Setor de petróleo se recupera em 2021, mas vento (e mercado) começa a soprar na direção das energias renováveis

Após décadas de promessas, transição para uma economia que lance menos dióxido de carbono na atmosfera começa a ganhar corpo

Sérgio Teixeira Jr.

(Shutterstock)

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NOVA YORK — Em um relatório divulgado em março, a Agência Internacional de Energia (AIE) afirma que pode não haver uma volta ao “normal” para o mercado de petróleo na era pós-Covid.

O choque de abril do ano passado, quando os barris foram negociados em valores negativos no auge das incertezas em relação à pandemia, pode ser lembrado no futuro como o marco da virada rumo a um futuro sem emissões de carbono.

A AIE afirma que os estoques “espantosos” acumulados no ano passado estão aos poucos sendo desovados e devem voltar ao normal ainda em 2021, mas a demanda pode voltar a níveis de 2019 somente daqui cinco anos.

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A palavra-chave é “pode”. Depois de décadas de promessas, a transição para uma economia que lance menos dióxido de carbono na atmosfera começa a ganhar corpo.

“A crise da Covid-19 provocou um declínio histórico na demanda – mas não necessariamente duradouro”, disse Fatih Birol, diretor-executivo da agência. A dúvida é como se dará esse aumento da demanda.

O grande experimento global do teletrabalho foi um sucesso: menos viagens de negócios, menos trânsito nas ruas e menos poluição.

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Depois dos quatro anos de negacionismo climático de Donald Trump, o atual presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou um plano multitrilionário para transformar a economia americana, alinhando o país com a vanguarda europeia no caminho de um futuro sustentável.

Num mundo em que queimar combustíveis fósseis será visto como lembrança do passado, as empresas de petróleo – e, crucialmente, seus acionistas – estão diante de uma encruzilhada: o negócio ainda vale a pena?

Dois tempos

No curto prazo, a resposta tende a ser afirmativa. “O repique econômico pós-pandemia deve ser muito mais rápido que outros do passado”, diz um relatório recente da BlackRock Investment Institute, ligado à maior gestora de recursos do mundo.

Um dos motivos apontados é o crescimento da economia da China, maior compradora de commodities do mundo. Os chineses já consomem 10% mais petróleo que em 2019, o que pode levar o preço do barril, que hoje está em cerca de US$ 65, a picos de US$ 80 este ano, aponta Daniel Boyd, analista do banco de investimentos Mizuho.

Com a vacinação avançada e o gradual relaxamento das restrições, a recuperação dos Estados Unidos não deve ficar muito atrás.

As ações da Exxon Mobil, maior petrolífera americana, subiram cerca de 20% desde o início do ano. As da Sunoco apreciaram 25%. A ação da Schlumberger, que fornece equipamentos e serviços de exploração, subiu quase 50%.

De acordo com análise da Factset, 91% das empresas do setor de energia divulgaram resultados acima do esperado no 1º trimestre. Quanto ao horizonte próximo, os analistas do setor estão otimistas.

Os combustíveis fósseis ainda são responsáveis por 84% da energia consumida no planeta, segundo a petrolífera britânica BP. Os dados correspondem a 2019.

Olhando um pouco mais adiante, porém, a história é outra. Dois eventos recentes apontam que, apesar dos ganhos imediatos, os investidores têm muitas dúvidas sobre as perspectivas das gigantes do petróleo.

Em agosto do ano passado, a Exxon Mobil foi excluída do índice Dow Jones, da Bolsa de Nova York. Dois meses depois, ela deixou de ser a empresa de energia americana com maior valor de mercado: o título passou para a NextEra Energy, detentora da maior capacidade de usinas solares e eólicas do mundo.

Desde então, a Exxon Mobil retomou a primeira posição no ranking das maiores empresas. Mas os questionamentos continuam.

Guerra no conselho

Um grupo de investidores ativistas, batizado de Engine No. 1, lançou no ano passado uma campanha para obter um assento no conselho de administração da Exxon Mobil.

A reunião anual que vai definir uma nova composição acontece semana que vem. O Engine No. 1 propõe quatro novos nomes para integrar o conselho da empresa, argumentando que a companhia não está fazendo as mudanças necessárias para manter-se relevante num mundo pós-petróleo.

“A companhia não acompanhou a transição da indústria, resultando em uma performance significativamente inferior, em detrimento dos acionistas”, dizem os ativistas. “A indústria da energia e o mundo estão mudando. Para evitar o destino de outras antigas empresas americanas icônicas, ela precisa se posicionar melhor para a criação de valor sustentável e de longo prazo.”

Darren Woods, CEO da empresa, disse em entrevista à publicação especializada Barron’s que não vê motivos para mudanças e que a companhia está preparada para o futuro.

A Exxon Mobil propôs há um mês uma parceria público-privada de US$ 100 bilhões para sequestrar o carbono emitido por grandes indústria e armazená-lo no Golfo do México.

A ideia é criar um novo negócio. Mas a tecnologia de sequestro de carbono é cara, complexa e depende de regulamentações – como o estabelecimento de um preço para as emissões, por exemplo – para tornar-se economicamente viável.

Investidores de peso, como a BlackRock, e grandes fundos de pensão já sinalizaram que as medidas anunciadas são insuficientes. O resultado da reunião de acionistas será acompanhado de perto.

Diferenças transatlânticas

Do outro lado do Atlântico, a resistência das gigantes petrolíferas às energias renováveis já foi superada – mas os resultados só serão conhecidos em alguns anos.

A britânica BP anunciou que vai decuplicar os investimentos em fontes sustentáveis vai até 2030 e que a produção de petróleo e de gás natural vai cair 40% no mesmo período.

Inicialmente, os investidores tentaram “digerir” a nova estratégia, mas agora a situação está mudando, afirmou o CEO da BP, Bernard Looney, num evento realizado na semana passada.

“Diria que há interesse e aceitação crescentes na nossa estratégia, e provavelmente não poderia dizer o mesmo quatro ou cinco meses atrás”, disse Looney.

O Barclay’s publicou um relatório recente chamando a BP de “caso de investimento mais mal compreendido” entre as grandes petrolíferas do continente. O banco apontou a britânica como a melhor opção para os investidores.

Segundo Lydia Rainforth, autora do relatório, a redução da produção não vai afetar o fluxo de caixa da BP. Juntamente com outras medidas (redução da dívida, ganhos de eficiência, entre outras), o cenário indica que a empresa tem grandes chances de provar que a guinada estratégica foi a decisão acertada.

A concorrência

As empresas do setor de petróleo que querem se transformar em provedoras de energia “do futuro” têm a concorrência das companhias que já nasceram com essa missão.

Uma ruptura semelhante à causada pela tecnologia digital em setores como mídia e varejo não pode ser descartada. Ainda se vendem CDs e LPs, e as pessoas frequentam as lojas físicas – mas onde está o crescimento?

Segundo um levantamento do banco de investimentos Lazard, o custo para construir novas plantas de energia eólica ficou 88% mais baixo em 2020 em comparação com 2010. No caso da energia solar, a queda foi de 68%. Como comparação, a redução de custos na produção de gás natural caiu somente 28%.

De novas tecnologias de pás para turbinas eólicas a avanços expressivos na química das baterias, passando pelas metas agressivas das montadoras na produção de veículos elétricos, está claro para onde sopram os ventos.

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Sérgio Teixeira Jr.

Jornalista colaborador do InfoMoney, radicado em Nova York