Levy faz ofensiva para afastar o risco de rebaixamento da nota do Brasil

E o governo espera que o susto dado pela revisão da classificação do Brasil para negativa pela agência Standard & Poor’s faça o Congresso acordar e ajudar mais no ajuste fiscal. Os governistas, porém, falam em apoio “seletivo” às propostas do Ministério da Fazenda.

José Marcio Mendonça

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Mesmo tendo sido contrariado em parte de seu projeto de reorganização das contas públicas (por resistências do Congresso e dos partidos aliados e pela má-vontade de alguns colegas de governo), o ministro Joaquim Levy saiu ontem em campo para tentar reverter o agora ainda mais real risco de rebaixamento da nota soberana de crédito do Brasil depois que a Standard & Poor’s colocou o rating do Brasil sob observação. O que prenuncia – e se tornou para a boa parte dos analistas inevitável – um próximo rebaixamento da nota brasileira para grau especulativo.

Tão logo a notícia explodiu, segundo relato do jornal “O Estado de S. Paulo” o ministro passou a disparar telefonemas para investidores estrangeiros para acalmá-los e reiterar o compromisso do governo com a contenção dos gastos e a manutenção da relação dívida/ÌB em níveis responsáveis.

E à noite, depois de cancelar uma entrevista de Levy, marcada para analisar a decisão de S & P (que pode ser seguida nos próximos meses de medida semelhante pela Moody’s e pela Fitch), o Ministério da Fazenda soltou uma nota em que reafirma o que o ministro disse aos investidores e diz que o processo de reequilíbrio das contas e da economia será “robustecido por ações fiscais de caráter estrutural, inclusive a partir da medição da qualidade e resultados do gasto público, notadamente o de caráter obrigatório, que permitam garantir uma trajetória decrescente para a relação dívida/PIB no médio prazo”.

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As razões que levaram a S & P revisar a nota brasileira foram explicitadas pela responsável por Brasil na agência, Lia Schneller, e se concentram exatamente nas fragilidade das contas nacionais. Ela citou também a questão da corrupção e da Operação Lava-Jato. Outro ponto que influenciou a ação da agência foi a questão política, as dificuldades com o Congresso e com os aliados, dos quais parte do ajuste fiscal depende.

Mentirinha piedosa
Para tentar reverter essa opinião sobre a situação política, o ministério da Fazenda, em sua nota, liberada no fim da noite, aplicou o que se poderia chamar de uma “mentirinha piedosa”. Diz o texto:

“O esforço fiscal tem-se beneficiado da cooperação com o Congresso Nacional, que votou importantes leis relativas ao seguro-desemprego e pensões, e contempla outras propostas do governo, notadamente a de redução da despesa do Tesouro Nacional associada ao não pagamento das contribuições patronais por firmas de setores atualmente desonerados dessa obrigação.”

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Ora, na realidade, o Congresso mutilou algumas das propostas do ajuste de Levy e caminha também para alterar a “reoneração tributária” – o que, somados, devem tirar cerca de R$ 12 bilhões do ganho fiscal inicialmente pretendido pelo ministro, uma perda de quase 50%. Ademais, o Congresso resiste a apoiar outra medida levantada pelo ministro para engordar os cofres do Tesouro: a criação de um imposto para a repatriação de recursos de brasileiros no Exterior.

Não foi por outra razão, além da queda na arrecadação por causa da baixa atividade econômica, que o governo baixou na semana passada de 1,1% do PIB para 0,15% seu compromisso de superávit primário este ano e ainda criou uma defesa, caso a receita tributária frustre as previsões ainda mais, que permite transformar o superávit em déficit.

O governo tenta agora fazer uma limonada desse limão que lhe foi servido e já ensaia o discurso para convencer o Congresso Nacional a reduzir as resistências ao que ainda resta de ajuste fiscal. O discurso é o recado de que a situação econômica  pode ficar muito mais grave do que já está sem a nota soberana está dado. E o risco é fato real, não apenas alegações do ministro Levy.

Não levar a sério a avaliação?
No Palácio do Planalto acredita-se até que o susto vai levar os parlamentares a uma atitude mais responsável. Se o Congresso não ajudar, a perda do grau de investimento vira “favas contadas”. Segundo relato de “O Globo”, em conversas com a Fazenda, a própria analista responsável pela avaliação do Brasil na S&P, Lisa Schineller, já disse às autoridades que a ameaça de rebaixamento de fato pode agir positivamente sobre o ânimo dos políticos.

