Com vacinas e após o boom das techs, quais setores vão se destacar na bolsa americana em 2021?

Wall Street já se recuperou do tombo causado pelo coronavírus em março do ano passado, e a alta deve continuar, segundo analistas

Rodrigo Tolotti | Anderson Figo

(Shutterstock)

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SÃO PAULO – A pandemia de coronavírus colapsou os mercados no início de 2020, com as bolsas derretendo em março. Mas a enxurrada de dinheiro injetada nas economias para conter os efeitos negativos da crise empurrou Wall Street para uma forte recuperação até dezembro, e os índices por lá fecharam o ano passado com boas valorizações, a despeito do aumento de infectados e mortes — e esse movimento deve continuar em 2021, segundo analistas.

Após o índice S&P 500 (que engloba as 500 maiores empresas de capital aberto nos Estados Unidos) avançar 16,3% nos últimos 12 meses, a expectativa da maior parte dos analistas é que este seja mais um ano positivo para o mercado americano. As projeções menos otimistas indicam ganho de pouco mais de 1%, enquanto as mais otimistas vislumbram alta de mais de 20%.

“Vemos o S&P 500 atingindo 4.000 pontos no início do próximo ano”, escreveram em relatório os estrategistas do JPMorgan liderados por Dubravko Lakos-Bujas. “Nosso cenário-base é 4.400 pontos, com uma margem de 4.200 a 4.600 pontos”. Ou seja, no cenário mais otimista, o índice americano pode subir 22,5% em 2021. O S&P encerrou o ano passado aos 3.756 pontos e atualmente está próximo de 3.800 pontos.

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O banco espera que a maior parte da alta do mercado ocorra no primeiro semestre, mas os analista acreditam que o cenário positivo deve durar até o fim do ano, quando uma recuperação econômica mais plena ocorrer.

E se de um lado essas projeções reforçam que o rali visto desde o início do segundo semestre de 2020 deve continuar, para muitos investidores a dúvida que fica é em quais ações e setores ficar de olho agora. Será que os papéis de tecnologia, o grande destaque do ano passado, ainda vão continuar em alta?

Em geral, a visão é que as chamadas “big techs”, ou gigantes de tecnologia, sigam como uma boa opção em 2021, mas deixem de ser o melhor setor conforme as companhias que ficaram para trás na crise começam a engatar uma alta maior com o andamento das vacinas e a esperada recuperação econômica.

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“Muito provavelmente a gente vai ver uma troca de liderança importante conforme a economia vai melhorando e a gente tem espaço para crescimento de lucros de empresas que estão mais expostas à retomada econômica”, avalia Felipe Taylor, gestor de ações da MAG Investimentos.

“As empresas de tecnologia, de internet, que foram destaque em 2020, não têm valuations que gerem desconforto, devem continuar performando bem, mas não devem voltar a ser destaque em 2021″, continua ele, que acredita que este ano o crescimento será “bastante superior” ao de 2020.

Já o Goldman Sachs – que vê o S&P 500 em 4.300 pontos no fim deste ano – admite estar bem otimista, em um cenário em que projeta uma melhora dos resultados corporativos junto com as baixas taxas de juros como algo que guiará os ganhos em ações.

O Wells Fargo, por sua vez, vê os lucros das empresas subindo perto de 30% em 2021, ajudando a fundamentar alguns dos valuations exagerados em ações de crescimento, que empurraram o valuation médio do S&P para mais de 30 vezes os lucros anuais – bem acima das 22 vezes apresentadas no ano passado.

Confira as projeções para o S&P 500 em 2021:

Instituição Projeção para o S&P 500 em dezembro de 2021 Variação em relação o fim de 2020
JPMorgan 4.400 pontos +17,15%
Goldman Sachs 4.300 pontos +14,48%
Oppenheimer 4.300 pontos +14,48%
Credit Suisse 4.200 pontos +11,82%
BMO 4.200 pontos +11,82%
UBS 4.100 pontos +9,16%
CFRA 4.080 pontos +8,63%
Barclays 4.000 pontos +6,50%
BTIG 4.000 pontos +6,50%
Deutsche Bank 3.950 pontos +5,17%
Morgan Stanley 3.900 pontos +3,83%
Wells Fargo 3.900 pontos +3,83%
Citigroup 3.800 pontos +1,17%
Bank of America 3.800 pontos +1,17%

Setores para ficar de olho

Com a expectativa pela vacinação em massa e consequente recuperação econômica com a redução do isolamento social, analistas apontam que 2021 deve confirmar a rotação de ações vista já desde o fim do ano passado. Ou seja, os investidores estariam saindo de ações de “crescimento”- empresas em rápida expansão com potencial não realizado – para ativos de valor – papéis de empresas com receita estável e alto rendimento de dividendos – e cíclicos.

Diante disso, o principal foco de investimento deve ser papéis que ficaram para trás ou sofreram muito com a crise, e neste sentido o setor de consumo discricionário, como as empresas de lazer, turismo, varejo e manufatura, além das petrolíferas, estão entre as mais recomendadas pelas principais instituições.

