer ainda neste ano.

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Novos fundos focados em precatórios federais

Quem também está otimista com a reviravolta vista no mercado de precatórios federais é a TAG Investimentos, que captou por volta de R$ 120 milhões em um novo fundo voltado 100% para precatórios federais no fim de setembro.

O foco da gestora está em precatórios alimentares entre R$ 150 mil e R$ 200 mil.

“Não paramos de comprar precatórios desde a PEC, o que fizemos foi diminuir a velocidade das compras”, diz. “Quando começou essa discussão sobre a votação no STF, refizemos a conversa com investidores já aguardando uma decisão”, destaca Roberto Dib, sócio e diretor de produtos estruturados da casa.

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Desde o julgamento do STF, que ocorreu no fim de novembro, Dib diz que já viu uma mudança no mercado: “Diria que já subiu 5% no valor do deságio desde então. Revisamos até mesmo a nossa tabela para conseguir originar mais precatórios”.

A casa é sócia da Precato, uma fintech que é responsável pela originação dos precatórios comprados pelos fundos da TAG Investimentos.

O executivo explica que a parceira aborda os detentores de precatórios, que costumam ser pessoas físicas, no caso dos alimentares, para ver se elas desejam negociar o título.

Caso haja interesse, o processo é analisado pelo jurídico da TAG. Se aprovado, os fundos da gestora terão permissão para realizar a compra do papel, conta Dib.

Momento oportuno

O momento também é visto como “oportuno” pela Strategi Capital, gestora que possui fundos que compram ativos em situações especiais.

Embora o foco da casa seja investir em precatórios federais para viabilizar transações tributárias de empresas que estão devendo à União e não alocar nos ativos para carregá-los na carteira, a gestora não nega que agora há uma clareza nos pagamentos e que o cenário parece mais promissor para essa classe de ativos.

“Antes tinha indefinição de que o problema seria jogado para frente e de que poderia não ter solução, agora temos uma clareza dos pagamentos”, avalia Cristian Lara, sócio-fundador da gestora.

Aumento de retornos no curto prazo

A mudança também pode ser favorável para investidores, com destaque para os profissionais (com mais de R$ 10 milhões em alocações financeiras), que costumam ser o foco desses produtos. Dib, da TAG Investimentos, lembra que fundos que estavam alocados em precatórios federais sofreram com a postergação do pagamento a partir de 2021.

Agora com a decisão do STF, o executivo avalia que, no curto prazo, tais fundos poderiam ter uma recuperação — com a possibilidade de antecipação do recebimento dos pagamentos, que antes estavam previstos para prazos mais longos.

“Já para os fundos que nascem agora nessa nova realidade, a visão é de que eles devem ter bons rendimentos, só que mais estáveis, entre 20% e 40% ao ano”, pondera o executivo.

Gestores que também souberam ser estratégicos durante a janela de incertezas também poderiam se beneficiar neste momento, defende Barbosa, da Score, apesar de acreditar que isso não representa a maioria das casas.

“Em geral, acredito que o mercado estava mais posicionado em casas que já vinham carregando uma carteira de precatórios e que sofreram com a PEC. Penso que teve menos gente que adotou uma visão oportunística”, acrescenta o profissional da Score.