É saber se a ameaça funciona mesmo num Congresso com extrema má vontade, com um governo tão popularmente mal avaliado ,e com os olhos voltados para a eleição do ano que vem e a própria sobrevivência política.

De acordo ainda com o “Globo” (aliás, completando hoje 90 anos), alguns líderes partidários ontem diziam que tudo não passa de um “jogo combinado” da agência com o comando econômico para “deixar a bomba estourar” no Congresso.

A reação do líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), mostra que pelo menos nesse primeiro momento a ficha não caiu no Legislativo: ele menosprezou o papel da agência e disse que esse tipo de avaliação não deve ser levado em conta. O deputado chamou ainda de “firulas” as decisões da agência sobre o Brasil.

Escreve o “Valor Econômico” que a base aliada está propensa a dar apoio “seletivo” aos projetos de ajuste fiscal. Os governistas estariam exigindo que o Palácio do Planalto também faça a sua parte, reduzindo gastos da administração. Eles também rejeitariam propostas que levassem a novos aumentos de tributos.

Uma dúvida: a ação da Standard & Poor’s terá alguma influência sobre a decisão do Comitê de Política Monetária hoje?

  

Outros destaques

dos jornais do dia

 

CONFIANÇA DOS SETORES DE SERVIÇOS E CONTRUAÇÃO AINDA EM QUEDA – As sondagens da FGV dos setores de construção e serviços referentes a julho exibiram nova queda da confiança para patamares mínimos históricos. Na construção civil, o índice de confiança recuou 4,7% em relação a junho. Esse comportamento refletiu a queda de 7,0% do índice de expectativas e de 1,2% do índice de situação atual. No mesmo sentido, a confiança do setor de serviços recuou 2,9% na passagem de junho para julho. O índice de situação atual subiu 4,8%, enquanto o componente de expectativas recuou 7,1%, puxando para baixo o índice cheio. A piora da avaliação dos empresários em relação à situação atual e futura dos negócios reforça o cenário de retração da atividade doméstica na passagem do segundo para o trimestre do ano (Análise do Departamento Econômico do Bradesco)
 
E MAIS:
  
– “Ex-tesoureiro do PT visitou sede da Andrade Gutierrez 53 vezes em 7 anos” (Globo)

– “Justiça aceita denúncia contra presidente da Odebrecht e mais 12” (Globo/Estadão/Folha)

 “Operação avança sobre o setor elétrico e prende presidente da Eletronuclear” (Estadão)

– “País tem de gastar até 3 vezes mais com aluno para garantir ensino de qualidade” (Estadão)

– “GM dobra plano de investiments no Brasil para R$ 13 bilhões até 2019” (Estadão)

– “Governo deve um R$ 1 bi a bancos [públicos] por pedaladas” (Globo)

– “Cobrança extra na conta de luz é mantida em agosto” (Globo)

– “Levy reabre Carf e diz que dúvidas são passageiras” (Folha)

– “Prestadoras de serviços de telecom demitem 450 mil empregados no país” (Folha)

LEITURAS SUGERIDAS

  1. Editorial – “Levy e a herança de erros” (diz que Dilma terá de renegar 12 anos de política econômica petista se quiser consertar as contas do governo e tirar o país do sufoco) – Estadão 
  2. Celso Ming – “Morro abaixo” (diz que é praticamente inevitável o rebaixamento dos títulos do Brasil para grau de especulação) – Estadão 
  3. Editorial – “Quanto pior, pior” (diz que mudança da perspectiva da nota de crédito do país aumenta a importância do consenso político capaz de reerguer a economia nacional) – Folha
  4. Cristiano Romero – “A grande recessão” (diz que com crise fiscal, governo fraco, instabilidade política, confiança de consumidores e empresários abalada, a economia do Brasil entrou numa tempestade mais que perfeita) – Valor
  5. Editorial – “Equipe econômica não jogou a tolha; mudou a estratégia” (diz que falta coragem ao governo propor reajustes que passam por revê benefícios por ele concedidos, e, ao Legislativo, maior responsabilidade fiscal) – Valor