“Não se tem muito bem clara quais são as metodologias para justificar o que é uma empresa de crescimento ou o que é uma empresa de valor. Mas olhando um dos índices que a gente acompanha, o índice de valor perdeu 3% em 2020 e o de crescimento subiu 32%. Ou seja, um alfa, um outperform de 35%”, destaca Fernando André Martin, analista de BDRs da Levante.

Diante disso, ele acredita que as ações de valor, com setores mais tradicionais, possam ter um desempenho relativo um pouco melhor sobre as empresas de crescimento em 2021 em comparação ao ano passado.

“Temos a expectativa de um pouco mais de inflação nos sistema econômico global, um aumento nos preços das commodities, os bancos também ficaram um pouco para trás em 2020 e devem se recuperar neste ano – isso vale para Brasil também”, avalia.

Mas nem por isso as ações de tecnologia devem ficar para trás. O setor deve seguir forte este ano, mas não será o grande destaque da bolsa americana. Além disso, companhias farmacêuticas expostas à vacina também são apontadas como boas opções pelos analistas.

Para completar, ativos de cannabis e mais relacionados ao meio ambiente também entraram no radar recentemente diante da confirmação da conquista da maioria no Congresso dos EUA pelos democratas, o que indica que pautas que favoreçam estes setores podem ser aprovadas. Confira abaixo as análise para cada setor:

Saúde

Analistas destacam este como um dos principais destores para 2021, e se o investidor pensa logo nas companhias ligadas à produção de vacinas, há outros “vencedores” na área.

O JPMorgan destaca em relatório que “provedores de serviços de saúde são potenciais beneficiários da demanda médica reprimida (procedimentos adiados e cirurgias eletivas, por exemplo)”. “Apesar de uma desaceleração global em 2020, espera-se que a saúde entregue outro ano de forte e saudável crescimento, com ganhos de 7%”, avaliam.

Alguns estrategistas também destacam companhias farmacêuticas que sofreram com uma mudança ou redução de uso de seus medicamento por conta da alteração das estruturas hospitalares para atendimento contra a Covid-19.

Tecnologia

Para Felipe Taylor, gestor de ações da MAG Investimentos, as empresas de tecnologia e de internet, que foram destaque em 2020, não têm valuations que gerem desconforto apesar da forte alta dos últimos meses. Ele acredita que o setor deve continuar performando bem, mas não deve voltar a ser destaque em 2021.

O grupo dos FAANG (Facebook, Amazon, Apple, Netflix e Google), ou FAAMG (que troca Netflix por Microsoft), segue como uma boa opção dada a resiliência destas companhias, que estão entre as maiores do mundo. Mas especialistas apontam que outras áreas podem se destacar.

A explicação é que alguns hábitos adquiridos na pandemia, como entregas e compras online, deve permanecer neste momento de recuperação econômica. Por isso, companhias que estejam ligadas ao negócio de fornecimento de infraestrutura de e-commerce e de informações podem ser ganhadoras.

Além disso, algumas empresas que não se beneficiaram da tendência de isolamento no ano passado também criam oportunidades, em especial fabricantes de semicondutores e outros componentes eletrônicos. Elas tendem a se beneficiar conforme o consumo aumente e também a produção de equipamentos retome seu nível normal.

Entretenimento

Um dos setores mais prejudicados pelo isolamento social, o entretenimento não deve ter um “boom” de retorno, já que a expectativa é que a vida volte ao que era antes de forma gradual, mas especialistas apontam companhias voltadas para diversão, como shows e parques de diversão, como algumas das mais descontadas da bolsa neste momento e que devem se reerguer.

Companhias fabricantes de brinquedos também estão no radar. Para Eric Handler, analista da MKM Partners, a Hasbro pode ser uma boa escolha conforme a indústria se recupera em 2021, entrando no ano com um estoque baixo. Ele lembra que a volta da vida normal deve levar também ao lançamento de mais filmes e como a Hasbro tem uma grande variedade de licenciamentos, pode ganhar com a produção de novas mercadorias.

Restaurantes e fast food

Outro setor bastante prejudicado com a crise, os restaurantes passaram os últimos meses alternando entre fechados, abrindo apenas para retiradas e entregas, jantares em áreas abertas e fechados novamente.

Muitas companhias tiveram que mudar sua estrutura de negócio para conseguir funcionar de alguma forma permitida pelos governos, o que, por sua vez, gerou mais custos no ano passado.

Agora, várias dessas empresas aparecem descontadas na bolsa e podem ser uma boa opção com a retomada dos negócios.

Varejo e bens duráveis

As varejistas foram duramente impactadas pela pandemia, mas diferente de outros setores, muitas tiveram a opção de mudar o seu negócio e apostar no e-commerce.

Agora, analistas apontam que boas ações no setor serão as empresas que conseguirem se adaptar ao “novo normal”, com o home office sendo adotado por muitas empresas. Ou seja, o investidor estará de olho em quem conseguir estruturar suas vendas online e ainda oferecer opções flexíveis, como devolução gratuita, ou descontos para clientes.

