Dicas de investimento: a obsessão que não leva os investidores a lugar algum

Quantos investidores seguem dicas visando serem bilionários como Warren Buffett? E quantos já conseguiram?

Giulia Santos Camillo

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SÃO PAULO – O que você faz quando vê banners ou propagandas de “ganhe dinheiro fácil e rápido”? Por que, então, com a bolsa deveria ser diferente? Boa parte dos pequenos investidores está disposta a seguir os movimentos dos chamados gurus financeiros atrás de altos rendimentos nas bolsas de valores, ignorando o senso comum de que, se isso desse certo, haveria muito mais bilionários no mundo.

“Conselhos de gurus são pouco eficazes. A lista de novos milionários não guarda relação com o número de livros vendidos pelos gurus”, afirma João Alberto Peres Brando, economista da LCA Consultores. “Isso me leva a crer que o guru ou aconselha deliberadamente de forma errada ou simplesmente suas estratégias não funcionam fora do contexto no qual uma vez funcionaram para ele”, completa.

A ideia de Brando encontra ecos no discurso da professora da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo, Ana Maria Bianchi. Especialista em sociologia econômica, a professora afirma que se os gurus “contassem a fórmula do seu sucesso – se é que eles sabem – não haveria mais sucesso”. Afinal, quando existe uma receita que todos conseguem seguir, acaba o extraordinário.

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A obsessão dos investidores

Mesmo com a baixa probabilidade de dar certo, a estratégia de seguir os gurus virou obsessão dos investidores individuais, especialmente dos mais leigos. A análise dos papéis e da economia foi substituída por uma cultura de dicas: ao invés de prestar atenção nas avaliações micro e macroeconômicas dos profissionais, o interesse hoje é apenas pelas recomendações do que comprar e vender.

Se não fosse suficientemente clara antes, essa situação veio à tona durante a crise financeira, quando o papel das recomendações dos analistas foi questionado. Aliás, é aí que entra a obsessão dos investidores. “Os gurus funcionam como bodes expiatórios. Se ocorre algum problema com o investimento, a culpa é do guru. Foi ele quem sinalizou errado”, explica Ana Maria.

Enquanto os investidores precisam entender que analistas e gurus não possuem bolas de cristal e não podem prever o futuro, os especialistas – especialmente os megainvestidores – deveriam deixar isso claro. Eles poderiam falar também sobre seus fracassos, mas concentram-se na parte boa, que atrai mais público.

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Necessidade de seguir alguém

Apesar de estar em destaque, essa tendência não é prerrogativa de hoje: é antiga e deve continuar no futuro. “Acho natural que as pessoas sigam determinadas referências. Isso acontece não só na economia, mas em diversas áreas. Todo mundo quer desvendar o segredo dos bem-sucedidos, de como eles chegaram lá”, avalia a professora.

“Já ouvi falar também de apelos a videntes e mapas astrais. Isso é um sinal de que os investidores estão em uma situação do tipo: não creio em bruxas, mas que elas existem, existem. Ou seja, mesmo nas partes mais palpáveis, concretas e numeradas da sociedade, sobrevivem fortes crenças. Muitos não esperam esse tipo de comportamento místico vindo do mercado financeiro”.

Tips are for waiters

Na bolsa, contudo, há caminhos mais eficientes para investir bem. Isso não significa que as recomendações dos analistas sejam inúteis e sim que elas devem ser avaliadas de forma realista, dentro de seu contexto. Como explicou o showman Jim Cramer no manifesto de seu programa televisivo Mad Money, “meu trabalho não é falar para vocês o que pensar, mas ensinar a vocês como pensar sobre os mercados como um profissional. Meu trabalho não é sobre dar dicas que farão com que você ganhe dinheiro do dia para a noite – tips are for waiters”.

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Não deveria ser novidade para os investidores que, para chegar nas recomendações de compra e venda, os analistas elaboram modelos, com premissas micro e macroeconômicas, que o levam a um preço teórico para os papéis analisados. “É muito pretensioso chamar isto de preço-alvo da ação. A ação no mercado só chegará a este valor se todos os agentes concordarem com as premissas assumidas pelo analista, algo pouco provável. Daí a importância de se dar ampla divulgação às premissas consideradas em cada análise”, frisa Brando, da LCA Consultores.

Para o economista, o que há de mais útil nestes relatórios não é o preço-alvo de cada ação, mas sim a tendência do mercado no qual a empresa está inserida e como, na visão do analista, a companhia terá condições de aproveitar estas tendências para gerar valor a seus acionistas. É desse tipo de informação que o investidor deve fazer uso, considerando sempre as análises cujas premissas julgue mais factíveis serem concretizadas.

Onde olhar?

Se, por outro lado, o investidor quiser tomar as decisões sozinho, ele poderia seguir as fontes primárias que os analistas usam, que, de acordo com Brando, seriam as projeções macroeconômicas de bancos ou consultorias, notícias e informações setoriais, que geralmente são feitas por associações da indústria, consultorias ou mídia especializada, e informações junto à própria empresa. “O departamento de relações com investidores serve justamente para isso”.