Anbima revoga adesão da Vanquish, gestora que herdou fundos problemáticos da Infinity

Associação defende que houve alteração relevante no quadro societário da instituição; três fundos da casa foram liquidados e afetaram quase 6 mil cotistas

Bruna Furlani

(Getty Images)

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A Associação Brasileira das Entidades de Mercado Financeiro e de Capital (Anbima) informou na quarta-feira (20) que revogou a adesão aos códigos de administração de recursos de terceiros e de certificação da Vanquish Asset, gestora que herdou os fundos transferidos da Infinity Asset.

Em sua justificativa, a associação disse que a medida foi tomada após alteração relevante no quadro societário da instituição.

“A nossa autorregulação determina que mudanças no cadastro das empresas devem ser informadas e submetidas à avaliação. A Vanquish informou alteração completa no seu quadro de sócios e diretores em abril. Após tramitação, em junho, o caso chegou ao Conselho de Ética da Anbima, que decidiu por cancelar a adesão da asset”, destacou o documento.

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Dos fundos transferidos da Infinity para a Vanquish, foi aprovado um plano de liquidação em três deles. É o caso do Vanquish Pipa, Vanquish Coral e Vanquish Safira, segundo informações da própria gestora. Quase 6 mil cotistas foram afetados com a medida.

Em nota enviada à reportagem, a gestora disse que seus advogados tomarão as medidas judiciais cabíveis contra a decisão da Anbima, que teria sido baseada em “percepções”, o que “afasta a objetividade essencial à análise de processos”.

A Vanquish também pondera que não foi comunicada pela Associação sobre o problema, exceto quando pediu a reconsideração da decisão do Comitê de Ética e solicitou ser ouvida.

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“A decisão de reprovação da alteração cadastral da Vanquish mereceu destacada e inexplicável individualização, não se pautando pela esperada isonomia de tratamento e lançando ao público uma sombra de dúvida sobre a integridade dos sócios e administradores da Vanquish, o que causa graves impactos à sua imagem, razão pela qual faz-se necessária a adoção das medidas judiciais aplicáveis”, afirma a casa.

Dados mais recentes da Anbima informam que, em julho deste ano, a Vanquish possuía R$ 133 milhões sob gestão.

Repercussão

O caso ganhou repercussão depois que a Vanquish alegou ter tentado exercer as opções IDIs flexíveis montadas pela antiga gestora, Infinity, mas que não foram honradas pela contraparte.

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Opções IDIs são um instrumento utilizado pelo mercado institucional em que o principal objetivo é tentar “acertar” o ritmo de altas ou quedas de juros que será adotado nas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) até a data de vencimento do ativo.

Após assembleias conturbadas, os cotistas aceitaram também a extensão do prazo para que a contraparte liquidasse as opções IDIs flexíveis até o dia 12 de fevereiro de 2024, com nove meses de atraso em relação ao vencimento original. A garantia, nesse caso, seria feita por meio de uma Stand by Letter of Credit, ou SBLC, na sigla em inglês.

Conforme informações já apresentadas pela administradora dos fundos (a RJI Corretora) e pela própria Vanquish anteriormente, a contraparte não teria sido revelada. Em documentos enviados, uma empresa chamada ICP Ventures teria se apresentado como estruturadora, intermediária e contraparte do fundo no papel, mas teria dito que estava apenas representando um grupo empresarial atuante no setor de agronegócio, crédito de carbono e energia.

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A ICP Ventures é uma empresa de estruturação e consultoria do grupo Infinity. Um documento que identifica a ICP Ventures como contraparte é assinado por David Jesus Gil Fernandez, CEO e fundador da Infinity.

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) aberta para investigar casos de pirâmides financeiras convocou Fernandez para prestar depoimento. A defesa do executivo, no entanto, conseguiu mudar o caráter da convocação junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), o desobrigando de comparecer à oitiva que estava prevista para a manhã desta quinta-feira.

Quadro societário

A transferência dos fundos para a Vanquish ocorreu depois que a antiga gestora, a Infinity, foi afetada por um forte volume de saques impulsionados pela perda do selo da Anbima em dezembro do ano passado.

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Na época, a associação informou que a perda tinha a ver com descumprimentos de melhores práticas, como a realização de investimentos em violação aos limites previstos nos regulamentos; falhas no processo de acompanhamento dos riscos de crédito das operações realizadas nos fundos; falhas na administração de potenciais conflitos de interesses; falta de independência na área responsável por gestão de risco e compliance e falhas no processo de rateio de ordens.

Depois de adquirir e assumir parte das operações de gestão de fundos da Infinity, a Vanquish também incorporou os principais executivos da antiga casa.

A mudança está registrada em um dos documentos obrigatórios fornecidos pela Vanquish, que detalha alterações no quadro societário realizadas no dia 3 de março deste ano, com a administração da sociedade passando para os nomes de André de Godoy Perez Ximenez e Felipe Wada de Souza, que trabalhavam na Infinity Asset.

Outro documento divulgado em 4 de abril traz novas modificações, com a chegada de Fernando Paulo Pinheiro de Souza. Segundo o último relatório, Felipe Wada detinha uma participação de 5% no capital social da empresa, enquanto André de Godoy Perez Ximenez possuía 93% do capital social e Fernando Paulo Pinheiro de Souza detinha o restante (2%).

Segundo a Anbima, foi dado à Vanquish o direito de se pronunciar ao longo da análise da alteração cadastral. Em agosto, após reuniões com representantes da instituição, o Conselho manteve a negativa. Em 19 de setembro, foi formalizada a retirada da asset do quadro de aderentes aos códigos da Associação.

Processos na Justiça

Depois de todo o imbróglio, alguns investidores entraram com processos na Justiça contra as gestoras (atual e a antiga) e a administradora (RJI). Na visão do advogado Walter Xavier da Cunha Filho, que representa 20 investidores de fundos da antiga Infinity, os processos estão em fase de sentença.

Para o profissional, a decisão de seu Conselho de Ética da Anbima é “amparada pelo cumprimento de normas técnicas em observância com a boa política de governança”.

“A alteração relevante do quadro societário de uma asset com selo da Anbima sem a prévia avaliação da associação e com indícios de sucessão empresarial de outra asset excluída do quadro da Anbima, em tese, deve ser também analisada por demais órgãos reguladores do mercado”.