Exclusivo: Rali de março foi exagerado e mercado vai corrigir, diz gestor da Mirae Asset

André Pimentel, da Mirae, explica por que o mercado em geral e, principalmente, a parte longa da curva de juros, estão muito esticados

Equipe InfoMoney

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SÃO PAULO – Quando um gestor de investimentos se depara com um cenário binário em que um evento pode mudar toda a situação do mercado, ele tem que ter bastante flexibilidade e sangue frio para ajustar a estratégia. É essa a luta constante do gestor da Mirae Asset Wealth Management, André Pimentel. Em entrevista ao InfoMoney, Pimentel explicou quais são as suas expectativas para a economia diante desta volátil crise política, que torna todos os investimentos dependentes da decisão de algumas dezenas de senadores, policiais federais e juízes. 

Sem saber o dia de amanhã, Pimentel faz uma boa rentabilidade com o carro-chefe da Mirae, que é seu fundo macro. Apesar de toda a indefinição, a gestora de recursos conseguiu entregar a seus clientes uma rentabilidade de 416% do CDI (Certificado de Depósito Interbancário, a taxa que referencia os principais títulos de renda fixa privada) em março, mês do famoso rali do impeachment. Apesar do clima de euforia, o gestor avisa que é preciso ter cuidado. Segundo ele, há distorções profundas que foram criadas com estas altas recentes, principalmente no mercado de juros futuros e renda fixa. “Tem NTN-B a 5,8% de taxa pré sendo que o juro real em 2011 era de 6%. Nós provavelmente não vamos voltar ao que éramos nesta época pelos próximos 5 ou 6 anos sendo otimista”, explica. 

Confira a íntegra da entrevista com André Pimentel:

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IM: Como a Mirae está alocando os seus investimentos nesse ambiente de tanta volatilidade política e econômica?
ANDRÉ PIMENTEL: Nosso fundo desde o começo foca bastante na parte de renda fixa. Normalmente, 80% do nosso risco é alocado neste tipo de investimento. Claro que sempre buscamos outras oportunidades em outros mercados como o de câmbio. Temos um long & short que operamos desde maio do ano passado. A gente tenta não operar renda fixa apenas do jeito tradicional. Se observar a nossa atribuição de performance. A gente opera bastante DI direcional, NTN-B direcional, mas a gente também opera trava de duas pontas de NTN-B, trava de 3 ou 4 pontos de DI, então diversificamos bem ainda que estejamos em um mercado só. Temos conseguindo não expor o fundo a apenas uma coisa, estando em cenários binários.

O custo de um fundo como esse Macro que nós temos acaba sendo muito alto. Isso faz com que o fundo ande muito abaixo do CDI mantendo-se tudo o mais constante. A partir do momento que você fica dois meses ganhando 84% do CDI, para recuperar o que você perdeu no passado é bastante complicado. O gestor acaba sendo obrigado a montar operações mais agressivas e isso aumenta a volatilidade do fundo.

No nosso caso, tentamos fazer das operações de arbitragem o nosso ganha-pão. Mês a mês ela te entrega um resultado bem consistente e faz com que a gente não parta do 84% do CDI e não fique tão afobado nas operações. A gente consegue muitas vezes entrar na operação quando ela já está muito distorcida e claramente muito fora para praticamente todo o mercado. Em setembro do ano passado acabamos tendo uma volatilidade acima do que gostaríamos e dali para frente surgiram muitas distorções no mercado. Estava acontecendo um movimento excepcional e o mercado estava apavorado, precificando coisas que, a nosso ver, eram absurdas.

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IM: Você falou que o fundo tem mais custo, especialmente de imposto. Que tipo de investimentos estão competindo com os fundos? Você acha que o governo tributa de maneira errada?
AP: Eu não tenho a ilusão de que a não tributação de LCI e LCA vá mudar no médio prazo. Não estou nem falando de curto prazo, estou falando de médio. Pela questão do funding. Se você acabar com esse benefício da LCI e da LCA, o que você vai fazer com a indústria de habitação? Em um momento de retirada recorde da Poupança eu não acredito que o governo vá incentivar a saída de LCI. Então nem adianta discutir se está errado ou se não está. Penaliza a indústria e é injusto, mas não é algo que vá mudar. 

IM: E em relação à economia? Como vocês estão posicionando neste cenário em que tudo depende de um evento no Congresso Nacional?
AP: Até agora a gente estava bem mais otimista do que a média do mercado. Todo o movimento que a gente viu desde o início do ano foi de alta do famoso “pacote Brasil”: ficar comprado em Bolsa [especialmente Petrobras, Vale e bancos] e vendido em juros. Foi isso que deu certo esse ano. Agora, olhando o mercado, acho que ele está otimista demais. Estamos nos reposicionando, mas continuamos na ponta positiva. Em fevereiro, a gente achava que o mercado estava muito pessimista. Já em março, começou a ficar otimista demais. Nós até pegamos um pouco de movimento de queda de juros e alta da Bolsa em abril, mas foi mais surfando na onda do mercado do que realmente acreditando em toda a mudança que foi precificada.

