De olho no futuro, atletas olímpicos investem em busca de estabilidade

Esportistas estudam o mercado e diversificam aplicações para terem recursos em períodos de baixa e após o fim da carreira

Alexandre Rocha

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Em meio a treinamentos intensos e competições em sequência, atletas de ponta encontram tempo para estudar oportunidades de investimentos e diversificar suas aplicações.

Os objetivos vão desde ter estabilidade em épocas de vacas magras a garantir renda ou capital para empreender quando a carreira terminar. E eles desejam passar as experiências com uma boa gestão financeira para gerações mais novas.

“O atleta tem duas aposentadorias: a do esporte e a da eventual segunda carreira”, disse o assessor de investimentos Renzo Agresta, 36, sócio do escritório InvestSmart, agente autônomo da XP. “A primeira carreira é curta, dura de 10 a 15 anos, mas é o momento em que ele tem mais receitas. É importante ter consciência nesta fase, foco em tentar fazer um pé de meia”, acrescentou Agresta, que representou o país na Esgrima em quatro Olimpíadas.

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Isso é o que faz o ginasta Arthur Nory, 27, bronze no solo nas Olimpíadas do Rio de Janeiro, em 2016, e que vai competir novamente nos Jogos de Tóquio.

“Sabemos que a vida de atleta não é tão longa, então é importante buscar saber mais sobre investimentos, pensando no futuro e na estabilidade pós carreira esportiva”, diz Nory. “Não sou um grande conhecedor, mas eu acredito que nós temos que saber investir dinheiro”, ressaltou o ginasta, que tem Aresta como assessor.

Já a lutadora Aline Silva, 34, deseja levantar capital para empreender na área social. “Não tenho mais como garantir uma aposentadoria, então quero empreender, buscar lucro com foco no impacto social”, diz ela, a primeira brasileira a conquistar medalha em mundial de luta olímpica, uma prata, em 2014, no Uzbequistão.

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“Adoro empreender e me vejo criando soluções”, afirma Silva, que participou das Olimpíadas de 2016. Em Tóquio, vai disputar a categoria estilo livre, 76 kg.

O judoca Marcelo Contini, 32, já pensa na transição de carreira. A ideia do atleta pretende competir até o final de 2022. Contini aproveitou o tempo livre na pandemia de Covid-19 para estudar investimentos e fazer seus primeiros aportes na Bolsa de Valores. O judoca acompanhou ainda três cursos para se qualificar como encarregado de proteção de dados, atividade que, acredita, terá muita demanda frente à nova Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). “Eu não quero continuar a depender financeiramente do esporte”, afirmou.

Além do futuro, há preocupação em garantir o presente. Silva lembra que a carreira de atleta não tem a constância de um emprego fixo. Esportistas vivem de ajuda de custo, bolsas, patrocínios e premiações. “Não temos renda formal”, afirma. Não há como contar com verbas como as do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

“Atleta não tem carteira assinada”, diz a corredora Verônica Hipólito, medalha de prata nos 100 metros e de bronze nos 400, categoria T38, nas Paralimpíadas do Rio. “Você não sabe como vai estar no ano que vem”.

Na mesma linha, a jogadora de vôlei sentado Luiza Fiorese, 23, avalia que atleta tem que planejar suas finanças pensando não só no longo, mas também no médio prazo. “Hoje, eu tenho patrocínio. Mas, dependendo do momento da vida, a pessoa pode não ter nada”, afirma a atleta, que espera participar de sua primeira Paralimpíada este ano, em Tóquio. “É uma carreira instável”.

Onde investem?

Com variados graus de experiência no mercado, os atletas ouvidos pela reportagem investem seu dinheiro em diferentes produtos. Alguns são mais experientes, como Aline e Hipólito. Outros, como Luiza e Contini, estão começando. Em comum entre eles, está a preferência por carteiras diversificadas.

“Hoje, consigo investir numa carteira diversificada, desde renda variável, renda fixa e até imóveis”, contou Nory. Ele diz, porém, que prefere aplicações em renda fixa.

Aline tem recursos em previdência privada e renda fixa, mas destaca que, no momento, conta com pouco capital para investir, pois usou parte de suas reservas para quitar um financiamento imobiliário. Quando tiver mais dinheiro disponível, ela quer criar uma carteira com ações e ETFs.

“Adoro o mercado financeiro, mas ainda não tive tempo de preparar uma carteira”, diz Aline, acrescentando que seu perfil é agressivo. “Procuro dar mais peso ao maior retorno porque não tenho tanto para investir. Não faz sentido investir pouco em algo que rende apenas alguns reais, preciso tentar levantar capital”, comentou. Ela é entusiasta também de fundos multimercados.

Verônica Hipólito investe em renda fixa, ações, fundos imobiliários e criptomoedas. “Mas não estou muito segura ainda das criptomoedas”, diz.

“Sou apaixonada por dividendos e gosto de empresas que pagam”, afirma. Ela prefere papeis de “microcaps”, empresas com valor de mercado abaixo de R$ 1 bilhão, “small caps”, companhias de menor capitalização na Bolsa, e “value investment”, investimento em empresas com perspectivas de bons resultados e cujas ações estejam momentaneamente baratas, mas com potencial de valorização. “Sou conservadora, não gosto de apostar muito”, disse.

Contini informa que está com a maior parte de seus investimentos na bolsa, mas pretende diversificar quando tiver mais recursos disponíveis, aplicar em renda fixa que, ele acredita, voltará a dar melhores resultados com o aumento da Selic – o Banco Central promoveu três aumentos consecutivos na taxa básica de juros -, e manter um fundo de reserva com maior liquidez.

