“XP é a fintech mais bem-sucedida do Brasil”, diz BTG após união com Itaú

Em relatório, o BTG Pactual destaca a história de crescimento da XP Investimentos, vista como a "Charles Schwab brasileira"

Lara Rizério

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SÃO PAULO – “Em um mercado estimado em R$ 2,7 trilhões, até onde pode ir a XP Investimentos? Com o Itaú Unibanco, provavelmente a XP será capaz de mirar muito mais alto”. Já para o Itaú (ITUB4), esse é um excelente movimento. 

É desta forma que o BTG Pactual enxerga a aquisição de 49,9% da XP Investimentos pelo maior banco brasileiro por um valor de R$ 6,3 bilhões, anunciada na noite da última quinta-feira. 

Em relatório após o comunicado, os analistas Eduardo Rosman e Thiago Kapulskis destacaram que deverão ver, nos próximos dias, vários estudos sobre os números da XP Investimentos e a perspectivas após o negócio e, provavelmente, eles “farão o mesmo”. 

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“Mas antes de olhar para os números, pensamos que é importante conhecer a XP Investimentos, de onde ela veio e como ela teve sucesso”. E desta forma, os analistas fizeram um resumo da história do que classificaram “como a maior e mais bem-sucedida fintech do Brasil”.  

Com cerca de 400 mil clientes, R$ 80 bilhões em ativos sob custódia e 2,3% de participação de mercado, a XP Investimentos foi fundada em 2001 como um escritório de agentes autônomos. 

E, de acordo com o BTG, o shopping financeiro enfrentou nesse período uma verdadeira “montanha-russa” até se tornar, na visão de muitos, a versão brasileira do gigante americano Charles Schwab, corretora de valores que reinventou o setor de investimentos de todo um país na década de 1980 e mudou para sempre a forma de o americano investir. Atualmente com um valor de mercado de US$ 54 bilhões, a Charles Schwab tem 10 milhões de clientes e US$ 2,9 trilhões em ativos sob custódia, representando cerca de 18% do mercado americano.

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“A história da XP está entrelaçada com a história do carioca Guilherme Benchimol”, destaca o BTG.  Após ser demitido de uma corretora de investimentos no início da sua carreira, ele se mudou do Rio de Janeiro para Porto Alegre (RS) para ir para o mesmo segmento de atuação na outra cidade. Mas, mais uma vez, foi demitido. 

“Cansado de ser demitido, Guilherme (com 24 anos na época) e seu outro parceiro, Marcelo Maisonnave, fundaram a XP em 2001. Com um investimento inicial de R$ 15 mil, eles alugaram uma sala de 25 metros quadrados em Porto Alegre e compraram quatro computadores de uma lan house próxima”, ressalta o BTG. 

Inicialmente concebido como “um escritório de agentes autônomos”, a XP basicamente ligava investidores a corretores e recebia uma comissão para tanto. “Sua experiência neste ramo provou ser uma enorme vantagem competitiva para a XP mais tarde, quando ela se tornou uma corretora. Mas, naquela época, a história ainda era de lutas. Por mais de um ano, a XP enfrentou um momento muito difícil para atrair clientes e ganhar dinheiro. O mercado de ações do Brasil também entrou em colapso em 2002, tornando quase impossível capturar novos clientes e convencê-los a investir no mercado de ações. Foi então que eles tiveram seu primeiro ‘momento eureca’ e tentaram algo diferente”, aponta o BTG. 

Isso porque foi nesse momento de dificuldades que surgiu a oportunidade: dar cursos para ensinar pessoas comuns a investir em ações.  Em seu primeiro curso, eles fizeram R$ 9.000 em um fim de semana. Mas, mais do que o sucesso financeiro do primeiro curso, tornou-se claro para eles que, além de ganhar com a venda de cursos, essa nova área ajudaria na captação de clientes. E foi o que aconteceu. Desta forma, a XP fundou a XP Educação em 2002, que se tornou a maior instituição de educação financeira do Brasil, com mais de 500 mil alunos matriculados até o momento.

Já em 2003, Julio Capua (CFO), um amigo de Benchimol, decidiu não fazer um MBA e preferiu comprar 15% da XP por R$ 200 mil.

Cerca de três anos depois e com faturamento de cerca de R$ 6 milhões, os parceiros perceberam que precisavam avançar. Foi então que, após adquirir a AmericaInvest e a Manchester, a XP tornou-se oficialmente uma corretora. “Apesar do colapso do Lehman Brothers, que quase transformou o sonho em um pesadelo, o Brasil se recuperou rapidamente e 2009 acabou sendo um grande ano para o XP, ficando em primeiro lugar entre as corretoras independentes, enquanto continuava consolidando o setor via fusões e aquisições”, apontam os analistas do BTG. 

Logo depois, ocorreu o segundo “momento eureca” da XP, segundo o BTG. Em 2010, o fundo de investimentos inglês Actis pagou R$ 100 milhões por 20% da empresa e embarcou na ideia de reproduzir alguns produtos da Charles Schwab. A intenção era transformar a XP em um supermercado financeiro ao diversificar suas receitas de comissões. Além disso, a XP também se inspirou no evento anual IMPACT da Schwab em San Francisco – uma espécie de “Oscar” para agentes autônomos – e criou o seu próprio evento. Trata-se da Expert, que concede prêmios aos melhores escritórios afiliados, construindo uma cultura de recompensa e reconhecimento para os melhores profissionais. 