Tem muita coisa para ser feita ainda. Olhando a curva de juros, muita gente fala para comprar NTN-B [o atual Tesouro IPCA] longa. Se a gente olhar para trás, para o Brasil de 2011, o País estava muito bem. Muita gente reclamava, falava que um ou outro partido destruiu o Brasil, mas estávamos bem melhor do que dez anos antes, até nas contas públicas. E o juro real dessa época era 6%. Nós provavelmente não vamos voltar ao que éramos em 2011 pelos próximos 5 ou 6 anos sendo otimista. Então não vejo razão para acharmos que o juro real está barato e vai para 4%. Se isso acontecer, a gente vai começar a vender taxa, porque seria um claro exagero do mercado. 

IM: Vocês imaginam que o mercado vai passar por um movimento de correção em breve?
AP: Não sei se em breve. Acho que esse movimento pode durar um pouco mais. Sempre temos que tomar cuidado para não achar que estamos certos e depois sermos atropelados pelo mercado. Todo movimento do ano passado foi isso. Todo mundo que vendeu dólar a R$ 3,80 estava certo, mas ele foi depois para R$ 4,20. Se você não fez um “stop loss” na operação, ficou complicado. E agora está a R$ 3,50 e com cara de que vai cair mais. O Banco Central vendeu bilhões de reais em swap reverso. Então não adianta estar certo, você tem que acertar o “timing”. O mercado pode continuar subindo pelo impeachment ou outro motivo qualquer, mas acho arriscado você começar a ver juro real de 4%. Essas NTN-Bs de 5,8% de taxa pré acima da inflação, a gente já acha que estão exageradas.

IM: Quais são os principais desafios para um gestor montar as suas posições neste momento?
AP: Acho que são os cenários binários. Agora parece que o cenário está mais encaminhado para impeachment, mas se observasse há quatro semanas era quase como jogar uma moeda para o alto. Por incrível que pareça, a gente ganhou 4,83% em março operando com cautela. Acabou que foi um ganho muito disseminado. A gente montou posição comprado em Bolsa, em opções, arbitragem de NTN-B, e em uma semana zeramos a nossa operação. Tem alguns momentos em que vai dar certo. A gente operou muito leve para obter esse ganho. Fomos com muita cautela.

IM: E vocês tiveram uma comunicação boa com os clientes para explicar todas essas vezes em que entraram em operações e depois zeraram?
AP: A gente tem a nossa carta mensal, temos teleconferência com os clientes e achamos muito difícil saber como o fundo vai rodar no longo prazo porque tem muita operação de arbitragem. Aí o cliente fica perdido. Se o cliente está comprado em bolsa, ele sabe quanto vai ganhar e pode acompanhar de casa. No nosso fundo é um pouco mais complicado. A gente tem diversas operações. Tentamos diversificar ao máximo e o cliente fica confuso diante do movimento do mercado. A ideia é explicar bem como é a nossa operação para não se preocupar com volatilidade diária e lembrar dos problemas do sistema de marcação da Bovespa.

IM: Vocês possuem projeções para indicadores como Selic, inflação etc.?
AP: A gente acredita que lá para o final de ano terá possibilidade de cortar juros, porque trabalhamos com um cenário de maior probabilidade de ter um impeachment. Então, o Banco Central, antes de qualquer coisa, vai querer ancorar expectativas, tentando fazer um ajuste monetário e tentar, desta forma, trazer a expectativa de volta para a meta, que é algo que não ocorre há muito tempo. Conseguindo isso, eles vão partir para um ciclo de queda. É muito difícil falar disso porque não se sabe quem vai ser o BC, nem qual o nível de ajuste que dá para ser feito. Estamos imaginando que vai ter impeachment e que o ministro da Fazenda será alguém com um viés de política mais restritiva, que consiga fazer algum superávit primário. Por isso esperamos que a inflação recue. Vai depender de uma série de coisas, mas no fim de 2016 teremos a possibilidade de queda de juros.

IM: Vocês veem mais possibilidade de corte de juros em um governo Temer ou com o Tombini no BC?
AP: Acho que com o Tombini a chance é de vir ainda mais cedo. A gente vê o dólar muito mais comportado do que a expectativa do mercado pela pesquisa Focus, então um movimento de sazonalidade favorável potencializado pelo choque de alimentos no início do ano pode ser ainda mais forte dado o recuo no dólar. Eles dificilmente vão deixar de fazer alguma coisa vendo a economia despencar como está despencando. Algumas casas projetam uma queda do PIB bem agressiva. Podemos ver algum recuo importante em Serviços, que é algo que todo mundo projetava que aconteceria desde o ano passado e acabou não acontecendo até agora. A gente acredita que o hiato maior do produto trará um alívio maior e, dependendo do tamanho do corte de juros, pode ser bem relevante nos próximos meses.

