A desunião Europeia

O temor dos agentes políticos que levaram a UE ao abismo que se encontra é com o risco do eleitor britânico contagiar os demais eleitores do continente europeu, que historicamente seguiram as tendências políticas contestadoras do sufocamento do contribuinte por meio de tributos.

Equipe InfoMoney

Publicidade

Colunista convidado: Fernando Zilveti, professor doutor livre-docente em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da USP

O Reino Unido decidiu sair da União Europeia, num movimento desagregador que surpreendeu o mundo globalizado, desabando indicadores econômicos e espraiando o pânico entre os dirigentes do bloco econômico, em grande parte responsáveis pelo cenário de desagregação que se apresenta. A Grã-Bretanha deu adeus à União Europeia seguindo a vontade da maioria, numa lógica da representação que aprendeu desde a Carta Magna para conter o poder de tributar.

Como em qualquer separação a primeira reação das partes é procurar responsáveis pelo ocorrido, determinar a culpa. Difícil é admitir a falência da união, cuja causa pouco importa senão no plano político. Os políticos devem cuidar agora para que a separação de um membro não motive outros a também abandonar o bloco econômico. A história pode não resolver o problema posto, mas justifica o comportamento separatista britânico e, por que não dizer, europeu. O povo britânico decidiu, mesmo dividido, que não deseja ser mal representado nas decisões que envolvam custos que, no final do dia, serão suportados por tributos.

Masterclass

As Ações mais Promissoras da Bolsa

Baixe uma lista de 10 ações de Small Caps que, na opinião dos especialistas, possuem potencial de valorização para os próximos meses e anos, e assista a uma aula gratuita

E-mail inválido!

Ao informar os dados, você concorda com a nossa Política de Privacidade.

Por diversas vezes ao longo da história britânica o contribuinte se insurgiu em situações análogas. Verdade que os britânicos nunca engoliram a União Europeia por completo, tinham entalado na garganta o alto custo fiscal do bloco. Esse engasgo fiscal tem efeito expectorante, levando o paciente contribuinte, mais cedo ou mais tarde, a expelir o todo.

As guerras de dominação que ilustram a história britânica custaram invariavelmente impostos escorchantes para o povo. Esses tributos provocaram repulsa, indignação e revolta do contribuinte, culminando com rejeição do fisco e até guerra civil. Foi assim no final do século XVIII com o “imposto da guerra” instituído contra a ameaça de Napoleão e seus exércitos (que viria mais tarde a ser transformado no conhecido de hoje imposto de renda). Mesmo o apelo da defesa da pátria contra o imperialismo francês não resistiu à vontade popular de não pagar tributos. 

Os britânicos são conhecidos por sua posição em favor do livre mercado, da economia aberta e de acordos comerciais, pilares ideológicos da União Europeia. Isso pode parecer uma incoerência da decisão popular de afastamento do bloco mas, ao contrário, reflete a insatisfação do povo com o afastamento da UE de seus propósitos originais. Os fundamentos da UE suportados pelos britânicos não são os mesmos do bloco da atualidade. Neste se observa um mercado fechado e protecionista. Esta UE subsidia a produção agrícola arcaica, incontáveis benefícios sociais, moeda artificialmente inflada e acordos internacionais reacionários que, ademais, custam caro para o contribuinte. Os britânicos preferem a liberdade de não pagar tributos à retórica de austeridade germânica. 

Continua depois da publicidade

Por trás dos movimentos de extrema direita e de extrema esquerda que insuflam os eleitores se encontra uma grande insatisfação do contribuinte com a perda de liberdade que a semi-federação ou confederação comunitária lhes impôs. O contribuinte simplesmente se fartou da dissimulação dominadora de seus pares da UE que não lhe trouxeram senão altos tributos sem representação popular.

O temor dos agentes políticos que levaram a UE ao abismo que se encontra é com o risco do eleitor britânico contagiar os demais eleitores do continente europeu, que historicamente seguiram as tendências políticas contestadoras do sufocamento do contribuinte por meio de tributos. Que durmam de botas e com olhos semiabertos, pois podem acordar defenestrados pela onda libertária que vem da Ilha.