Via (VIIA3): mercado não “comprará à vista” novo plano da varejista, dizem analistas; ação fecha em leve alta

Analistas veem novamente resultados fracos, mas destacam como positivas novas iniciativas, mas que não devem ser precificadas em sua totalidade

Lara Rizério

(Djalma Vassão/FotosPublicas)

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O prejuízo de R$ 492 milhões no segundo trimestre de 2023 (2T23), a Via (VIIA3), dona das Casas Bahia e Ponto, foi visto como decepcionante pelo mercado, que projetava perdas menores para o período (de R$ 432 milhões, segundo o consenso Refinitiv).

As perdas ocorreram em meio a uma maior atividade promocional para ajustar os níveis de estoque, inclusive nas categorias 1P (estoque próprio) que estão sendo descontinuadas.

Além disso, as despesas financeiras novamente foram pressionadas devido ao alto nível das taxas de juros e maior uso de antecipação de recebíveis (+68% ano a ano), enquanto a geração de caixa operacional permaneceu no terreno negativo em R$ 260 milhões (versus -R$ 812 milhões no 2T22), embora melhorando em relação ao ano anterior devido a menores estoques e capex.

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Enquanto isso, os resultados ficaram amplamente em linha com as expectativas de consenso em termos de vendas e lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (Ebitda, na sigla em inglês).

O volume bruto de mercadoria (GMV) total ficou estável no comparativo anual, com vendas líquidas caindo 2%, já que o macro mais fraco continua como um peso na demanda para as categorias principais, levando a um crescimento moderado nas lojas físicas e 1P online, que foi parcialmente compensado pelo crescimento 3P, ou do marketplace (GMV subiu 9% ano a ano) e uma maior take rate, ou as taxas cobradas sobre os vendedores em marketplace.

A rentabilidade foi pressionada, com margem bruta caindo 2,9 pontos percentuais (p.p.) na base anual, impactada pelo mix de vendas e pelo início dos ajustes de estoque da companhia, levando a margem Ebitda ajustada a cair 2,7 p.p, com pequenas economias de despesas gerais e administrativas.

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Os números em si podem até não ser parecer animadores, mostrando a continuidade de um ambiente bastante desafiador para a varejista, mas uma das questões que intrigavam o mercado sobre a companhia foi endereçada na noite da véspera.

Em meio à mudança recente do time de executivos, a Via divulgou um fato relevante detalhando seu plano de transformação, com duas principais frentes estratégicas: alavancas operacionais e alavancas de estrutura de capital.

Com isso, após uma abertura em leve queda, as ações VIIA3 passaram a registrar fortes ganho nesta sexta-feira (11) pós-anúncios, chegando a saltar 8,74% (R$ 1,99), mas depois fechou apenas em leve alta, de 1,09%, a R$ 1,85, com os analistas vendo que o mercado não deve precificar de forma imediata o novo plano da empresa.

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Do lado operacional,  algumas das iniciativas envolvem (1) novos modelos de gestão baseados em novas margens e ciclos de caixa, (2) redução significativa de despesas com pessoal, (3) otimização das lojas, com fechamento de 50 a 100 pontos em 2023 que estão operando com prejuízo, (4) migração de categorias 1P de baixa rentabilidade para 3P e (5) redução adicional de estoque com potencial de até R$ 1 bilhão.

Quanto à estrutura de capital, as principais iniciativas são (1) financiar o crédito por meio de Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) – a Via já contratou bancos para esse fim e estuda a potencial emissão de cotas de até R$ 1,5 bilhão – e, com isso, espera se engajar em melhores captações. (2) Monetização de ativos de até R$ 4 bilhões em 2023 (R$ 2,5 bilhões em créditos tributários, R$ 1 bilhão em estoques, entre outros) e (3) estimativa de alcançar um nível até 40% menor de capex (investimentos) em relação a 2022.

