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Vai à Argentina? Cartões de débito e crédito têm câmbio mais barato para turistas

Governo argentino instituiu uma nova cotação, mais vantajosa que a oficial, que pode ser utilizada via cartões

Giovanna Sutto

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Turistas brasileiros podem fazer pagamentos mais baratos na Argentina utilizando os cartões de débito, crédito ou pré-pagos internacionais de bancos ou contas digitais, ao invés de dinheiro físico ou uso do câmbio paralelo, como o dólar blue, considerado ilegal.

Isso é possível porque o governo argentino liberou, por meio de um decreto (A 7630), o uso do chamado dólar MEP no câmbio para cartões emitidos no exterior. Essa modalidade de cotação é mais baixa que a oficial, o que significa que com US$ 1 dólar, nessa nova cotação, é possível obter mais pesos argentinos.

Na cotação oficial, US$ 1 equivalia a 262,2 pesos argentinos, segundo dados da Refinitiv desta terça-feira (11). Já no dólar MEP, com US$ 1 era possível obter cerca de 390 pesos argentinos. Na prática, ao fazer compras com o dólar MEP, o turista ganha poder de compra na Argentina: consome muito mais produtos e serviços via peso argentino com menos recursos dolarizados.

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Mas o que é o dólar MEP e como funciona? Por que ele foi criado? O que cada bandeira e conta digital em dólar oferecem? Qual a melhor opção de pagamento para uso na Argentina? A reportagem do InfoMoney consultou especialistas para responder às principais dúvidas sobre o assunto. Confira:

O que é e como funciona o dólar MEP?

O dólar MEP é um tipo de cotação de dólar em funcionamento na Argentina. Há vários tipos ao redor do país:

O consumidor pessoa física tem acesso à cotação do dólar MEP por meio de cartões de débito, crédito e pré-pagos internacionais de bandeiras que oferecem o recurso, como Visa, Master e Elo (em parceria com a Discover).

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MEP é uma abreviação para “mercado eletrônico de pagamentos”, e a cotação é conhecida também como “dólar tarjeta”. “O consumidor não vai encontrar em uma casa de câmbio oficial o dólar MEP, vai utilizar direto no cartão”, explica Vinicius Gavioli, sócio da Elev Investimentos.

No caso do cartão de crédito internacional de um banco tradicional, tudo é automático e a dinâmica de uso não muda. Suponha que você vá usar esse cartão para uma compra de 200 pesos em uma loja de Buenos Aires.

“Ao pagar, automaticamente o banco vai converter essa compra de pesos para dólar (utilizando a cotação do dólar MEP e não mais a cotação oficial) e depois converterá esses dólares em reais. Na fatura de seu cartão será cobrado o valor em reais após as conversões. E o cartão utilizará a cotação do dólar MEP para fazer essa transformação da compra em pesos para dólar no cartão internacional”, explica o especialista da Elev.

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Nesse caso, ele pontua que há um spread (custo cobrado pela instituição para fazer a operação de câmbio) duplo: na conversão de peso para dólar (via dólar MEP) e de dólar para real. Isso pode tornar essa opção com crédito menos vantajosa para o turista — apesar de ser prática.

Outra opção de uso permitida com dólar MEP é a compra com o cartão de débito, geralmente oferecido por contas digitais globais, como Wise, Nomad, Inter, C6, entre outras. Nesses casos, diferentemente do uso via cartão de crédito do banco tradicional, é preciso passar manualmente o saldo em conta para dólar.

“O cliente faz um câmbio de real para dólar e terá o saldo dolarizado na conta internacional, que está atrelada a um cartão de débito. Esse cartão com o saldo em dólar é utilizado para pagar as compras. E a bandeira do cartão converterá a compra feita em pesos para dólares (utilizando a cotação do dólar MEP) automaticamente. E será debitado o valor direto em dólares no saldo da conta”, explica Gavioli.

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Ele explica ainda que as contas digitais internacionais costumam ter uma vantagem financeira porque fazem o câmbio do saldo de reais para dólar com a incidência de 1,1% de IOF e não os 5,38% de IOF do cartão.

João Victor Simões, sócio e especialista em operações internacionais da Blue3, acrescenta que o spread cambial dessas empresas de contas digitais costuma ser menor, entre 0,5% e 2%.

Antes x depois do dólar MEP

Antes da liberação do uso do dólar MEP, os turistas costumavam evitar uso do cartão de crédito na Argentina por causa dos custos. Ao fazer uma compra, com cartão internacional emitido no Brasil, era necessário arcar com os seguintes custos:

“O spread poderia variar de 0,5% a 6%, a depender da instituição, até 10%”, diz Simões. Essa dinâmica incentivava ainda mais o uso de dinheiro em espécie e a busca pelo câmbio paralelo, especialmente o dólar blue, para conseguir cotações mais vantajosas.

