Engenheiro descobre insider trading na Bolsa da Rússia dias antes da invasão à Crimeia

Fórmulas matemáticas desvendaram que um grupo de investidores já sabia dos planos da Rússia dias antes da invasão e usaram a informação para ganhar dinheiro na Bolsa

Paula Barra

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, que deve ser reeleito para mais seis anos
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, que deve ser reeleito para mais seis anos

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SÃO PAULO – No dia 3 de março de 2014, a bolsa russa acordou com uma queda de mais de 10% em meio ao anúncio de que o presidente do país, Vladimir Putin, havia invadido a Crimeia. A notícia que mexeu com o mundo naquele dia, não era novidade para um grupo de investidores. O que se descobriu agora é que alguns agentes do mercado já haviam antecipado aquele movimento e conseguiram lucrar com a crise geopolítica que se instalou desde então. 

Um modelo matemático desenvolvido recentemente apontou que os movimentos ocorridos na Bolsa russa dias antes à invasão não foram nada comuns. Usando fórmulas avançadas, um brasileiro que está à caminho do seu segundo ano em um PhD em Finanças na Cornell University e sua colega russa, Ekaterina Volkova, descobriram que houve “insider trading” (uso de informação privilegiada) na ocasião. 

Em entrevista exclusiva ao InfoMoney, Felipe Bastos Gurgel Silva, que tem sua formação em engenharia pelo ITA (Instituto Tecnólogico de Aeronáutica) e tem interesses em pesquisas empíricas de como decisões políticas afetam as corporações, disse que decidiu testar um modelo aperfeiçoado por ele e sua colega em algum país e ver se funcionaria. A ideia surgiu bem quando os conflitos naquela região estouraram e por isso escolheram aquele evento. Por sorte, deu certo. 

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A ferramenta, que foi desenvolvida originalmente, em 1990, por dois professores da Cornell University, David Easley e Maureen O’Hara, apontou, com 90% de probabilidade, que houve “insider trading” naqueles dias na Bolsa russa. “Com 90% de certeza, o mercado já sabia dois dias antes que a Rússia iria invadir a Crimeia”, disse.

Essa probabilidade é chamada de VPIN (Volume-Synchronized Probability of Information Trading), que leva em conta o fato de que o volume de negociações pode ser visto como um indicativo da quantidade de informações geradas no mercado e incorporada nas transações. “Em dias normais, a Bolsa russa tem um VPIN, em média, de 30%”, comentou. O fenômeno foi observado não apenas para o principal índice de ações da Rússia, o RTS, como para outras ações específicas negociadas naquela dia. 

O que pode-se dizer com isso é que alguns participantes do mercado com conexões com membros do governo já sabiam, não apenas dos planos da invasão, como o momento exato que isso ocorreria e puderam se antever à queda do mercado e até ganhar com ela, disse Silva.

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Segundo ele, o modelo poderia ser replicado em outros mercados, embora no Brasil a situação seja um pouco mais complicada para usar essa ferramente já que não há tantas informações disponíveis no mercado. “A maior dificuldade desse tipo de análise em mercados emergentes é que eles não disponibilizam dados suficientes”, disse, que antes de voltar-se à área acadêmica já passou por bancos como Itaú e Santander. Apesar das limitações, pode ser questão de tempo para que essas ferramentas chegue às mãos da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) aqui no Brasil e defenda a integridade do mercado.