A estratégia da Cogna para reverter a queda na receita e voltar a crescer

Para Roberto Valerio, CEO da Cogna, a empresa superou suas maiores dificuldades e, agora, está no caminho do crescimento

Mariana Amaro

Roberto Valério, CEO da Cogna (Foto: Rafael Almeida)

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Mudanças já estavam nos planos da Cogna (COGN3) antes da pandemia paralisar operações e chacoalhar os setores da economia. No final de 2019, a companhia começava, por exemplo, seu processo de sucessão da principal cadeira executiva, ocupada por Rodrigo Galindo desde 2011, e seguia um trajeto de reestruturação em marketing, unidades físicas e polos educacionais.

“Os planos estavam traçados, mas vimos que não adiantava apenas mudar a comunicação e digitalizar algumas unidades: a reestruturação teria que ser mais profunda”, afirma Roberto Valerio, que assumiu a posição de CEO em fevereiro de 2022, em entrevista exclusiva ao InfoMoney. 

A transformação custou caro para a companhia, que viu o preço de suas ações despencar. Em 2 de janeiro de 2020, os papéis eram negociados por R$ 12,20. No pregão de ontem (7), a cotação fechou a R$ 2,20 – uma queda de 82% no período. “Tivemos que pagar o preço sabendo que íamos perder receita por dois anos, porque a estratégia não era trivial no sentido de ouvir do mercado [que estamos perdendo receita]”, resume Valerio.

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Uma dessas estratégias foi trabalhar em uma ‘higienização’ da base de alunos, e focar naqueles com melhor qualidade de crédito, extinguindo um produto financeiro. Até 2020, a companhia possuía três tipos de alunos: 1) os pagantes; 2) os participantes do Parcelamento Estudantil Privado (PEP); e 3) aqueles que estavam no Parcelamento de Matrícula Tardia (PMT) . Em 2021, o PEP, que representava 13% da base na evolução de receita de captação dentro da graduação, foi extinto. Naturalmente, esse movimento colocou pressão nos outros dois modelos e a receita caiu de R$ 5,37 bilhões em 2020 para R$ 4,78 bilhões no ano seguinte.

“O programa acabava sendo utilizado para aquele aluno que pagava apenas uma mensalidade e não quitava as outras cinco antes de fazer a rematrícula. Reformulamos e reduzimos o tempo de parcelamento, para não ter um aluno que é contumaz renegociador”, explica Valerio. Depois de aplicar as condições mais restritivas de renegociação para rematrícula, a evasão subiu de 16% para 20%.

Em 2022, os números começaram a mellhorar: o percentual de calouros na base total foi de 39% para 44% mas a taxa de evasão, em vez de subir como costuma acontecer quando a base aumenta, caiu para 18% . “Assim como na TV por assinatura ou planos de celulares, quando se aumenta a base, a taxa de evasão tende a aumentar. Porém, mesmo com mais alunos calouros, conseguimos reduzir a evasão. Isso, por conta da higienização da base. Agora, estamos em uma direção de crescimento”, diz.

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A receita também melhorou. Embora termine este ano abaixo do patamar de 2020, o consenso de mercado indica algo em torno de R$ 4,95 bilhões, o que já representa uma recuperação diante de 12 meses atrás. “Existia uma dúvida [do mercado] sobre se a estratégia daria certo. Deu. Superamos o consenso em 2021 e, neste ano, vamos superar [o consenso] novamente”, afirma.

Ajustes na rota

“Foram dois anos que exigiram muita coragem para fazer as mudanças necessárias”, afirma Valerio, que enumera transformações que englobam do quadro de funcionários e marketing da companhia até o ecossistema de educação básica.

Em publicidade, por exemplo, o desafio foi reduzir os gastos com canais offline e migrar para o digital. Com a migração, a despesa de marketing caiu de R$ 463 milhões para R$ 298 milhões, o que levou a uma queda de 54% no custo por aquisição de aluno.

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O quadro de funcionários também passou por reacomodações nos últimos dois anos. “Fizemos ajustes importantes até porque fechamos algumas unidades, mas diferente de outras empresas, estamos crescendo e contratando. Em uma companhia com 24 mil funcionários, sempre é preciso fazer ajustes, mas não temos nenhuma reestruturação nos planos e nossa base de colaboradores agora é maior do que no ano passado”, afirma.