Com o dólar MEP funcionando há uma redução no custo da cotação, o que já deixa a operação mais barata do que era mesmo sem nenhuma alteração, mas também é possível utilizar a cotação com as contas digitais, que cobram um IOF mais barato. Assim, os principais custos podem ser reduzidos:

Assim, como no caso dos cartões de crédito, o cartões pré-pagos também contam com o IOF de 5,38%, além das comissões das empresas, deixando o preço da conversão “mais salgado”.

Por que o dólar MEP foi criado?

O dólar MEP foi criado para atrair captação de recursos em moeda estrangeira via turismo e para minimizar a alta circulação de dólar blue na Argentina.

“A dinâmica é perfeita para a Argentina porque atrai ainda mais o turista e a consequente captação de moeda estrangeira, que vai servir para financiar tomadas de decisões em várias áreas, além das dívidas. Essa solução não vai cobrir todo o rombo, mas ajuda na atual situação do país”, avalia Simões, da Blue3.

A Argentina vive uma crise econômica sem precedentes. Inflação a três dígitos, desvalorização do peso e crédito caro. Tudo isso entra em ebulição quando espera-se, ainda para este ano, pelo resultado de uma eleição presidencial.

“Nesse cenário de muita incerteza, a economia desacelera, o PIB cai e as pessoas compram menos. O ambiente impacta a performance das empresas, que passam a contratar menos, reduzem salários e os trabalhadores perdem poder de compra”, diz João Victor Simões, sócio e especialista em operações internacionais da Blu3 Investimentos.

Como efeito da crise, a população procura alternativas para proteger seus patrimônios. “O que se observa é a compra de dólares em espécie. Com a queda do peso, as pessoas dolarizam o patrimônio para minimizar perdas diante da alta hiperinflação no país”, diz Vinicius Gavioli, sócio da Elev Investimentos.

“Mas o governo argentino impôs restrições: só é possível comprar US$ 200 por mês, o que não reflete a demanda e incentiva a venda de moeda entre pessoas físicas, o que faz a cotação subir, além de estimular também a busca por câmbios paralelos, como o dólar blue”, acrescenta o especialista.

O dólar blue é uma cotação ilegal que ganhou popularidade por oferecer conversões atrativas: US$ 1 dólar vale cerca de 490 pesos argentinos, segundo pesquisa feita pela reportagem. Mas, sem fiscalização, essas casas de câmbio são operadas por doleiros e cambistas nas ruas do país. O turista precisa redobrar a atenção porque é grande a chance de notas falsificadas chegarem ao bolso.

Foi esse cenário citado que fez o governo argentino entender que o dólar MEP poderia ser uma estratégia de captação de recursos em moeda estrangeira porque incentiva o turista a gastar em dólar por lá por meio de cartões de débito, crédito e pré-pagos de bandeiras amplamente conhecidas como Visa, Mastercard e Elo.

“O turismo é uma fatia importante da economia argentina e é uma forma eficiente de trazer recursos para dentro. A ideia é o dólar MEP ser um facilitador para as pessoas gastarem por lá e evitarem os riscos do dólar blue que não passa pelas ‘mãos’ do governo”, explica Simões.

A Argentina foi o segundo destino mais buscado por brasileiros em 2022, por exemplo, conforme relatório de junho do Kayak. Segundo o buscador de passagens, houve alta de 139% nas buscas de brasileiros viagens até Buenos Aires em 2022, na comparação com 2021.

Neste ano, a demanda alta promete se manter justamente porque os brasileiros podem viver “dias de rico” no país, e usufruir de um poder de compra significativo diante da desvalorização do peso.

“Buenos Aires sempre foi um destino popular. Mas a busca está ainda maior do que no ano passado especialmente pela desvalorização do peso. Embora a passagem possa estar mais cara que uma nacional pela alta demanda, o custo-benefício por lá durante a viagem é um atrativo e pode compensar esse valor do voo na visão de muitos turistas”, avalia Rodrigo Melo, diretor comercial do Viajala, buscador de passagens.

Considerando o mês de julho, o preço médio da passagem para Buenos Aires aumentou 11,5% em 2023, na comparação com 2022, para R$ 2.100, segundo Melo.

Quem oferece o dólar MEP?

O InfoMoney procurou Visa, Master, Elo, Wise, Inter, Nomad e C6 para detalhar as características da operação de câmbio com a cotação do dólar MEP em cada caso. O C6 não retornou à solicitação da reportagem até esta publicação.