Em 2012, a General Atlantic comprou uma fatia de 31% da XP após pagar R$ 430 milhões, aumentando depois sua posição em 2016. Em 2014, a XP lançou suas operações em Miami. Este também foi o ano em que um dos sócios fundadores, Marcelo Maisonnave, deixou a empresa, levando Julio Capua a se tornar o segundo maior acionista individual da XP. A estrutura de partnership da XP, que conta com mais de 200 sócios e associados, detém uma participação econômica total de 50,5% na empresa. Antes do acordo com o Itaú, anunciado ontem, a General Atlantic detinha 42,9% e o Dynamo possuía 6,6%.
 
“Após falarmos com as partes interessadas, agentes autônomos e funcionários da XP, percebemos que a revisão do modelo de parceria do XP nos últimos anos foi vital para o seu sucesso”, destaca o BTG. Cerca de 50% das ações da parceria trocaram de mãos desde 2014, quando parceiros de longa data perderam espaço para novos parceiros, ajudando a XP a cultivar uma cultura mais forte de meritocracia. “A capacidade de Guilherme Benchimol em implementar esta revisão de forma rápida, não-disruptiva e organizada, mantendo o controle, contribuiu definitivamente para o forte crescimento da XP”.

O ano de 2014 foi também o ano que a XP comprou Clear, que agora é uma das três principais marcas do XP. A XP é a marca principal, focada em consultoria e clientes com mais de R $ 300 mil em ativos. Em 2016, a marca XP teve uma receita de R $ 1,13 bilhão (alta de 80% na base anual), representando cerca de 90% da primeira linha do grupo. A terceira marca é a Rico, adquirida em 2016 por cerca de R $ 400 milhões e com receita de R $ 91 milhões (alta de 59% na base anual). “Com essas três marcas, a XP avalia que pode capturar a atenção de todo o espectro de varejo no Brasil”, aponta o BTG.

Os oceanos azuis da XP

Os analistas do BTG destacam o livro Blue Ocean Strategy, de W. Chan Kim e Renée Mauborgye, para falar sobre a história de sucesso da XP. Os autores argumentam que as empresas podem ter sucesso criando “oceanos azuis” de espaço de mercado incontestado, desbloqueando a nova demanda e tornando a concorrência irrelevante – claramente uma estratégia muito melhor do que lutar contra os concorrentes pelo mesmo mercado.

“Isso é exatamente o que a Schwab tem feito nos EUA há décadas e é isso que o XP está fazendo no Brasil. Com a clara missão de ajudar os indivíduos a investir melhor através de uma equipe de mais de 2 mil agentes autônomos, oferecendo aos clientes a tão necessária garantia de investimento, a plataforma da XP oferece a mais ampla seleção de produtos, a preços mais baixos e com menos burocracia”, ressaltam Rosman e Kapulskis.

Além disso,  aponta o BTG, o talento e a sorte tendem a ir de mãos dadas – e isso não foi diferente com a XP: o ambiente de mercado também ajudou.

A crise de 2015-2016 levou os grandes bancos a aumentarem suas taxas e a reduzir a remuneração dos depósitos, tornando mais fácil para os agentes autônomos atraírem clientes de bancos para a XP. O aumento da garantia do FGC (Fundo Garantidor de Crédito) para R$ 250 mil também foi uma grande ajuda. “A XP é agora uma plataforma crucial para pequenos bancos aumentarem/ ampliarem seus recursos”. Além disso, a nova regulação, permitindo que contas de clientes sejam abertas online também foi muito importante para a XP em sua batalha para reter a participação de mercado dos bancos de varejo tradicionais. 

Com o benefício de ser a primeira a se mover, e agora com uma marca reconhecida, percebida pelo alto nível de NPS (Net Promoter Score) em pesquisas de satisfação de clientes, “a XP está perturbando o modelo bancário tradicional e mudando a forma como os brasileiros investem”.

“Para o investidor médio, a XP definitivamente faz uma oferta indiscutível. E os números corroboram a história”, ressaltam os analistas.

A receita total da XP cresceu de R$ 420 milhões em 2014 para R$ 1,3 bilhão em 2016 – crescimento de 230%, enquanto o lucro líquido foi multiplicado por mais de 6 vezes, passando de R $ 42 milhões para R$ 261 milhões. As entradas líquidas de ativos sob custódia, que em 2014 foram de cerca de R $ 350 milhões por mês, subiram para impressionantes R$ 4 bilhões no primeiro trimestre. O total em ativos sob custódia aumentou de R$ 10 bilhões no início de 2014 para R $ 80 bilhões em março de 2017, um crescimento de 8 vezes.

As lições da Charles Schwab

Como descrito por John Kandor em seu livro “Charles Schwab: Como uma empresa venceu Wall Street e reinventou a indústria de corretagem”, o mantra (quase uma religião) de colocar os clientes em primeiro lugar serviu muito bem para a Schwab.

“Ao não tratar a ignorância dos clientes como um ponto de lucro, Schwab foi perturbador. Gestos simples (embora não inicialmente positivos para as receitas) para o benefício dos clientes fizeram toda a diferença”, afirmam os analistas. A dor de curto prazo acabou trazendo mais e mais clientes e ativos sob custódia para a empresa, aponta o BTG. 
 
“A XP tem aprendido com a experiência de Schwab. As decisões de não cobrar taxas para abertura de contas de abertura (e manutenção) e para transferências bancárias têm levado a muito mais recompensas do que as perdas imediatas”, afirma o BTG. Além disso, a plataforma aberta para fundos mútuos, como a OneSource, mudou a maneira como as pessoas compram e vendem no setor e provavelmente será a principal fonte de crescimento de receita para o XP nos próximos anos.

“Wall Street riu quando Schwab começou a fazer negócios. As histórias de ambas as empresas ajudaram a forjar seu caráter, ao mesmo tempo criando uma forte cultura interna”, afirmam Rosman e Kapulskis. Agora, com o acordo com o Itaú, a XP pode se expandir ainda mais. 

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.