Bolsonaro tem suas primeiras vitórias no Congresso, mas quadro ainda inspira cautela

Cada casa legislativa impõe seu próprio desafio ao governo: na Câmara, cresce a dependência em Rodrigo Maia; no Senado, vitória circunstancial e fissuras impõem riscos futuros

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – A despeito da desconfiança inicial quanto às estratégias do governo Jair Bolsonaro (PSL) para construir governabilidade no parlamento, o primeiro grande desafio, representado pelas eleições para as mesas diretoras das duas casas legislativas, queimou a língua dos céticos. Com idas e vindas e batalhas intensas, o Palácio do Planalto conheceu suas primeiras vitórias nas duas casas legislativas.

Na Câmara dos Deputados, a situação foi mais tranquila. Rodrigo Maia (DEM-RJ) foi eleito presidente pela terceira vez seguida, com 334 dos 513 votos e o apoio do partido do presidente, que também conseguiu emplacar Luciano Bivar (PSL-PE), apesar das dificuldades, na segunda vice-presidência da casa. Além de substituir Maia em eventuais ausências, Bivar será responsável por examinar pedidos de ressarcimento de despesa médica e fomentar a interação institucional entre a Câmara e os demais órgãos legislativos.

A formação de um “blocão” com 11 siglas (PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN) e 301 deputados representados também garantiu a ocupação de seis dos sete postos na Mesa Diretora pelo grupo governista. Além do direito a presidir 15 das 25 comissões permanentes da casa, havendo prioridade nas primeiras dez escolhas – o que viabiliza o cumprimento do acordo para o PSL presidir CCJC (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania) e CFT (Comissão de Finanças e Tributação), as duas mais cobiçadas pelos congressistas.

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A tabela abaixo detalha a ordem de preferência dos blocos na distribuição das comissões na Câmara:

POSIÇÃO BLOCO
PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
10ª PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
11ª PDT, SD, Podemos, PCdoB, PROS, PPS, Avante, Patriota, PV e DC
12ª PT, PSB, PSOL, Rede
13ª PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
14ª PDT, SD, Podemos, PCdoB, PROS, PPS, Avante, Patriota, PV e DC
15ª PT, PSB, PSOL, Rede
16ª PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
17ª PDT, SD, Podemos, PCdoB, PROS, PPS, Avante, Patriota, PV e DC
18ª PT, PSB, PSOL, Rede
19ª PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
20ª PDT, SD, Podemos, PCdoB, PROS, PPS, Avante, Patriota, PV e DC
21ª PT, PSB, PSOL, Rede
22ª PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN
23ª PDT, SD, Podemos, PCdoB, PROS, PPS, Avante, Patriota, PV e DC
24ª PT, PSB, PSOL, Rede
25ª PSL, PP, MDB, PSD, PR, PRB, DEM, PSDB, PTB, PSC e PMN

“Há uma sinalização bem consistente de que o PSL entrou para jogar o jogo”, observa Vítor Oliveira, analista político da consultoria Pulso Público. Mesmo assim, ele alerta que ainda é cedo para o governo comemorar e diz que no momento não há garantias de que os partidos do novo “blocão” serão, de fato, base de apoio para a agenda do Planalto.

“Se concorresse sozinho, o PSL poderia ter sido atropelado. A fragmentação partidária é muito elevada, o índice de necessidade de coalizão mostra que, se o partido não compor com outros partidos, vai ter dificuldade de encaminhar agendas. Agora, uma coisa que pode acontecer também é daqui a pouco esse blocão escantear o PSL e começar a agir sozinho para controlar o colégio de líderes e o processo legislativa, mais ou menos como Eduardo Cunha fazia”, alerta.

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O sucesso da agenda de Bolsonaro passa necessariamente por uma boa relação com Maia.

Para ele, os resultados colhidos na eleição para a Mesa Diretora da Câmara representam mais claramente a capacidade de articulação política de Rodrigo Maia, que conseguiu construir um arco de apoio que perpassava a direita e a esquerda do espectro ideológico na casa.

“Foi positivo, especialmente se esse bloco se transformar em uma base aliada, ainda que construída por caminhos diferentes do que a distribuição de ministérios”, pontua Rafael Cortez, analista político da Tendências Consultoria Integrada. Para ele, o resultado reflete mais o pragmatismo dos partidos em busca de vagas em comissões. Também chamou a atenção a divisão na esquerda, com PT, PSB, PSOL e Rede ocupando o bloco de oposição e PDT e PCdoB dividindo o bloco de centro, com siglas como Podemos, Avante e até mesmo o DC.