Confira, a seguir, as condições impostas por cada uma:

A Mastercard não revelou a taxa da operação de câmbio com o dólar MEP. Em reposta aos questionamentos da reportagem, a empresa explicou que o valor utilizado para calcular essa tarifa é uma taxa de câmbio alternativa que recebe diariamente da Câmara Argentina de Cartões de Crédito (Atacyc). “É uma taxa de câmbio mais competitiva para estrangeiros, próxima ao “Dólar MEP” (Mercado de Pagamentos Eletrônicos)”, diz a empresa.

A solução se aplica aos cartões de crédito, débito e pré-pago da Mastercard emitidos fora da Argentina para compras realizadas no país.

O turista brasileiro não precisa realizar nenhum procedimento especial ou aviso para ter acesso ao benefício, conforme explica a Mastercard.

A companhia destaca que o consumidor recebe um valor de estorno quando a cotação mais em conta é utilizada na Argentina. Essa quantia “se dá por meio do reembolso da diferença cambial entre o câmbio alternativo (dólar MEP) e a conversão para o dólar oficial, até 72 horas após a compra (aproximadamente)”. Ou seja: o consumidor faz a compra com o valor da cotação oficial e, depois de cerca de três dias, tem o reembolso da diferença para a cotação mais barata.

“Para o consumidor, o benefício é dado de forma direta, embora não instantânea, e os reembolsos são identificados dias após a compra, pois depende de quando a transação é efetivamente processada e do tempo que leva para o emissor (banco ou instituição financeira) impactá-la no extrato de conta de seus clientes”, explica a empresa. Além disso, a Mastercard diz que “a moeda utilizada para o reembolso vai depender de como cada banco emissor trabalha com os seus clientes”, ou seja, se a conta é operada em real, o reembolso cai em real também.

A Visa não respondeu aos questionamentos enviados pela reportagem, mas enviou um posicionamento geral sobre seu serviço. A empresa oferta uma “taxa em dólar exclusiva para turistas estrangeiros”, mas não divulgou os valores de nenhuma taxa envolvida na transação.

“O tipo de câmbio para dólar aplicado nas compras na Argentina não é determinado pela Visa. Esse tipo de câmbio segue a regulamentação do Banco Central Argentino, que definiu uma nova taxa de câmbio para transações realizadas no país com credenciais emitidas em países fora da Argentina (portanto, incluindo o Brasil)”, diz a empresa.

A Visa ressalta que “é um tipo de câmbio diferente do oficial, mais benéfico para os turistas, porém, assim como o câmbio oficial, se encontra sujeito à flutuação do mercado.”

Em seu site, a empresa explica que a conversão com o dólar MEP é aplicada “a todas as transações comerciais feitas na Argentina”, desde 15 de dezembro de 2022 e que o sistema está em vigor com cartões de crédito, débito ou pré-pago Visa que tenham sido emitidos fora da Argentina.

Simões, da Blue3, conta, no entanto, que uma diferença no uso da cotação do dólar MEP pela Visa é que não há reembolso. A conversão é imediata após a compra de peso para dólar — o saldo já é atualizado com os valores alinhados à nova cotação menor que a oficial.

A Elo confirmou que oferece o recurso de cotação com dólar MEP em parceria coma Discover, empresa dona da marca Diners Club. A empresa também não detalhou as taxas cobradas na operação de câmbio.

E se limitou a dizer que as “taxas são definidas de acordo com o câmbio diário e pelo Banco Central da Argentina, além da definição do emissor do cartão” — no caso, a instituição financeira.

No caso da Elo não há nenhum tipo de reembolso: a conversão é imediata no ato da compra.

A Nomad oferece o serviço de conversão via dólar MEP por meio da bandeira Mastercard, sua parceira. O cartão da empresa segue regras similares às informadas pela bandeira. Ou seja: conta com o reembolso, mas, pela Nomad, é de sete dias úteis.

O cartão da Nomad é de débito, é internacional e pertence a uma conta em dólar, então a “recarga” dele é sempre em dólar americano, e a conversão para a moeda local é feita no momento da compra.

Em nota, a empresa explicou que sua conta é “100% gratuita, sem tarifa de abertura, manutenção ou inatividade”. Há a opção de cartão virtual ou físico e envio de transferência entre contas Nomad sem custo.

Em relação às taxas, além da cotação do dólar MEP:

“O valor da compra realizada na Argentina será convertido em dólar americano com base na cotação no momento da compra, utilizando a taxa de câmbio Mastercard. Posteriormente, a conversão será atualizada com base no novo regulamento do Banco Central da Argentina com a taxa de câmbio MEP”, diz a empresa em nota.

