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Seguro de vida, de R$ 86 milhões, é questionado na Justiça; entenda o que está em jogo

Prudential, Bradesco e Itaú dizem que inconsistências sobre a morte de empresário, no interior de SP, impedem liberação de valores

Gilmara Santos

(Shutterstock)

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O pagamento de um seguro de vida milionário virou caso de Justiça. De um lado está Nayá de Arruda Sigarini, ex-mulher e única beneficiária do empresário José Matheus Silva, que morreu aos 32 anos em julho de 2021. Do outro, três seguradoras: Prudential, Bradesco Vida e Previdência e Itaú Seguros. A disputa envolve o pagamento de uma indenização total de R$ 86 milhões.

Só da Prudential, o valor do seguro é estimado em R$ 66 milhões, mas a seguradora questiona as circunstâncias da morte do empresário. Matheus foi encontrado morto dentro de seu carro a pouco mais de 1 km de sua casa, em Jandira (cidade do interior de SP). Como foi encontrado um revólver dentro do veículo e não havia sinal de roubo, a polícia, em um primeiro momento, trabalhou com a hipótese de suicídio.

Na tentativa de esclarecer as circunstâncias da morte, a seguradora recorreu à Justiça em março de 2022 e obteve uma decisão para que o pagamento fosse “congelado” até que todas as investigações fossem encerradas. A dúvida, em um primeiro momento, era se o caso era suicídio, que não daria direito ao seguro, ou homicídio.

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Laudos foram realizados e a conclusão foi de que houve uma “tentativa de homicídio”, já que o exame residuográfico não detectou vestígios de pólvora nas mãos do empresário.

Descartada a hipótese de suicídio, a polícia passou a apurar quem poderia ser o autor do crime e a investigar todas as partes supostamente envolvidas, pedindo a quebra de sigilos telefônico, bancário e fiscal. Concluiu-se que o caso foi definido como um “homicídio de autoria desconhecida”.

Com o entendimento da polícia de que José Matheus não tinha tirado a própria vida e que a sua única beneficiária não teria relação com o crime, o valor da indenização deveria ser pago à ex-mulher.

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O advogado de Nayá, Raphael Blaselbauer, diz que, mesmo com a definição do inquérito policial, a seguradora segue retendo o pagamento do seguro. “Alega suspeita de fraude, pedindo, inclusive, a exumação do corpo para comprovar se realmente é do empresário falecido, apesar de a família ter feito o reconhecimento à época da morte e todo o trâmite para o enterro ter seguido o que é previsto na legislação”, diz o advogado.

Ainda segundo o advogado, a seguradora contesta a origem dos altos rendimentos de José Matheus e suspeita que ele operava ilegalmente no mercado financeiro. Raphael Blaselbauer explica que as atividades profissionais do segurado não podem ser entrave para o pagamento de seguro e que a seguradora fez avaliação de risco antes de contratar a apólice.

“Depois que aceita a apólice, se o segurado não mentiu em algo que está no questionário em que é feito a pré-contratação do seguro, a seguradora tem que fazer o pagamento, independentemente, da atividade profissional do segurado”, diz o advogado.

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Entenda o caso

Cerca de dois anos antes de morrer, José Matheus contratou 3 apólices de seguro de vida. Uma dela com a Prudential, de R$ 66 milhões; a outra com o Bradesco Vida e Previdência (cerca de R$ 12 milhões); e mais uma com o Itaú Seguros (R$ 8 milhões).

Para isso, desembolsava mensalmente algo entre R$ 70 mil e R$ 80 mil para pagar as mensalidades dos 3 seguros de vida. “O valor pago pelo seguro de vida demonstra padrão de vida condizente com as empresas que José Matheus possuía”, garante Blaselbauer.

Nayá e Matheus ficaram casados por 9 anos e se separaram poucos meses antes da morte dele. Juntos tiveram um filho e, mesmo separados, ele a manteve como única beneficiária do seu seguro de vida.