Em geral, analistas destacam os itens do chamado consumo discricionário, ou seja, que não são essenciais. “Antes do choque da Covid-19, os bens de consumo duráveis viram um vento contrário significativo em relação às tarifas EUA/China”, afirmam os analistas do JPMorgan.

“Se houver alguma flexibilização na frente comercial por parte do governo Biden, esta seria outra fonte de expansão de margem para o setor, que é nossa principal escolha para 2021”, completam.

Aéreas e turismo

O setor que praticamente parou com a pandemia segue na esperança de em breve aumentar o fluxo conforme as medidas de restrição são reduzidas. A projeção é que o momento atual, com as restrições de locomoção ainda em vigor, seja bom para investir nestes papéis, que estão baratos e podem subir forte com a retomada.

A retomada da vida normal levará à volta dos voos e alguns analistas esperam um grande salto na demanda. Além disso, se o e-commerce seguir forte como no ano passado, o transporte de mercadorias, seja pelo ar ou de forma marítima, poderá impulsionar diversas empresas.

Especialistas citam não só empresas que transportam mercadorias, mas também aquelas que fabricam produtos relacionados ao transporte, como gelo seco para remessas de vacinas e outro tipo de suprimentos.

Cannabis

Este é um setor que está sempre no radar dos analistas, mas que não vinha sendo apontado como um dos principais para 2021. A conquista do Senado pelos democratas, porém, pode mudar esse cenário, já que há uma expectativa de que pautas voltadas para a descriminalização da maconha possam andar no Congresso, o que deve favorecer bastante essas ações.

A Câmara já aprovou um projeto em dezembro para descriminalizar e taxar a maconha em nível federal, mas o projeto está parado no Senado, que até o início desta semana era controlado pelos republicanos.

A legalização da maconha para uso recreativo em Montana, Nova Jersey, Dakota do Sul e Arizona também tem movimentado o setor no país, e há rumores de que Nova York já esteja estudando seguir a mesma linha. Até agora, apenas 15 dos 50 estados americanos legalizaram totalmente a maconha, enquanto outros 16 descriminalizaram a droga para uso não médico.

Financeiro

“Embora o crescimento da receita e as preocupações com o crédito permaneçam, uma combinação de suporte fiscal e monetário deve sustentar um ambiente de crédito mais fácil para empresas e consumidores no curto a médio prazo”, afirma o JPMorgan.

Analistas acreditam que o cenário de ajuda econômica fornecido pelo Federal Reserve deva sustentar o setor, principalmente com um governo democrata, que historicamente tem uma tendência a gastar mais com estímulos.

Por outro lado, houve uma mudança de visão geral que pode pesar no futuro, mas ainda é incerto. Especialistas apontavam que um Congresso dividido seria benéfico para evitar um aumento de impostos corporativos ou mudanças regulatórias.

Como os democratas ficaram com a Câmara e Senado, há um risco maior que essas pautas sejam aprovadas. Mesmo assim, fica a dúvida, já que analistas políticos reforçam que mesmo com a “onda azul”, Biden não terá facilidade para aprovar qualquer tipo de projeto.

Petróleo

Junto com companhias aéreas e turismo, as empresas de petróleo estão entre as maiores perdedoras da pandemia. No início da crise, os preços futuros da commodity chegaram a ficar negativos pela primeira vez na história.

A expectativa agora é que a retomada da vida normal deva aumentar a demanda por combustíveis, tanto para veículos sobre rodas mas também da querosene de aviação. Por outro lado, analistas não enxergam o preço do barril do petróleo subindo tanto em 2021.

“Dado o acentuado desempenho inferior, este setor é o menos detido [por investidores] e é universalmente odiado”, afirmam os estrategistas do JPMorgan, que aponta que a questão da ação do governo será o principal ponto de preocupação para companhias mais ligadas a terras e oleodutos.

Se até pouco tempo a projeção era de um Congresso dividido nos EUA, com a Câmara democrata e o Senado republicano, o fato do partido de Biden ter conseguido o controle das duas Casa pode trazer preocupações sobre regulações nos próximos meses.

Commodities

As commodities devem seguir em alta em 2021, segundo Otávio Costa, gestor da Crescat Capital, que enxerga uma “grande oportunidade” no setor — o que inclui ações de petroleiras e pequenas mineradoras na bolsa dos EUA focadas em metais preciosos.

“Nós vimos recentemente commodities começando a quebrar uma resistência de 12 anos […] Eu acho que commodities vai continuar sendo a bola da vez este ano. Começou no fim do ano passado. Tudo relacionado a commodities vai se dar bem este ano”, afirma.

Ele diz ainda que está posicionado em metais preciosos. “Nós estamos vendo uma queda significativa nas reservas de ouro e prata por falta de produção devido à pandemia. O que deve acontecer é um problema de oferta entre as commodities, o que deve fazer os preços subirem”, avalia.

“A demanda por commodities vai voltar com a oferta restrita. Isso vai causar uma explosão nos preços das commodities, principalmente metais preciosos e petróleo. A gente viu ouro subindo já, prata subindo também, mas a gente ainda não viu o petróleo subindo ainda. Vai acontecer”, completa ele destacando também oportunidades no petróleo.

Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.