“Acreditei neles”: marceneiro perde R$ 120 mil na Xland, acusada de golpe com criptomoedas em ex-Palmeiras

Morador de Ribeirão Preto vendeu um imóvel e apostou R$ 120 mil na empresa investigada pelo MP do Acre por operar um possível esquema de pirâmide financeira

Paulo Barros

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Sem experiência anterior em qualquer tipo de investimento, Carlos Eduardo César, 34, viu em uma nova empresa indicada por um grande amigo a oportunidade de alavancar um novo negócio para sustentar a família. A promessa era tentadora: retornos que chegavam a 5% ao mês, o suficiente para fazer o marceneiro morador de Ribeirão Preto sonhar com um salto de vida.

Mas, tudo deu errado. Cerca de nove meses após realizar o aporte, Eduardo foi bloqueado de sua própria conta na Xland Holdings, empresa que diz trabalhar no aluguel de criptoativos para operações de trading. A companhia parou de atender saques em novembro e deixou um número ainda desconhecido de vítimas no Brasil.

Entre elas estão os jogadores de futebol Mayke, do Palmeiras, e Gustavo Scarpa, ex-atleta do clube: o primeiro diz ter perdido R$ 4,3 milhões na empresa, e o segundo, R$ 6,3 milhões, segundo ações judiciais às quais o InfoMoney teve acesso.

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Embora menor, o valor perdido por Eduardo representa boa parte de seu patrimônio: ele vendeu uma casa e dedicou R$ 120 mil ao suposto investimento.

“A gente vê muita gente que se dá bem, quem tem muito dinheiro faz dinheiro. Infelizmente como é algo muito novo, tem muito golpe, gente querendo enganar todo mundo. E acabou que eu caí nessa, e investi a maior parte do meu dinheiro”, contou Eduardo em entrevista ao Cripto+ (assista à íntegra no player acima). “Eu vendi um bem para poder investir e conseguir respirar um pouco, mas acabei me enrolando mais ainda”.

Promessas

A Xland oferecia pacotes de investimento com retornos que variavam conforme a duração do contrato – quanto mais tempo, maiores eram os pagamentos. A isca era não garantir um retorno fixo. Em vez disso, “assessores de investimento” contratados pela empresa mostravam um suposto histórico de ganhos para prometer rendimentos futuros, prática igualmente rechaçada por casas de investimento sérias, mas que acabou vingando em um público iniciante.

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Os retornos também poderiam variar, embora sempre em um patamar bem acima de qualquer produto de renda fixa comum.

“Eles disseram que não eram uma pirâmide, que usavam o dinheiro para trading, que ficariam com uma porcentagem do lucro e entregariam outra para mim”, comenta a vítima. “Eu vi que não havia nenhum processo contra a empresa na época, não tinha ninguém falando na internet. Só pessoas investigando se era pirâmide, mas sem êxito. Aí eu tive mais confiança ainda, e acabei investindo”.

De início, Eduardo optou por um contrato de um ano, com retornos que variavam de 3% a 3,5% ao mês. Após ver o saldo aumentando por alguns meses, a confiança no investimento cresceu e ele decidiu alongar o plano para um contrato de 18 meses – assim, impulsionando a rentabilidade para 5% ao mês, quase a metade da taxa Selic de um ano.

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Os problemas com o investimento começaram a aparecer após seis meses da assinatura do primeiro contrato.

“Nos três primeiros meses eu deixei lá lucrando, e a partir do terceiro mês comecei a pedir [resgates]. Veio o primeiro mês certinho e o segundo mês também. No terceiro mês já deu uma atrasada. Eles me falaram que iam reembolsar com juros, como [previsto] no contrato, e foi isso que aconteceu”, explica o cliente da Xland. “Porém, no quarto e no quinto mês [de saques], eles atrasaram, e também nos outro meses”.

Além de prometer altos retornos, a empresa estimulava aportes acima de R$ 100 mil com a promessa de seguros garantidos por pedras preciosas cuja existência ainda não foi provada, como meio dar aura de credibilidade ao investimento.

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“Eu pensei: melhor investir logo mais de R$ 100 mil para ter segurança, porque esse meio é de muito risco. Eu acabei acreditando por ter sido uma indicação, acreditei neles. Depois descobri que até existiu um seguro com a Porto Seguro, mas, por falta de pagamento, ele não estava mais ativo”, conta a vítima.

O rendimento seria usado para abrir uma academia de jiu-jitsu que acabou não saindo do papel. Primeiro, Eduardo começou a sangrar os lucros de sua marcenaria à espera dos pagamentos da Xland, mas depois foi obrigado a desistir do plano, romper o contrato de aluguel que havia firmado e entregar o ponto onde seria inaugurado seu novo negócio.

“Culpa da FTX”

Em meio ao desespero dos clientes, assessores da Xland começaram a ligar para dar explicações pela demora nos saques. A justificativa dada à época era de que os recursos dos clientes teriam sido movidos para a FTX, corretora que abriu falência nos Estados Unidos em novembro. As criptomoedas dos clientes, portanto, teriam ficado presas na plataforma.

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“Foi um choque pra mim, um balde de água fria. Me deu até dor de barriga. Perguntei para o rapaz que tinha me indicado e ele disse que também não entendia o que estava acontecendo. Estava todo mundo perdido”, conta Eduardo.

A Xland até pouco tempo não indicava utilizar a FTX, mas afirmou que teria transferido os recursos para lá em uma jogada mal explicada na esperança de que a Binance adquirisse a corretora rival. Embora mirabolante, a desculpa colou nos clientes, muitos deles iniciantes tanto no mundo dos investimentos quanto o das criptomoedas.

“Foi quando eu comecei a ir atrás dessa FTX, saber o que estava acontecendo. Eu não tenho muito conhecimento, não tenho tempo para estudar, tenho a marcenaria. E isso é muito novo, exige muito conhecimento. Aí eu fui pesquisar e vi que o buraco era mais embaixo”, explicou o cliente à reportagem.

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Medo de perder tudo

Eduardo ingressou com uma ação pedindo a restituição dos valores à Xland, uma empresa acusada pelo Ministério Público do Acre de operar um esquema de pirâmide financeira. Não há provas de que o negócio de fato adquiria as criptomoedas para operar, nem de que os criptoativos, se existiram, tenham sido de fato transferidos para a FTX.

“Passa pela cabeça [a possibilidade de perder tudo]. Eu nem gosto muito de pensar nisso, pra falar a verdade”, diz Eduardo.

Apesar dos sinais, ele ainda conserva esperanças de que a Xland não tenha de fato aplicado um golpe nos investidores, e que seu dinheiro possa ser devolvido um dia.

“Eu tenho esperança ainda de poder receber alguma parte. Eles falaram que estavam tentando buscar um empréstimo lá fora para honrar os pagamentos. E eles têm o espaço físico deles, tudo certinho”, comenta. “Quem cai em golpe só sabe quando tudo desmorona. Eu espero que não seja golpe. A única forma de não receber é que não seja golpe – se for, a gente não recebe mesmo”.

Paulo Barros

Editor de Investimentos