No Senado Federal, a disputa foi mais emocionante. Houve bate-boca, pasta “roubada”, adiamento de sessão, judicialização e decisão relâmpago de ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) e até mesmo ocorrência de fraude em uma primeira tentativa de votação. Ao final, depois de mais de 12 horas acumuladas, Davi Alcolumbre (DEM-AP) foi eleito o novo presidente da casa, com 42 votos em um universo de 81 senadores.

O amapaense contou com o apoio determinante do ministro Onyx Lorenzoni (Casa Civil) para derrotar Renan Calheiros (MDB-AL), que tentava voltar ao posto pela quinta vez. Após perceber que seria derrotado, o emedebista abriu mão de sua candidatura ainda enquanto a votação acontecia, sem antes qualificar o processo, marcado por declarações públicas de voto e exibição de cédulas pelos senadores, de antidemocrático.

Os fios ainda estão desencapados na casa e o risco de incêndios futuros existe. Mais detalhes serão observados na escolha dos ocupantes dos demais cargos da Mesa Diretora, marcada para quarta-feira (6), às 15h (horário de Brasília).

Politicamente, foi um início favorável para o governo Bolsonaro. Apesar das dificuldades enfrentadas e de uma estratégia pra lá de heterodoxa adotada no Senado, a equipe política conseguiu chegar ao resultado desejável. Mesmo assim, cada casa impõe seus próprios desafios.

“Na Câmara, em linhas gerais, o tamanho da vitória de Maia deixa claro que qualquer agenda não avança sem seu consentimento. No Senado, Onyx Lorenzoni comemora a vitória, mas tem a tarefa de pacificar o ambiente”, pontuam os analistas da XP Política.

Apesar da derrota, Renan Calheiros continua sendo figura de peso na casa legislativa. Além da capacidade de influenciar colegas, o emedebista conhece como poucos o regimento interno e a burocracia. O alagoano saberá esperar o momento certo para se vingar da operação orquestrada pela Casa Civil, posteriormente endossada publicamente pelo senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente.

Passadas as eleições, cabe ao governo trabalhar pela cicatrização de feridas e tentar composições na Câmara e no Senado para tocar sua agenda. “Jair Bolsonaro inaugurou uma maneira diferente de compor seu ministério, com menor presença de indicações de dirigentes partidários. É natural que deputados e partidos que não estejam satisfeitos passem a demonstrar essa insatisfação. Até então não tinham instrumentos para isso. Passarão a tê-los a partir de hoje”, complementam os especialistas da XP.

Na prática, entende-se a vitória de Rodrigo Maia como um bom resultado para o ministro Paulo Guedes (Economia), que mantém boa interlocução com o parlamentar, em contraste com a ala política, encabeçada por Onyx Lorenzoni. O ministro da Casa Civil, por sua vez, venceu no Senado, onde a preferência da equipe econômica era por Renan Calheiros. É preciso monitorar nos próximos dias até que ponto os dois eventos estimularão uma nova disputa de força entre as alas política e econômica do governo.

Outro ponto a se destacar é que, de modo algum, os votos em Rodrigo Maia ou em Davi Alcolumbre simbolizam o tamanho real do governo no Congresso neste momento. Com isso, as expectativas são de que a reforma da Previdência não caminhe com a celeridade desejada pelo mercado.

“É factível imaginar que cada Casa tome um semestre deste ano para analisar a proposta. Março, como setores do governo chegaram a afirmar, é impraticável, e abril vai se mostrando um pouco cedo, uma vez que a reforma só será entregue dentro de alguns dias, e a base ainda pode estar fria neste primeiro quadrimestre”, projetam os analistas da XP.

Por fim, vale ressaltar que a heterodoxa estratégia política adotada pela equipe política no Senado, de uso da opinião pública como fator de pressão sobre a atividade parlamentar, dificilmente se mostraria eficaz na construção de apoio para a agenda de reformas econômicas. Ajudou a eleger Davi Alcolumbre – senador de primeiro mandato que ainda terá de mostrar a que veio –, mas não deverá criar uma onda de brasileiros clamando por uma reforma previdenciária.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.