Guimarães: Caixa não subirá taxas do crédito imobiliário tão cedo e lançará megaoperação de microcrédito

Ao InfoMoney, Pedro Guimarães, presidente da Caixa, explicou por que o banco não deve subir as taxas de juros e detalhou nova modalidade de crédito

Giovanna Sutto

Publicidade

SÃO PAULO – Mesmo com o aumento da Selic em 0,75 pontos percentuais, para 2,75% ao ano, na última reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), e na iminência de uma nova alta na próxima reunião em maio, Pedro Guimarães, presidente da Caixa Econômica Federal, afirmou em entrevista ao InfoMoney que o banco não deve elevar a taxa de juros dos financiamentos imobiliários tão cedo.

“No momento não discutimos um aumento das taxas de juros. Poderemos fazer ajustes, mas por enquanto não teremos taxas mais altas. […] Mesmo com um potencial aumento na taxa em breve, não [vamos subir as taxas]”, afirmou o executivo em live realizada nesta sexta-feira (9). (Veja a entrevista completa no player acima).

Hoje, a Caixa conta com quatro linhas de financiamento imobiliário: a mais tradicional, atrelada à Taxa Referencial (TR), atualmente zerada, mais uma taxa fixa; a atrelada ao IPCA; uma terceira e mais recente, atrelada à remuneração da poupança; e a modalidade sem indexador, que conta com uma taxa fixa.

Masterclass

O Poder da Renda Fixa Turbo

Aprenda na prática como aumentar o seu patrimônio com rentabilidade, simplicidade e segurança (e ainda ganhe 02 presentes do InfoMoney)

E-mail inválido!

Ao informar os dados, você concorda com a nossa Política de Privacidade.

Modalidade  Taxas cobradas atualmente
TR TR (atualmente zerada) + taxa fixa (que varia entre 6,25% a.a. e 8% a.a.)
IPCA variação do IPCA + taxa fixa (que varia entre 2,95% a.a. e 4,95% a.a.)
Poupança Remuneração da poupança (hoje em 1,92% ao ano) + taxa fixa (que varia entre 3,35% a.a. e 3,99% a.a.)
Taxa pré-fixada taxa fixa (que varia entre 8% a.a. e 9,75% a.a.)

Para ter uma ideia do que cada modalidade pode representar no seu bolso, o InfoMoney preparou uma matéria que compara todas as modalidades da Caixa e também de outros bancos e mostrou qual compensa mais no atual cenário da economia (saiba mais aqui).

Por que a Caixa deve manter os juros mesmo com a Selic mais alta?

Durante a live, Guimarães explicou como funciona cada uma das linhas para explicar por que não prevê aumento de taxas por enquanto. Ele disse que tanto a opção atrelada à poupança quanto à atrelada ao IPCA têm indexadores que acabam acompanhando naturalmente os aumentos da Selic. A linha indexada à TR também tende a subir quando a Selic aumenta, mas o impacto do aumento dos juros básicos na TR é menor.

De qualquer forma, as três modalidades também têm taxas fixas, além dos indexadores e segundo o presidente da Caixa, os juros prefixados não devem ser alterados por ora.

Continua depois da publicidade

“Essa movimentação do Banco Central [de subir a Selic] teve dois efeitos: reduziu a taxa de câmbio, e segundo, segurou a expectativa das taxas DIs (Depósitos Interbancários) mais longas, que são as mais importantes. Havia uma expectativa do mercado, de que se não houvesse o aumento de curto prazo na Selic, poderíamos ter um aumento da inflação daqui a três, quatro anos [mas isso não se concretizou, já que o BC subiu a Selic]”, explicou.

Basicamente, essas taxas de juros mais longas são formadas a partir de negociações que acontecem com DIs futuros, ou seja, com títulos cujas taxas são baseadas nas expectativas dos investidores sobre os juros do país no futuro. Portanto, a chamada curva futura de juros é uma espécie de termômetro que mostra o custo do dinheiro no longo prazo.

A decisão do BC de fazer uma elevação da Selic maior do que o esperado, reduziu as expectativas de inflação para o futuro (já que juros maiores ajudam a conter a inflação). Portanto, apesar do aumento dos juros no curto prazo, a expectativa sobre os juros mais à frente diminuiu, o que permite a manutenção dos juros dos financiamentos imobiliários nos patamares atuais.

Questionado se os juros devem subir a partir da próxima reunião do Copom, em maio, uma vez que BC sinalizou que deve fazer uma nova elevação de 0,75 ponto percentual nessa reunião, Guimarães explicou que a Caixa só deve subir a taxa de juros dos financiamentos, se houver uma expectativa de que as taxas DIs futuras superem as atuais.

“Enquanto estivermos com a estrutura atual de juros, há ganho para a Caixa tanto no crédito imobiliário em si, quanto em outros produtos que os clientes fecham com a Caixa, como seguros, cartões, investimentos”, disse o executivo.

Guimarães acrescentou que a Caixa possui cerca de R$ 150 bilhões de recursos advindos da poupança para continuar ofertando crédito aos consumidores, a despeito dos recentes resultados negativos apresentados pelo BC sobre o saldo da poupança, que apresentou mais resgates do que depósitos nos três primeiros meses de 2021.