Recentemente, o judoca utilizou parte de seu dinheiro para renegociar um financiamento imobiliário. “Quando eu me capitalizar de novo, vou sair um pouco do risco”, afirmou. “Minha sugestão é: quem ainda não investe, comece!”, destacou.

Luiza formou uma reserva financeira e depois “flexibilizou um pouco”, investindo em criptomoedas. “Houve um ‘boom’ da [criptomoeda] Ethereum, mas depois caiu. Estou começando agora, mas não sei se consigo segurar a onda do risco”, diz ela, que tem aplicação também em renda variável com vistas ao longo prazo.

Empreendedorismo

Alguns atletas já usam dinheiro do esporte para empreender e esperam ter mais capital para negócios no futuro.

Nory, por exemplo, é sócio da Carú Café, cafeteria delivery com duas unidades em São Paulo. “Acho muito bacana buscar outras fontes [de renda]. Como atletas, nós estamos muito preocupados em treinar, mas é importante pensar em outros meios [de ganhar dinheiro]”, afirma.

Aline é fundadora da Mempodera, entidade que busca promover a igualdade de gênero por meio do esporte. A instituição funciona em Cubatão, no litoral de São Paulo, e oferece aulas de “wrestling” (luta olímpica), inglês e empoderamento para crianças e adolescentes de 06 a 15 anos.

“Me vejo criando soluções para problemas que vejo ao meu redor”, afirma Aline. A lutadora é ainda 2a vice-presidente da Confederação Brasileira de Wrestling (CBW) e dá palestras sobre gênero, raça e motivacionais.

Verônica, por sua vez, é fundadora da equipe paralímpica de atletismo Time Naurú, que conta com 24 atletas de alto rendimento. O foco hoje é no atletismo, mas a corredora espera um dia ter recursos para ampliar o escopo para outros esportes e para educação financeira, ética, cidadania e empreendedorismo.

A iniciativa, de acordo com ela, surgiu de experiências ruins que teve em clubes e da vontade de oferecer uma alternativa melhor para jovens atletas. “Para mudar a vida destas meninas e meninos”, afirma.

Educação

Independentemente do nível de experiência que esses atletas têm com investimentos, eles são unânimes em destacar a importância da educação financeira, e até se ressentem de não terem aprendido mais cedo sobre o tema.

“Hoje eu vejo que, dentro da seleção de ginástica, todos os atletas buscam saber mais sobre educação financeira, que eu acho que é importantíssima, até para o atleta saber o que fazer com o dinheiro quando ganha uma premiação”, diz Nory.

Renzo Agresta participou de quatro Olimpíadas como esgrimista, a última, a do Rio de Janeiro, em 2016. Paralelamente ao esporte, ele se formou em Administração de Empresas na Itália e fez pós-graduação na Fundação Getulio Vargas (FGV), em São Paulo.

“Eu sempre fui ligado ao mundo dos investimentos. Quando eu parei de competir, quis entrar de cabeça na área de assessoria de investimentos”, afirma Agresta.

Mas nem todos têm uma trajetória como esta. Aline conta que muitos atletas não aprendem com a família ou na escola o básico sobre finanças, e acabam sem conhecimento para gerir bem seu dinheiro.

Ela mesma começou a se interessar mais sobre o assunto ao ler, em 2018, o livro O Banqueiro dos Pobres, do bengali Muhammad Yunus, ganhador do Nobel da Paz em 2006. Passou a estudar mais o tema e está perto de concluir um MBA na área de finanças. “São informações ainda não acessíveis para a maior parte da população”, diz Aline, formada em Educação Física.

Na mesma linha, Verônica diz que a educação financeira deveria começar na escola. Ela e os demais atletas entrevistados começaram a se aprofundar no assunto por conta própria.

A corredora estuda Economia na Universidade Federal do ABC (UFABC) e procura repassar parte do que sabe para colegas. “O básico do básico”, disse. Ela montou um grupo de estudo com outros atletas chamado Investidor Consciente, pelo qual eles trocam informações e ajudam uns aos outros.

“Há atletas que ganham um bom dinheiro com o esporte, mas não conseguem bons retornos em suas aplicações”, afirmou Aresta. “O desafio é trazer o nível de excelência que o atleta tem no esporte também para os investimentos”, acrescentou ele, que tem vários esportistas entre seus clientes.

Dicas

Todos eles recomendam que o iniciante se informe sobre investimentos por meio de pesquisas, leitura, cursos e, se possível, busque assessoria para não cair de paraquedas.

Há muita informação disponível na internet, uma ferramenta que pode facilitar o acesso a dados de qualidade com rapidez e custos baixos, mas há poucos filtros. Para quem está começando, é difícil separar a recomendação séria de enganação.

“A internet tem informação demais. Tem tudo e ao mesmo tempo não tem nada”, destacou Luiza, que se forma em Jornalismo neste ano. Ela procurou ajuda de uma assessora para auxiliá-la.

“Minha recomendação é: nunca vá na onda de amigos. Saiba o que está fazendo. Tenha uma base lendo livros, assistindo vídeos, há muitos de graça [na internet], tenha paciência e constância”, ressaltou Verônica.

Outra recomendação é enxergar além dos investimentos tradicionais, como Poupança e imóvel próprio.

“A bolsa, por exemplo, não é aquele bicho de oito cabeças que muita gente pensa”, afirmou Contini. “É possível escolher caminhos que não tenham tanto risco. Principalmente no longo prazo, o risco se dilui muito. É importante saber controlar a ansiedade”, observou.

De acordo com Aresta, algumas dicas para quem quer investir são se informar bem sobre como funcionam os investimentos desejados, ter uma reserva de emergência que ofereça liquidez e formar um carteira diversificada.

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Alexandre Rocha

Jornalista colaborador do InfoMoney