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Fernando Zilveti é professor doutor livre-docente em direito tributário pela Faculdade de Direito da USP
Ninguém contesta o comando da regularização cambial e tributária determinada pela Lei 13.254/2016. O que se tem são dúvidas acerca dos procedimentos a serem adotados pelo contribuinte e suas consequências. Isso faz da chamada “lei de repatriação” um diploma inconstitucional, impreciso, confuso e injusto, promovendo grande insegurança jurídica ao cidadão. O STF e o governo devem consertar esse imbróglio antes de 31 de outubro deste ano, prazo final para adesão ao RERCT.Caso contrário, não atingirá a meta de arrecadação prevista pelo Governo.
A também conhecida como “lei de anistia fiscal” promete ao residente fiscal faltoso em suas obrigações tributárias e cambiais o benefício do perdão condicionado ao pagamento de imposto e multa. Tudo estaria bem se o contribuinte soubesse exatamente quanto pagar e como ele será beneficiado com a anistia de seus crimes. Ao não saber claramente quanto deve pagar e se, ao pagar, terá de fato a anistia, o contribuinte se encontra absolutamente desconfortável.Questões como a base para cálculo do tributo (saldo do dia 31/12/2014 x todo o saldo anterior),e quem deve aderir em casos de trust até foram tratadas pela Secretaria da Receita Federal, por meio de Perguntas e Respostas, mas não agradaram os contribuintes e tampouco os juristas. Pior: tais respostas trouxeram mais insegurança, fazendo com que os contribuintes aguardem até os “45 minutos do segundo tempo” para decidir se aderem, ou não, ao programa.
O que o fisco quer saber afinal com a lei de regularização cambial e tributária é o verdadeiro patrimônio do residente fiscal brasileiro no exterior. Verdade que já vinha tentando descobrir esse enigma há algum tempo, com leis penais, fiscais e cambiais que, por mais rigorosas que fossem e de fato são, não lograram até então convencer o contribuinte a abandonar a conduta delituosa. Mesmo ciente das graves penas previstas em lei, o contribuinte preferia correr o risco de ser apanhado, num delicado jogo de ocultação patrimonial. Até que veio a transparência fiscal internacional.
A busca pela transparência com o aumento da troca de informações fiscais entre os países é uma realidade mundial na qual o Brasil também faz parte. Além das trocas de informações previstas nos acordos para evitar a dupla tributação, o Brasil passará a trocar informações com os países signatários da Convenção Multilateral sobre Assistência Mútua Administrativa em Matéria Tributária.
Por meio destes instrumentos, os países podem trocar informações, documentos, dados e promover investigações coordenadas acerca do patrimônio de seus contribuintes, respeitado o prazo legal para lançar e cobrar tributos. Ainda sob a perspectiva dos tratados internacionais sobre transparência também é preciso verificar o tempo em que cada país determina a guarda de arquivos por suas respectivas instituições jurídicas e pessoas naturais. Nesse contexto, os agentes de governo podem descobrir o patrimônio de seus contribuintes, revelando a materialidade prevista nas leis penais, tributárias e financeiras.
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Apontada a materialidade do delito praticado pelo residente fiscal, graças à transparência internacional, ao contribuinte faltoso resta restrita margem de defesa. O RERCT criou uma ficção legal, dando ao contribuinte a oportunidade de revelar a materialidade em 31 de dezembro de 2014, pagar o imposto e multa e, assim, extinguir a punibilidade dos delitos a ele imputáveis pela ocultação patrimonial. A materialidade ficta do RERCT substitui as demais, sempre que o contribuinte atenda rigorosamente aos preceitos da anistia. Daí a oportunidade da legislação de regularização cambial e tributária, desde que ajustados seus termos ainda obscuros.