Além da redução em 30% das unidades próprias por não enxergar um futuro de geração de caixa, a companhia também precisou devolver prédios e expandiu a atuação em educação básica privada no momento em que as matrículas na modalidade caíam 10% no país. “Seguimos nossa premissa: qualquer pai e mãe que tenha condições financeiras vai priorizar colocar seus filhos para estudar em escola particular”, afirma. A aposta, diz, foi certeira. “Os níveis de matrícula já voltaram aos mesmos patamares este ano”.

Lições aprendidas

O ciclo de captação de novos alunos, que começa em outubro e termina em abril, de acordo com Valerio, ainda não chegou na metade, mas a empresa segue em suas taxas históricas de duplos dígitos. “Ainda tem bastante água para rolar aqui”, afirma.

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Mesmo diante de boas perspectivas, o caminho terá seus obstáculos. Em novembro, a inadimplência atingiu sua maior taxa anual desde 2016, de acordo com dados coletados pela Confederação Nacional do Comércio (CNC).

Para Valerio, contudo, essa não é exatamente uma novidade. O aumento da inadimplência está acontecendo nos últimos três anos, diz o executivo. “Com os efeitos da macroeconomia, temos observado um caminho contrário dentro da empresa. Não vou dizer que vamos continuar melhorando nesse clima, mas apesar da deterioração do cenário, acreditamos que é possível manter os índices de inadimplência dentro dos níveis atuais”, afirma.

O CEO afirma ainda que não enxerga risco porque “depois da higienização forte na base, os novos alunos entram com critério de reconhecimento de receita. Sabemos que os alunos são bons pagadores ou têm potencial de bom pagador”, afirma.

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Desafios futuros

Para os próximos anos, com a chegada de um novo governo, o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil), que foi um componente importante para o setor educacional, volta à pauta, mas de maneira cautelosa. “O novo governo nem assumiu ainda, não sabemos como vai funcionar. Mas, pelo nosso tamanho, relevância e propósito, apoiamos todos os programas que incentivam a educação porque a camada da população que nós atendemos precisa disso”, afirma.

Para além dos desafios financeiros, a companhia, que tem um longo histórico de consolidador do mercado de educação superior e, depois, de diversidade no setor educacional, com a aquisição da Somos, não deve fazer grandes movimentos no futuro próximo, exceto na área de medicina, onde os planos são de aumentar o número de faculdades das atuais sete. “Agora, que já temos a empresa de educação mais diversa do Brasil – de educação básica até pós-graduação, passando por cursos preparatório pré-vestibular, estamos olhando para o desenvolvimento de portfólio amplo para as escolas e buscamos complementar esse ecossistema”, diz.

Um exemplo dessa estratégia foi o investimento da Vasta, de R$ 158 milhões, na Educbank, uma startup que faz antecipação de recebíveis para escolas. “Esses movimentos fazem parte do nosso DNA, mas não temos nenhum grande plano ou um projeto transformacional no momento”, afirma.

Longe de grandes aquisições, a companhia buscou inovação com a criação de um venture builder, um braço que cria, valida e acelera diversas startups simultaneamente. “Temos sete teses rodando, entre marketplace de vendas de cursos e escola de tecnologia com outras formas de educação como bootcamps”, resume Valerio.

Sucessão

O atual CEO da empresa assumiu a cadeira de presidente da companhia depois de um longo processo de sucessão que precisou ser adiado pela pandemia e foi detalhado por Rodrigo Galindo no episódio desta semana do podcast Do Zero ao Topo.

Galindo que também é Presidente do Conselho de administração da Vasta e da Endeavor e tem pós-graduação em pedagogia, como bom professor, dividiu algumas das suas lições de carreira e as perspectivas para a educação no Brasil, empreendedorismo e as empresas que comanda no episódio 146 do podcast Do Zero ao Topo. O programa está disponível em vídeo no YouTube ou em áudio em ApplePodcastsSpotifyDeezerSpreakerGoogle PodcastCastbox e Amazon Music.

Sobre o Do Zero ao Topo

O podcast Do Zero ao Topo traz, a cada episódio, um empreendedor(a) ou empresário(a) de destaque no mercado brasileiro para contar a sua história, compartilhando os maiores desafios enfrentados ao longo do caminho e as principais estratégias usadas na construção do negócio.

O programa já recebeu nomes como José Galló, executivo responsável pela ascensão da Renner; Guilherme Benchimol, fundador da XP Investimentos; Rony Meisler, da Reserva; o empresário Abílio Diniz; Alcione Albanesi, do Amigos do Bem, Stelleo Tolda, um dos fundadores do Mercado Livre, e Sérgio Zimerman, da Petz.

Mariana Amaro

Editora de Negócios do InfoMoney e apresentadora do podcast Do Zero ao Topo. Cobre negócios e inovação.