Americanas (AMER3) precisará de injeção de capital, mas não é possível estimar tamanho, afirma Rial 

O agora ex-CEO da varejista também reconheceu que balanço da companhia não estava "tão transparente como deveria"

Rikardy Tooge

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O agora ex-CEO da Americanas (AMER3) Sergio Rial destacou na manhã desta quinta-feira (12) que a companhia vai precisar de um aumento de capital para enfrentar o rombo contábil da ordem de R$ 20 bilhões identificado no balanço do terceiro trimestre de 2022.

O executivo disse que ainda não é possível estimar a necessidade capital para a operação – que provavelmente será um follow-on –, uma vez que a inconsistência calculada é preliminar e não passou por auditoria externa.

“Ninguém definiu o valor. Mas sabemos que não será uma capitalização de [apenas] milhões”, disse Rial, em conferência com agentes de mercado. O executivo reforçou o compromisso dos acionistas de referência Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto “Beto” Sicupira. “Mas eles não podem ser a solução por si só. ‘Me dá um cheque e tá resolvido’, não é assim”, destacou.

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Rial, que será assessor dos acionistas de referência na reestruturação, afirmou que o grupo tem disposição de ajudar a companhia na capitalização, desde que se consiga visualizar um cenário de rentabilidade consistente para a Americanas.

Dívida maior

O ex-CEO afirmou que a inconsistência encontrada se refere a operações de “risco sacado”. Segundo Sergio Rial, muitos pagamentos a fornecedores que eram financiados por bancos não estavam sendo considerados como dívida no balanço da empresa.

“Basicamente, estamos dizendo que a dívida da companhia é maior”, resumiu Rial. “É um tema que permanece desde a década de 1990, um problema de estruturação de risco sacado que não era reportado como dívida”, avaliou.

Rial reforçou ainda que R$ 20 bilhões não estão fora do balanço da companhia, mas não garante que a cifra é definitiva. “Os R$ 20 bilhões são a nossa melhor estimativa dentro do que tivemos de informação nesses nove dias”, disse o executivo.

De acordo com Rial, o erro contábil pode estar ocorrendo há quase uma década, mas reforçou que esta não é uma estimativa precisa. Apesar do rombo, o ex-CEO disse que o caso não deverá causar impacto no caixa da Americanas no curto prazo, porém tudo vai depender da postura dos bancos em relação à oferta de linha de risco sacado hoje disponível.

Erro no balanço

Rial afirmou que nos primeiros dias de gestão – ele assumiu o cargo em 2 de janeiro – percebeu que os reportes de pagamento a fornecedores no balanço estavam distorcidos e começou a ir atrás do problema. Segundo ele, ao checar as cartas de circularização (documento que atesta um compromisso financeiro) enviadas aos bancos, não havia nenhuma sinalização de dívidas com essas instituições financeiras, o que ligou um sinal de alerta no executivo. “Começamos a identificar sinais de que o nível de transparência não estivesse tão fluído como deveria”.

A forma como a operação – o chamado risco sacado – foi contabilizada é considerada incorreta e tende a distorcer os resultados financeiros, uma vez que a operação é registrada na conta de “fornecedores” dentro do balanço em vez de ser considerada uma dívida. Com isso, os juros pagos aos bancos se tornam redutor do custo com fornecedores. Mas, na verdade isso deveria ser interpretado como uma despesa financeira dentro do balanço.

“Se é uma dívida, onde está o custo financeiro desta conta? Esse custo tem de estar em algum lugar”, questionou Rial, que também não considera hoje a possibilidade de uma fraude. “Tudo foi absolutamente pago. Os R$ 20 bilhões não estão fora do balanço, mas o patrimônio líquido da companhia não é de R$ 16 bilhões”, reforçou.

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) vem alertando em ofícios sobre os problemas causados em contabilizar o risco sacado (ou forfait), sendo o aumento artificial do lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação (Ebitda, em inglês), estoques inflados e margem bruta distorcida as principais consequências.

“As áreas técnicas da CVM entendem que os auditores devem dedicar especial atenção a estas operações, sobretudo quando envolverem companhias altamente alavancadas (endividadas), pelo  potencial risco de distorção da realidade econômica a ser reportada (gerenciamento de estrutura de capital)”, escreveu a autarquia

Além disso, a depender da transação e dos prazos, a companhia pode ser incentivada a adotar o risco sacado para “escapar” de convenants (obrigações que a companhia assume ao emitir uma dívida a juros menores, por exemplo). Questionado sobre a quantidade de convenants na estrutura de capital da Americanas, o ex-CEO disse que o número é baixo e mais concentrado na operação da rede de mercados Hortifruti.

‘No corner’

Rial reconheceu que a notícia jogou a empresa no “corner”. Porém, afirmou que prezou pela transparência ao comunicar o problema ao mercado logo que o percebeu. “Eu tive uma ‘escolha de Sofia’. Eu falo ou não? Espero a auditoria ou não? Achei que era melhor errar [por ação] do que aguardar”, disse.

Por outro lado, o executivo se demonstra otimista com o futuro da companhia e aponta que o desempenho operacional no decorrer do ano será importante para superar a situação. “Quanto mais vendermos, menor será o problema”.

Rikardy Tooge

Repórter de Negócios do InfoMoney, já passou por g1, Valor Econômico e Exame. Jornalista com pós-graduação em Ciência Política (FESPSP) e extensão em Economia (FAAP). Para sugestões e dicas: rikardy.tooge@infomoney.com.br