Atingidos de maneiras opostas pela pandemia, Airbnb e DoorDash preparam o IPO

Startup que revolucionou o setor do turismo e empresa de entregas que explodiu nos EUA durante a pandemia se preparam para abrir o capital

Sérgio Teixeira Jr.

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NOVA YORK – Um dos unicórnios mais famosos do mundo – e um dos mais afetados pela pandemia do coronavírus – deve fazer seu IPO. Na próxima semana, o Airbnb vai à bolsa.

Apesar da oferta inicial ser esperada há muitos meses, seu timing pegou muita gente de surpresa, já que o setor do turismo foi um dos mais afetados pela crise sanitária global.

Mas os executivos do Airbnb, startup fundada em 2008 que transformou todas as casas em potenciais hotéis e revolucionou o segmento do turismo, acreditam que a empresa está bem posicionada para a retomada que se desenha no horizonte.

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E o apetite dos investidores por ofertas iniciais parece grande. Além do Airbnb, diversas outras startups do setor de tecnologia devem abrir o capital nas próximas semanas.

O Airbnb anunciou que o preço da ação deve ficar entre US$ 44 e US$ 50. O valor será definido na quarta-feira (9), e as ações começam a ser negociadas no dia seguinte. A expectativa é que a empresa seja avaliada em US$ 35 bilhões.

No prospecto da oferta, a empresa afirma estar confiante nas perspectivas futuras. “Acreditamos que as fronteiras entre viajar e morar estão desaparecendo, e a pandemia acelerou a possibilidade de morar em qualquer lugar.”

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Além disso, a companhia afirma que as pessoas usarão a plataforma como uma maneira de obter rendimentos adicionais, alugando quartos ou casas inteiras.

Mas essa é uma visão para o futuro. No presente, os números de 2020 do Airbnb mostram um encolhimento brutal do negócio.

Nos primeiros nove meses do ano, a empresa teve receita de US$ 2,5 bilhões, uma redução de US$ 1,2 bilhão em comparação com o mesmo período do ano passado.

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A startup, porém, agiu de forma rápida e decisiva para se adaptar à nova realidade das viagens – e da vida – num mundo tomado pelo medo da Covid-19.

Com as restrições de viagens internacionais e o medo de entrar num avião, e também por causa do isolamento forçado, as pessoas começaram a buscar destinos mais próximos de suas casas.

Os primeiros sinais surgiram em maio. No mês seguinte, a empresa reformulou seu algoritmo para sugerir opções menos distantes. Em julho, o volume de reservas já tinha voltado aos níveis pré-pandemia – embora com um perfil diferente.

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“Não sabia que teria de tomar dez anos de decisões em dez semanas”, disse Brian Chesky, fundador e CEO do Airbnb, numa entrevista recente ao The Wall Street Journal.

A agilidade da empresa diante de uma ameaça potencialmente mortal ao negócio foi o que permitiu que o Airbnb seguisse adiante com o IPO.

Mas a adaptação à nova realidade não foi indolor. Em maio, a companhia demitiu 1.900 funcionários, um quarto de seu pessoal. Projetos para expandir o negócio para o transporte aéreo, por exemplo, foram temporariamente interrompidos.

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E a empresa ainda é deficitária. Segundo as informações registradas na Bolsa, o Airbnb teve prejuízo de US$ 1,4 bilhão em 2019 e de US$ 2,1 bilhões até 30 de setembro deste ano.

O grande salto digital

Outra estreia aguardadíssima é a da DoorDash, empresa americana de entregas que tem um modelo de negócios parecido com o da brasileira iFood.

A DoorDash registrou o prospecto do IPO em meados do mês passado, contando uma história muito diferente da do Airbnb: as restrições de circulação significaram uma oportunidade única para o delivery de refeições.

Em 2019, o faturamento da companhia foi de US$ 885 milhões. Nos primeiros nove meses deste ano, saltou para US$ 1,9 bilhão. Os pedidos feitos na plataforma em setembro mais que triplicaram em comparação com o mesmo mês do ano passado.

Uma das grandes surpresas contidas no prospecto foi o fato de a DoorDash ter conseguido um pequeno lucro graças ao crescimento explosivo trazido pela pandemia.

E essa é uma outra distinção fundamental em relação ao negócio do Airbnb. Com a chegada das vacinas e a contenção da pandemia, a demanda reprimida por viagens deve voltar a movimentar o setor do turismo.

O mesmo vale para quem gosta de jantar fora. Receber a comida em casa é conveniente – e nos últimos tempos necessário – , mas não se compara com a experiência de sentar-se à mesa de um restaurante.

E existe uma outra questão fundamental no modelo de negócio das empresas de entrega: muitas delas só mantêm a cabeça para fora d’água graças a um fluxo constante de capital de risco.

No ano passado, Ranjan Roy, um ex-investidor que hoje opera um serviço de newsletters, descreveu um episódio que ilustra o problema com perfeição.

Um amigo seu, dono de uma pizzaria, não tinha serviço de entregas, mas constantemente fazia vendas por meio do DoorDash. À sua revelia, a empresa estava oferecendo entrega das pizzas em seu app.

E a história fica ainda melhor. No restaurante, uma pizza custava US$ 24, mas quem pedisse pelo DoorDash pagava somente US$ 16. O subsídio seria uma maneira de aumentar a base de clientes. “O trader de Wall Street que existe em mim pensou… arbitragem!”, escreve Roy.

Durante algumas semanas, ele e o amigo encomendaram pizzas pelo serviço, pagando US$ 16 e recebendo US$ 24 – ou seja, um lucro de US$ 8 por pedido.

“Durante algumas semanas, fizemos alguns desses ‘trades’. Estava genuinamente curioso para ver se a DoorDash perceberia, mas não aconteceu”, escreve Roy. “Tinha visões de criar uma rede de restaurantes usando essa estratégia de forma coordenada, bebendo da teta do Softbank até acabar com o dinheiro.”

Softbank, claro, é o banco japonês que investiu bilhões e bilhões de dólares em unicórnios com modelos de negócio duvidosos. O fiasco mais famoso foi o WeWork, empresa de escritórios compartilhados que viu seu valor de mercado despencar quando revelou-se que o negócio era simplesmente insustentável.

Mas agora o Softbank pode executar uma saída gloriosa da DoorDash. A expectativa é que a empresa seja avaliada em cerca de US$ 30 bilhões. Se o IPO for bem sucedido, o banco japonês, dono de 25% da companhia, pode realizar um belíssimo lucro.

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Sérgio Teixeira Jr.

Jornalista colaborador do InfoMoney, radicado em Nova York