A Nomad ressalta que a regra vale “para compras onde o processamento é realizado dentro do território argentino e o pagamento é realizado na moeda local”. Saques não recebem essa cotação MEP e valores em dólar são cobrados diretamente na moeda americana, sem conversões.

No caso da Wise, o cartão é emitido pela Visa, o que coloca a empresa sob regras similares praticadas pela bandeira em relação ao câmbio.

A autorização do uso do dólar MEP fez com que a Wise encerrasse a funcionalidade de abrir saldo em pesos argentinos ou envio de dinheiro em pesos, que até então operava apenas para saques.

De forma prática, o cliente não encontra o “peso argentino” no app da Wise para fazer a conversão direta de real para peso.

Para usufruir do benefício do dólar MEP, o cliente da Wise deve ter um saldo em dólar dentro do aplicativo e escolher gastar em pesos argentinos.

“A Wise fará a conversão utilizando a cotação operada pela Visa. Desta maneira, os clientes do cartão podem se beneficiar da cotação do dólar americano mais favorável ao gastar dinheiro com o cartão na Argentina”.

A empresa não compartilhou as taxas que cobra na operação de conversão de real para dólar, mas a reportagem fez uma simulação: para adicionar US$ 10 (mínimo permitido na Wise) na carteira digital pagando em reais o consumidor gastaria R$ 50,99, sendo que a comissão da Wise é de R$ 2,40 e varia conforme o valor aumenta, e o câmbio seria de R$ 0,205, de acordo com um teste feito na terça-feira (11).

Assim como a Nomad, o Inter também utiliza a Mastercard para seus cartões e o consumidor pode usufruir da cotação mais em conta seguindo regras similares às da bandeira.

Para utilizar o cartão na Argentina com o dólar MEP, o cliente também precisa ter o saldo em dólar. Além do custo do câmbio, o cliente paga o IOF de 1,1% para fazer a conversão. O Inter informou que o spread está zerado para o cartão da Global Account, que é a conta que possui saldo em dólares. Portanto, o cliente paga o câmbio e o IOF para carregar a conta, sem taxas extras de comissão. Além disso, o banco também tem a opção de cartão de crédito internacional padrão, que pode ser utilizado na Argentina e não exige saldo em dólar.

Na Argentina, o cliente pode tanto utilizar o seu cartão virtual ou físico para compras como realizar saques na moeda local em máquinas que aceitem a Mastercard, podendo vir a ser cobrado uma taxa da própria máquina (ATM).

Quais as opções de pagamento para o brasileiro?

O turista brasileiro deve avaliar o que faz mais sentido durante a sua viagem, conforme seu bolso, praticidade e onde tem conta e cartão.

“A principal recomendação é evitar o dólar blue, apesar da grande oferta que o turista encontra nas ruas de Buenos Aires. As chances de ter problemas são altas, especialmente em relação às notas falsas”, afirma Gavioli.

Ele diz, ainda, que o ideal é fazer o menor número de conversões possíveis. “Muita gente opta por fazer o câmbio de real para dólar no Brasil e depois de dólar para peso em casas de câmbio na Argentina para ter o dinheiro em espécie. Mas, ao fazer isso, o turista paga duas vezes o spread e a tendência é o dinheiro desvalorizar um pouco mais”, explica o sócio da Elev.

Sobre dinheiro físico, Simões faz um alerta: “é importante checar a procedência da casa de câmbio e comparar os custos entre elas para trocar real por dólar, real por peso ou mesmo dólar por peso”.

Ele entende que uma boa saída é fazer uso das contas digitais para dolarizar o dinheiro que será levado na viagem a preços mais baratos. “Você vai ter mais pesos em mãos com a mesma quantidade de dólar.”

Gavioli concorda e recomenda que o viajante avalie o uso do cartão de crédito justamente pelo spread duplo (na conversão de peso para dólar; e dólar para real) das instituições que é maior do que o observado na dinâmica do cartão de débito das contas digitais.

Mas vale lembrar que nem todo lugar aceita cartão. Ter uma quantia em notas para compras menores, em passeios ou em comércio é importante.

Por isso, o consenso dos especialistas é fazer uma mescla: levar um pouco de pesos em espécie e utilizar o cartão e usufruir do dólar MEP quando possível para evitar, por exemplo, um troco com notas falsas em comércios.

Giovanna Sutto

Repórter de Finanças do InfoMoney. Escreve matérias finanças pessoais, meios de pagamentos, carreira e economia. Formada pela Cásper Líbero com pós-graduação pelo Ibmec.