Bovespa volta a “sonhar” com 5 milhões de CPFs; mas como alcançar esta meta?

Administradora da bolsa brasileira pretende contratar estudo e traçar caminho para atingir o ambicioso objetivo; atualmente, base tem pouco mais de 500 mil pessoas físicas

Estadão Conteúdo

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O período de maior volatilidade do mercado brasileiro e de baixo crescimento da economia vem afastando o investidor pessoa física da renda variável e sua participação na bolsa brasileira vem patinando ao longo dos últimos anos. Embora dependa de fatores macroeconômicos, a antiga meta para alcançar cinco milhões de investidores individuais na bolsa será revisitada ainda neste ano. Para que esse salto possa ser dado, o ingresso de novas companhias com ações listadas na BM&FBovespa e uma maior proximidade das corretoras com as pessoas físicas são pontos chave, apontam especialistas.

Próxima de revisitar esse tema, a BM&FBovespa está em fase de contratação de um estudo sobre o assunto e o seu resultado será base para se traçar o prazo adequado para atrair as cinco milhões de pessoas físicas na bolsa. “Não tem bala de prata. No Brasil existe um leque enorme de aplicações possíveis”, afirma o presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto. Ele pondera que para a Bolsa o principal concorrente é a poupança. A taxa de juros do País, hoje em dois dígitos, vem jogando contra quando o assunto é trazer a pessoa física para a renda variável.

O número de investidores pessoas físicas ao final de agosto deste ano, tendo como base o número de CPFs, estava em 551,1 mil, ante 589,3 mil registrados ao final do ano passado. O maior salto da pessoa física em Bolsa ocorreu de 2006 para 2007, quando o número de investidores desse perfil avançou 108%, para chegar naquele ano em 456 mil. Naqueles dois anos o mercado brasileiro vivenciou uma enxurrada de IPOs, quando 90 companhias realizaram ofertas iniciais de ações. Já em 2010, o número de pessoas físicas ultrapassou, pela única vez, a marca de 600 mil.

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“A participação direta do investidor individual nos mercados internacionais aumenta quando há IPOs de êxito noticiados. Essa é uma combinação importante para o aumento do interesse do investidor”, diz Bernardo Mariano, especialista em bolsas de valores da ERDesk. Um maior número de empresas listadas, ainda, significará uma composição mais diversificada da bolsa. Neste ano, no entanto, o Brasil não foi palco de nenhum IPO até o momento.

A despeito do cenário de maior volatilidade, 2014 vem sendo o melhor ano em relação à abertura de contas na XP Investimentos, conta Eduardo Glitz, diretor de varejo da corretora que possui em sua carteira 100 mil clientes pessoas físicas. “Temos trabalhado em dois pilares, o primeiro educação, para a formação de novos investidores e o segundo é a assessoria, de forma a oferecer ao cliente um planejamento para a sua vida financeira”, explica, destacando que o investimento em ações acaba sendo uma consequência desse processo.

Na XP, diz o executivo, o perfil do cliente é traçado e é oferecida uma cesta de investimentos. Dependendo do caso, a renda variável pode ficar de fora. No entanto, destaca, com o aumento da confiança desse cliente, é provável que ele passe a contemplar, em algum momento, essa categoria de investimentos.

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O presidente da Bolsa revela que na estratégia de retomar a meta de ter cinco milhões de pessoas físicas com investimento na Bolsa, as mídias sociais terão um papel de destaque. “Já começamos a trabalhar em um projeto”, diz, sem mais detalhes. A educação financeira também está mantida entre as prioridades da companhia.

Essa meta havia sido anunciada no fim de 2009, para um prazo de cinco anos. Edemir lembra que, na época, os cinco milhões de pessoas significavam uma fatia de 2,5% da população brasileira, “a metade do mínimo do que havia na América Latina”. Na época 5% da população chilena investia em bolsa. Em países como Peru e Colômbia esse porcentual ficava entre 7% e 10%. “Era muito factível buscar essa meta, sendo que naquela época o Brasil experimentava pela primeira vez juro real abaixo de 3%”, explica o executivo. No entanto, logo depois de anunciada a meta, o quadro macroeconômico mudou e a Bolsa resolveu ampliar o prazo para 2018, o que poderá ser revisto, dependendo do estudo a ser encomendado. “O potencial para alcançar esse número não desapareceu”, disse.

Segundo Mariano, da ERDesk, os países que são casos de sucesso da participação da pessoa física têm como característica a elevada fatia da população com nível universitário. No Brasil, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no entanto, o número de brasileiros com diploma universitário é de aproximadamente 10%.

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Simplificação
No início de 2016 o recolhimento do imposto de renda do investidor pessoa física deverá ser simplificado, de forma a ser cobrado apenas na saída, ou seja, quando ele deixar de comprar e vender papéis na bolsa. Hoje a cobrança é mensal. O investidor em ações paga 15% sobre o lucro na venda de ações, se o valor vendido superar no total R$ 20 mil no mês no mercado à vista. O valor, no entanto, não será alterado. O prazo de 2016, segundo Edemir, é por conta do desenvolvimento da base de cálculo para o recolhimento do imposto, que ficou a cargo da BM&FBovespa. As corretoras, por sua vez, farão a retenção do imposto na fonte. “Eventual sonegação cai para zero”, disse.

No entanto, o executivo destaca que hoje não é a complexidade que impede a pessoa física de operar em bolsa e que esse projeto de simplificação é mais relacionado com uma estruturação do mercado. “Esse projeto por si só não atrai a pessoa física à Bolsa”, diz. O projeto está sendo tratado por um grupo de trabalho formado por integrantes do governo e da BM&FBovespa. Outra proposta que a Bolsa fez ao governo é uma atualização do valor de isenção de IR na venda de ações por pessoas físicas, que passaria de R$ 20 mil mensais para algo em torno de R$ 45 mil.