A Via tem atualmente 50% de sua exposição de crédito ligada aos crediário. Ou seja, quando um cliente compra um produto no carnê parcelado, a empresa adianta os valores a serem recebidos junto a bancos e depois devolve, com juros, quando o cliente terminar de pagar. Agora, o plano é colocar a carteira de crediário no mercado de capitais por meio de fundo de investimento em direitos creditórios (FIDC) e cessão da carteira de crediário ao FIDC.

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“Acreditamos que a apresentação do plano estratégico e o fato relevante de estudo potencial para emissão de cotas do FIDC, no valor de até R$ 1,5 bilhão, devem aliviar a reação negativa em relação ao fraco resultado operacional”, avalia a Genial Investimentos.

Anteriormente, os analistas da casa haviam apontado para a falta de visibilidade da Via em relação a sua estratégia operacional no curto e médio prazo – o que era um assunto extremamente relevante dada a mudança de grande parte do corpo executivo da empresa e que agora foi endereçado.

Renato Horta Franklin veio da Movida (MOVI3) para assumir a presidência da varejista, e Elcio Mitsuhiro, com passagens por Iochpe-Maxion (MYPK3) e BRF (BRFS3), veio para a cadeira de diretor financeiro.

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A XP apontou valorizar as iniciativas apresentadas no plano, uma vez que contêm alavancas claras e suas respectivas estimativas de ganhos, alcançando um potencial de R$ 1,5 bilhão a R$ 2 bilhões de Ebitda adicional e R$ 4 bilhões de monetização de ativos.

Além disso, aponta a equipe de análise, a nova estratégia da Via focará nas categorias-chave e mais rentáveis, o que enxerga como positivo.

“Entretanto, o mercado pode permanecer cético quanto a outro plano de reestruturação da companhia, em meio a um cenário macro ainda desafiador, embora ganhos iniciais do plano possam já ser vistos nos próximos resultados, o que pode ajudar a trazer mais conforto quanto sua execução”, avaliam os analistas.

O JPMorgan aponta que, em conversa com a alta gestão da companhia, foi destacado que várias das iniciativas de eficiência para gerar as economias mencionadas já foram executadas ou estão em andamento, com os primeiros sinais de melhoria esperados já para o quarto trimestre deste ano.

Assim, vê o mercado menos de olho nos fracos resultados, pois o norte estratégico está mudando com a nova administração. Por outro lado, dado o alto nível de alavancagem e o histórico de execução ruim (como empresa em si), os analistas do banco enxergam como improvável que o plano de transformação completo seja precificado. De qualquer forma, fazendo um balanço dos principais anúncios de ontem, aponta que o novo plano estratégico deve ser um catalisador positivo para as ações.

O Bradesco BBI destacou que não descartava uma reação positiva dos papéis ao plano, pois as expectativas já estavam em um nível muito baixo e a nova gestão tentou fornecer, na medida do possível, mensagens mais claras e alavancas mais viáveis para mudar a situação da Via.

“Gostamos de ver uma abordagem mais sóbria da administração, que visa favorecer o fluxo de caixa e o ROIC [retorno sobre o capital investido], mesmo que isso aconteça à custa de uma receita em declínio. O plano proposto, a nosso ver, ganha maior credibilidade quando não leva em consideração as vantagens de uma potencial recuperação ‘top=down’ para as categorias principais ou de possíveis cortes na taxa Selic. Não é uma tarefa fácil, definitivamente, e não esperamos que os investidores paguem à vista pelo plano de transformação. No entanto, a postura mais pragmática sobre como lidar com as circunstâncias deve melhorar o sentimento até certo ponto”, aponta a equipe de análise do BBI.

Desta forma, apesar do maior ânimo com o novo plano estratégico, analistas ainda “esperam para ver” e mantêm visão cautelosa para os ativos. O JPMorgan tem recomendação underweight (exposição abaixo da média do mercado, equivalente à venda) para o papel, enquanto a XP tem recomendação neutra, com preço-alvo de R$ 3,00, mesma recomendação do BBI.

A Genial tem recomendação de manutenção para os ativos, com preço-alvo para doze meses de R$ 2,00 – upside de 9,0% em relação ao preço de fechamento da véspera, apontando que monitorará a execução do plano ao longo dos próximos trimestres.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.