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O empresário foi baleado em 2 de julho de 2021 e sua morte cerebral foi decretada 2 dias depois, em 4 de julho. No dia em que sofreu o atentado, imagens de câmeras de segurança mostram os últimos passos dele, que apareceu caminhando na garagem, entrando em seu carro blindado e saindo de sua casa em um condomínio fechado em Jandira (SP).

Do veículo, ele fez duas ligações para o telefone de emergência da polícia, o 190. Nenhuma delas foi completada. O carro foi encontrado pouco mais de 1 quilômetro de distância da residência. José Matheus estava no banco traseiro, agonizando com um tiro na cabeça disparado à queima-roupa.

Segundo a polícia, dois tiros foram disparados, e o revólver foi encontrado dentro do carro. Carteira e celular estavam intactos, o que levou à primeira suspeita de tentativa de suicídio, mas, 5 meses depois, com outros laudos, a conclusão mudou para tentativa de homicídio.

A situação é incomum e, de acordo com o advogado Raphael Blaselbauer, não há muito que outros beneficiários possam fazer para não passar por um caso semelhante.

“Pensando em seguro e segurado, é importante conhecer a reputação da empresa no mercado de seguros, pesquisar ações judiciais e reclamações contra a empresa. É importante que o segurado conheça plenamente as cláusulas do contrato e, se possível, encaminhe para um advogado analisar. Normalmente, as seguradoras incluem cláusulas pouco claras e que não dão segurança ao segurado”, alerta.

O que dizem as seguradoras

As seguradoras envolvidas no caso encaminharam ao InfoMoney posicionamentos sobre o processo de liberação do seguro em específico. Veja, à íntegra, o que dizem cada uma das empresas:

Prudential

“A Prudential do Brasil esclarece que a regulação do sinistro foi iniciada assim que a beneficiária das apólices informou ter havido o falecimento do segurado. Durante esse procedimento, a seguradora constatou circunstâncias incomuns — como a ausência de documentos e inconsistências quanto ao contexto em que ocorreu o sinistro — que precisam ser elucidadas por diligências ainda em curso na investigação policial.

A fim de esclarecer as inconsistências encontradas, realizar perícias e concluir a regulação do caso, a seguradora adotou medida judicial, obtendo decisão liminar da 1ª Vara Cível do Foro de Carapicuíba/SP, confirmada pela 32ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, garantindo a regulação judicial do sinistro. O segurado detinha apólices de seguro de vida contratadas no mercado com outras seguradoras. Essas empresas também ingressaram com ações judiciais.

A seguradora aguarda, ainda, o cumprimento de uma sentença, que autoriza perícia médica após a exumação solicitada pela família do segurado, com o objetivo de confirmar a identidade do falecido e verificar as circunstâncias do falecimento.

A empresa reforça que tem forte compromisso de proteção de seus segurados, sólidas práticas de subscrição e preza pela ética e celeridade nos pagamentos de sinistros. Em 25 anos de atuação no Brasil, a companhia já retornou para a sociedade mais de R$ 3 bilhões em benefícios pagos.

A companhia reitera que trabalha rigorosamente pautada pelos normativos da Susep (Superintendência de Seguros Privados) no que tange à regulação de sinistros e por diretrizes nacionais e internacionais, visando coibir e identificar ocasionais práticas de lavagem de dinheiro e crimes financeiros no mercado de seguros”.

Bradesco Seguros

“A Bradesco Vida e Previdência não comenta processos em trâmite na justiça”.

Itaú Seguros

“A Itaú Seguros esclarece que, neste momento, aguarda as investigações em curso dos órgãos competentes e que se manifestará oportunamente nos autos do processo, assim que as análises forem finalizadas. A seguradora reforça, ainda, o seu compromisso com a proteção dos clientes, em linha com normativos e melhores práticas que regulamentam o mercado de seguros”.

Gilmara Santos

Jornalista especializada em economia e negócios. Foi editora de legislação da Gazeta Mercantil e de Economia do Diário do Grande ABC.