Novo presidente do TSE põe em xeque única estratégia do PT para as eleições

Em manifestações recentes, o ministro Luiz Fux mostrou pouca tolerância com o uso de liminares por candidatos e disse que político "ficha-suja" é, antes de inelegível, "irregistrável"

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Empossado na última terça-feira (9) presidente do Tribunal Superior Eleitoral, o ministro Luiz Fux já pensa no legado que sua gestão deixará em um curto mandato, de seis meses, que prepararão o campo para a realização de uma das eleições mais incertas dos últimos tempos no Brasil. Nos primeiros dias à frente do órgão máximo da Justiça Eleitoral, o magistrado já deu alguns sinais de que o cumprimento estrito da Lei da Ficha Limpa e a redução dos espaços para o uso liminares serão batalhas assumidas desde o princípio.

Em entrevista concedida ao jornal O Globo e publicada na última quinta-feira, Fux foi questionado sobre como a situação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, atual líder nas pesquisas mas condenado em segunda instância no âmbito da Lava Jato, poderia tumultuar o processo eleitoral. Com uma ressalva preliminar de não querer referir-se a um candidato específico, o magistrado prosseguiu em sua resposta: “O ordenamento jurídico brasileiro hoje é claro no sentido de que, incidindo naquelas hipóteses (da Lei da Ficha Limpa), o candidato é inelegível. Isso não significa dizer que o candidato pode se registrar e ter o pedido de registro indeferido. Ele é irregistrável. Ela não pode oferecer registro de candidatura”.

“Sabemos que há quem sustente que a Lei das Eleições permite uma candidatura sub judice (com recurso judicial). A negativa do registro pressupõe um registro. E o que nós entendemos, em um primeiro momento, é que essas duas correntes vão balizar a controvérsia: uma que entende que os candidatos fichas-sujas são irregistráveis. E outra que entende que ele pode recorrer (da negativa) do registro”, complementou o magistrado.

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As palavras de Fux foram entendidas como um recado claro a Lula. Legalmente, não se sabe até que ponto é possível impedir alguém de registrar candidatura a algum cargo eletivo. Contudo, o discurso do magistrado acende um alerta ao ex-presidente e seu partido de que pode haver disposição em se chegar a uma conclusão no processo, do ponto de vista eleitoral, mais rápida e possivelmente com menos vias recursais à defesa.

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Para o advogado eleitoral Alberto Rollo, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, a fala de Fux abre a possibilidade para a conclusão mais célere da validação ou não da candidatura do ex-presidente Lula. Embora não seja consenso na Justiça Eleitoral, o especialista enxerga espaço jurídico para haver indeferimento de pedido de registro sem qualquer impugnação prévia. Ou seja, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) poderia negar o registro da candidatura de Lula antes que o Ministério Público ou adversários precisassem provocá-lo. Depois, corre um processo, mas já com o indeferimento valendo.

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Por se tratar de questão objetiva (pela Lei da Ficha Limpa, condenação em segunda instância implica em inelegibilidade) e passível de verificação pela documentação entregue pelo próprio candidato no ato do registro junto à Justiça Eleitoral, caberia decisão de ofício. “Para a presidência, há essa peculiaridade legal [impedimento de réus na linha sucessória]. Portanto, é óbice constitucional que inviabiliza a negativa do registro de ofício”, observou o advogado especializado em Direito Constitucional Marcones Santos, sócio do escritório Lopes, Leite & Santos Advogados Associados.

No entendimento da advogada eleitoral Karina Kufa, professora e coordenadora do curso de especialização em direito eleitoral do IDP-SP (Instituto de Direito Público de São Paulo), haveria ainda a possibilidade de precedente aberto com caso envolvendo Eduardo Cunha, na época em que presidia a Câmara dos Deputados, ser aplicado na situação da elegibilidade de Lula. Naquela situação, prevaleceu entendimento no STF (Supremo Tribunal Federal) de que réus na Corte não poderiam fazer parte da linha sucessória à presidência da República. Tal leitura foi reforçada por decisão do pleno do Supremo em proibir Renan Calheiros (MDB-AL), então presidente do Senado, de assumir a presidência. Ao contrário do deputado, o senador não foi afastado da presidência da casa que comandava, mas o entendimento sobre a linha sucessória se manteve.

A interpretação é contestada no meio jurídico, mas poderia ser usada como precedente na atual situação envolvendo Lula. O raciocínio para tal aplicação seria: se não são permitidos réus na linha sucessória, por que alguém que responde a processo criminal (ainda mais condenado em grau colegiado) poderia candidatar-se diretamente ao Palácio do Planalto? Neste caso, tudo dependeria da interpretação dos magistrados. Para Rollo, há espaço jurídico para tal desfecho. Contudo, ele acredita que nesse caso seria necessária impugnação. Outro entendimento ainda poderia ser posto no debate: o de que um presidente não pode ser processado durante o mandato por qualquer situação alheia ao exercício da função.

Mesmo observando algumas das situações possíveis apontadas pelos especialistas, ainda há muitos questionamentos sobre a exata mensagem que o novo presidente do TSE quis dar na entrevista concedida ao jornal O Globo. A princípio, é possível dar maior celeridade ao deferimento ou não de pedidos de registro de candidatura aplicando-se alguns dos entendimentos aqui apresentados. Contudo, não estão claros instrumentos que possam impedir qualquer cidadão de solicitar registro de candidatura junto à Justiça Eleitoral. “Previamente não haveria ferramentas para isso. O pedido de registro de candidatura é um pedido judicial, e, por força constitucional, o acesso à Justiça é regra maior”, afirmou Santos.

Para outro advogado eleitoral que não quis ter sua identidade revelada pela reportagem, o atual clima político pode ser favorável ao indeferimento imediato de pedido de registro de candidatura, sem as impugnações e defesas. “De qualquer forma, seria bem questionável não obedecer um processo eleitoral”, afirmou. Ele também não vislumbra mecanismos que impeçam qualquer cidadão de solicitar registro de candidatura. “O pedido de registro é feito online, qualquer um pode fazer. Seria estranho barrar, mas no TSE tudo é possível”.

De qualquer forma, do ponto de vista político, a fala de Luiz Fux pode ser entendida como um recado ao ex-presidente Lula e outros possíveis candidatos condenados pela Justiça, que podem ser enquadrados na Lei da Ficha Limpa. Essa é a leitura que faz o analista político Carlos Eduardo Borenstein, da consultoria Arko Advice. Ele lembra que, nas últimas eleições municipais, houve um volume muito grande de candidatos disputando por meio de liminares. “O SE liberou e, depois, alguns que ganharam não puderam assumir, mas acho que para a eleição presidencial vai ser diferente”, observou. Na última quinta-feira, o próprio Fux disse a jornalistas que o TSE poderá reavaliar a possibilidade de políticos condenados em segunda instância conseguirem disputar as eleições com base em decisões liminares.

Como se o cenário já não fosse negativo o bastante para a candidatura de Lula, caso prevaleça a interpretação de que réus não podem compor a linha sucessória, o ex-presidente teria ainda, caso eleito, que brigar na Justiça para poder tomar posse. “Mesmo que ganhe, nesta situação, estaria expressa decisão do Supremo de que não poderia assumir”, afirmou Borenstein. Pelo movimentar das peças no tabuleiro, é possível que o PT seja empurrado a lançar mão de um “plano B” muito antes do previsto.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.