BC estuda limitar tarifa de pré-pago na receita de bancos e fintechs: serviços podem ficar mais caros?

Fintechs alegam que medida deve provocar perda de receita e inviabilizar modelo de negócios

Equipe InfoMoney

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Disputa entre bancos de grande porte e fintechs tem se acirrado em torno de consulta pública do Banco Central (BC) que estuda criar um teto para tarifas de intercâmbio dos cartões pré-pagos.

Com uso maciço desse modelo de cartão nas contas digitais gratuitas, fintechs alegam que a medida provocaria uma perda de receita que inviabilizaria o modelo de negócios do setor e levaria a uma elevação das cobranças sobre consumidores, com consequente golpe no processo de inclusão financeira no país.

Além disso, com as receitas impactadas, as empresas poderiam redistribuir os custos para outros serviços, o que resultaria em um possível aumento de valores na ponta.

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Já as instituições tradicionais, com maior participação nos cartões de débito, já têm um teto para a tarifa e apoiam a proposta do BC. O grupo dos “bancões” cobra isonomia de tratamento.

Segundo o BC, a consulta pública lançada em outubro de 2021 recebeu 23 contribuições de associações do setor, instituições emissoras de cartões, credenciadores e instituidores de arranjos.

Posteriormente ao período de consulta, a autoridade monetária recebeu estudos complementares de associações e participantes de mercado, além da interlocução intensa com o mercado.

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O que é a TIC?

A tarifa de intercâmbio (TIC) é um percentual do valor da compra, definido pelas companhias das bandeiras, que é repassado pela empresa da “maquininha” do cartão (credenciadora) à instituição financeira emissora do cartão.

Para os cartões de débito, necessariamente vinculados a uma conta corrente em um banco, o BC determina que a tarifa máxima seja de 0,8%, desde que a média das cobranças não ultrapasse 0,5%.

Como funciona hoje?

Na regra atual, não há teto para a tarifa dos cartões pré-pagos, que tiveram crescimento expressivo da participação de mercado nos últimos anos com uso em contas digitais. A tarifa média por operação nessa modalidade supera 1%.

O BC fez a consulta pública, no fim do ano passado, e ainda não tomou decisão sobre a medida. A minuta-proposta define um teto de 0,5% da TIC, válido tanto para os cartões de débito quanto aos pré-pagos.

Teto para as tarifas

Estudo produzido pela Zetta, associação que representa fintechs como Nubank e Mercado Pago, afirma que se o teto para tarifas estivesse valendo em 2021, os clientes dessas instituições teriam desembolsado R$ 24 bilhões a mais em serviços cobrados. E, alguns serviços, poderiam sofrer aumento e os que hoje são gratuitos poderiam passar a ser cobrados, por exemplo.

O argumento, que toma por hipótese um teto de 0,6%, próximo ao proposto pelo BC, é que as perdas de receita com a tarifa de intercâmbio precisariam ser repassadas aos consumidores.

Na prática, MEIs e pessoas físicas poderiam ser afetados, geralmente, clientes diretos dos cartões pré-pagos.

“Se aprovada, a mudança de regulação vai mexer no mercado, especialmente se no plano da fintech, o TIC é fonte de receita relevante. O melhor caminho, no entanto, é a fintech diversificar os serviços financeiros oferecidos, e assim diversificar suas receitas”, explica Rogerio Melfi, membro da ABFintechs.

Segundo ele, cobrar mais pelos serviços que já existem talvez não seja a melhor decisão. “Se o cliente é muito sensível ao preço, o melhor é não tornar os produtos mais caros”, mas cada empresa pode se comportar de uma maneira e adotar uma estratégia a depender do impacto dessa limitação na receita.

“E o consumidor ou microempresário sempre têm a escolha de procurar uma fintech que ofereça o cartão sem anuidade, mais serviços como empréstimos, seguros, programa de pontos, investimentos, ou mesmo que não cobre anuidade”, afirma.

O BC não disse, em nota encaminhada ao InfoMoney, se mais cobranças poderiam acontecer, caso a medida for aprovada. “As áreas técnicas continuam analisando as contribuições e trabalhando na proposta normativa”, afirmou.

Se a mudança regulatória avançar pode ser que haja algum efeito mas, por enquanto, o BC segue avaliando as contribuições de mercado, sem bater o martelo.

Fatores atípicos estão alongando a análise da medida. Além da greve de servidores do órgão, que atrasou procedimentos, o diretor que era responsável pelo projeto, João Manoel Pinho de Mello, deixou o posto em fevereiro. Em seu lugar, Renato Gomes tomou posse na diretoria de Organização do Sistema Financeiro e Resolução em abril deste ano.

Uma pilha de cartões de crédito coloridos.
Cartões de crédito

Débito x pré-pago

O presidente da Zetta, Bruno Magrani, afirmou que as fintechs dificilmente conseguiriam compensar essas perdas de outras formas porque a regulação do BC para contas digitais e instituições de pagamento limita os serviços que podem ser oferecidos e as formas de aplicação do dinheiro depositado pelos clientes nas contas pré-pagas.

Magrani disse ainda que o perfil de uso dos cartões pré-pagos tem uma média de valor mais baixo nas operações, em comparação com o débito. Por isso, segundo ele, esse tipo de cliente pode deixar de ser rentável para o setor financeiro caso a regra entre em vigor.

“O modelo de negócios das fintechs, que aumentou a competitividade do setor financeiro, está calcado na receita da tarifa de intercâmbio do cartão pré-pago”, afirmou. “Os produtos, na prática, são diferentes e atendem a públicos diferentes”.

O diretor executivo de Inovação, Produtos e Serviços Bancários da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Leandro Vilain, disse que a entidade apresentou posicionamento favorável à proposta do BC, embora seja contra tabelamentos de preços.

“Na ótica do cliente, o produto é o mesmo, você coloca seu dinheiro em uma instituição financeira, tem uma senha e vai usar na maquininha para fazer transação”, afirmou.

“Tabelamento de preços, por princípio, é ruim. Agora, já que foi feito, que pelo menos valha para todos. Defendemos isonomia da regra para a mesma natureza de serviço.”

Segundo Vilain, o teto também atingirá de certa forma os bancos de grande porte porque alguns conglomerados têm instituições de pagamento que usam as contas digitais com cartões pré-pagos.

A Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) disse, também por nota, ser contra tabelamentos, defendendo que o mercado se autoajuste. “A imposição de um teto de preço geralmente restringe a inovação e pode gerar custos ao consumidor”.

Crescimento acelerado

Segundo a Abecs, os cartões pré-pagos movimentaram R$ 44,6 bilhões no primeiro trimestre deste ano, valor 148% maior do que no mesmo período de 2021.

Por outro lado, o valor médio por operação nos cartões pré-pagos é mais baixo. No primeiro trimestre, essas operações representaram 5,9% do montante transacionado por cartões no país — este número também considera os cartões de crédito.

Este não é o primeiro episódio em que medida do Banco Central coloca em lados opostos as instituições tradicionais e os bancos digitais. Em março, o anúncio de regras de capital mais exigentes para instituições de pagamentos desagradou fintechs, mas foram elogiadas pela Febraban.

*Com informações da Reuters.