“Temos uma carteira de cerca de R$ 500 bilhões em crédito imobiliário dividido em dois fundings [fontes de recursos para os financiamentos]: poupança e FGTS. Hoje, desse total, há cerca de R$ 250 bilhões sendo emprestados à população mais carente via FGTS e a outra metade à classe média via poupança. Mas temos um volume de cerca de R$ 400 bilhões na poupança, o que nos dá espaço para emprestar mais ao longo dos próximos anos”, explica.

Caixa anuncia microcrédito

Também durante a live, Guimarães compartilhou uma novidade: a Caixa vai ofertar uma nova linha de microcrédito que deve atingir cerca de 10 a 30 milhões de brasileiros de baixa renda, com uma taxa média que poderia variar entre 3% e 3,5% ao mês. “Teremos a maior operação de microcrédito, que será feita exclusivamente pelo banco digital Caixa Tem, e vai impactar de 10 a 30 milhões de brasileiros”, informou o executivo.

Na prática, a Caixa pretende atrair clientes que hoje fazem uso de linhas de crédito automáticas, como o cheque especial ou o rotativo de cartão de crédito, que possuem juros que passam de 10% ao mês. “Essas pessoas vão desenvolver uma curva de aprendizado com o microcrédito. Uma boa parte já toma crédito, mas com taxas muito altas e vamos oferecer melhores condições”, disse.

O presidente da Caixa explicou que o Caixa Tem, app que operacionaliza o pagamento do auxílio emergencial deve passar por uma revitalização para se posicionar como o “banco digital brasileiro voltado à população mais carente”. Sua nova estrutura deve ser baseada em três grandes pilares. O primeiro, já ativo, é o de pagamento de benefícios sociais, como o auxílio emergencial, que já conta com 30 milhões de usuários ativos por mês, número que chegou a bater 107 milhões na primeira rodada de pagamento do auxílio.

O segundo pilar é essa nova operação focada em microcrédito, que foi detalhada por Guimarães em primeira mão ao InfoMoney na entrevista.

O terceiro pilar do Caixa Tem seria o financiamento imobiliário voltado à população de baixa renda, segmento no qual a Caixa tem 99% de participação de mercado, segundo Guimarães. “Esses três produtos são produtos que têm o perfil de um banco digital para a população mais carente, onde a Caixa basicamente é única, está presente de uma maneira muito forte.”

Segundo ele, a ideia inicial era começar a ofertar a nova opção de microcrédito ainda em abril, mas o prazo deve ser adiado porque a Caixa ainda aguarda autorizações do BC.

Toda essa reestruturação no Caixa Tem tem por trás o objetivo de tornar o banco digital da Caixa mais atraente para a sua oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês), que Guimarães disse que deve acontecer na B3 e ao mesmo tempo em outra bolsa no exterior (veja mais detalhes sobre o IPO do Caixa Tem).

“O BC está fazendo as análises de forma rápida [sobre o IPO] e as interações com a Caixa têm sido tranquilas, mas são 107 milhões de CPFs únicos, é uma operação gigante que está demandando um pouco mais de tempo. Mas teremos um banco digital com uma escala de atendimento que nenhum outro banco terá”, afirmou o executivo.

Microcrédito vale a pena?

Rafael Schiozer, professor de finanças da Fundação Getúlio Vargas, explica que, do ponto de vista de política pública, esse formato de microcrédito é positivo. “Faz muito sentido neste momento, principalmente para as pessoas físicas que estão enfrentando uma situação financeira complicado devido à pandemia. Ter acesso ao microcrédito dá uma sobrevida às finanças pessoais”, diz.

Pensando na lucratividade da Caixa, é menos vantajoso, segundo Schiozer. “Mas a Caixa está cumprindo um papel de banco estatal, de suavizar os ciclos econômicos ruins, recompondo a falta de crédito em momentos de crise como este que vivemos”, avalia.

Juliana Inhasz, professora de economia do Insper, pontua que o consumidor precisa ficar atento para avaliar se vale a pena entrar em mais uma dívida.

“Certamente as pessoas estão precisando de ajuda, mas quem contrair o microcrédito terá que pagar juros em um cenário de incerteza muito grande. É importante refletir bem sobre os objetivos de tomar essa dívida e pesar se o benefício será maior que o custo, já que a taxa de juros de 3% a 3,5% ao mês é consideravelmente alta”, analisa.

Caixa entra na competição com fintechs de crédito

Juliana também comenta que o microcrédito abre portas para a Caixa entrar em outro segmento, no qual não atuava de forma concreta até o momento. “O carro-chefe da Caixa é o financiamento imobiliário, começar a ofertar microcrédito vai colocar o banco no ringue de competição com fintechs de crédito que assumiram muito bem esse espaço em meio à pandemia. De um lado, isso é positivo, já que mais competição pode eventualmente gerar melhores condições para os clientes. Porém, um banco do tamanho da Caixa entrar nesse segmento pode facilitar o acesso e endividar ainda mais pessoas”, avalia.

Schiozer diz que ainda é cedo para analisar esse possível embate entre a Caixa e as fintechs de crédito. “Não sei quanto a entrada da Caixa pode impactar o mercado das fintechs. Ela tem grande capilaridade ao redor do Brasil, mas ainda não dá para cravar se vai absorver grande parte desse mercado”, diz.

Giovanna Sutto

Repórter de Finanças do InfoMoney. Escreve matérias finanças pessoais, meios de pagamentos, carreira e economia. Formada pela Cásper Líbero com pós-graduação pelo Ibmec.