Só pelo impacto no mercado de trabalho já podemos imaginar o impacto na economia. Todos os núcleos da inflação já recuam de maneira muito forte. Se tivermos mais dois dados de inflação como esse último, que foi espetacular, estaremos num caminho certo.

IM: Sei que já é difícil acompanhar o cenário doméstico quando a volatilidade está tão elevada, mas o que vocês olham no cenário externo? Acreditam em impacto da China ou de um aumento de juros do Federal Reserve?
AP: O cenário chinês já vemos como em fase de acomodação. Dificilmente teremos um hard landing maior do que esse que já está aí.

Em relação aos Estados Unidos, a atividade está dando sinais de um crescimento muito menor do que o Fed gostaria, mas o mercado de trabalho está muito forte. Em alguns momentos, os diretores do Fed tentam ser um pouco mais “hawkish” (agressivos, no sentido de elevar taxas), lembrando que a taxa de juros deles já deveria estar um pouco acima da neutra para estimular a economia. Em contrapartida, você vê todos os outros bancos centrais migrando para o outro lado.

O que a gente está vendo agora é o Fed bastante preocupado com a possibilidade de subir os juros mais do que o necessário. A nossa previsão até o fim do ano é que ele suba os juros mais duas vezes. Mas isso dado que a gente projeta que o mercado de trabalho vai continuar gerando emprego e que a taxa de desemprego chegará em breve a 4,8%. Os sinais de atividade não são dos melhores e a presidente do Fed, Janet Yellen está mostrando preocupação com a valorização do dólar. Isso naturalmente impacta tanto as exportações dos Estados Unidos quanto os produtos que estão chegando lá.

Com todo esse cenário, o que a gente tem é o Fed subindo os juros de forma bastante gradual, permitindo que os países emergentes ajustem as suas contas antes de uma elevação relevante das taxas.

IM: Vocês projetam mais dois aumentos sem muito impacto das eleições presidenciais, então?
AP: Sim, não vejo isso afetando tão diretamente como acontece aqui.

IM: Voltando um pouco para a Mirae, queria que vocês dissessem quais são as suas estratégias e qual é a história da asset.
AP: A Mirae chegou no Brasil com o foco em equity que tinha no mundo todo. Como o mercado local é muito mais focado em renda fixa e multimercados, ela tentou se adaptar. Mas acabou que esse movimento não foi feito só aqui. Até 2010, a Mirae tinha 80% em equity e hoje em dia, ela como um todo é muito mais diversificada. Temos todos os tipos de investimento na empresa. Estamos lançando um fundo Low Vol [de baixa volatilidade], que é para outros tipos de público. E a gente pretende lançar um fundo para investidor local qualificado, para que ele possa fazer investimentos no exterior. E como a nossa casa é a Ásia, nada mais justo do que a gente ter um produto local que opera Ásia. Também queremos lançar mais um fundo até o fim do ano para o investidor que aceita uma volatilidade um pouco maior, com um objetivo de rentabilidade um pouco maior também.

IM: Quanto vocês têm sob gestão atualmente?
AP: No mundo é em torno de US$ 75 bilhões e no Brasil são R$ 180 milhões. Esse capital é distribuído em fundos de ações, hedge funds, investimentos em infraestrutura e também em real state (imóveis). Temos participação em alguns empreendimentos imobiliários, mas eles não entram nestes R$ 180 milhões. Localmente, este capital está distribuído em fundos e nosso principal parceiro de distribuição é a XP Investimentos.

Lá fora, nós somos donos do prédio que sedia as reuniões do Fomc (Federal Open Market Committee), do Citigroup Center, em São Francisco e do hotel Four Seasons, na Austrália. Isso além de termos comprado a marca Titleist, de equipamento de golfe.

IM: Vocês têm metas de participação de novos investidores?
AP: O capacity que a gente trabalha é de R$ 600 milhões. A estratégia nisso é bem pulverizada. A gente tem tentado trabalhar em novas estratégias, até pelo pessoal de Long & Short que a gente contratou para podermos diversificar um pouco mais as estratégias e subir este capacity. A ideia é que o fundo não perca este perfil de operações de arbitragem, para que a gente fique confortável para mudar nossas operações quando tivermos convicção.

Nos fundos em geral, as pessoas montam uma posição e esperam que ela dê dinheiro dentro da banda entre o stop e o objetivo. A gente tenta acertar o “timing”. Para nós montarmos uma operação, não basta que acreditemos nela. Temos que ter certeza de que não vamos passar muito calor naquela operação. Então, às vezes é melhor você perder a operação e deixar de ganhar do que você ir lá e adicionar uma volatilidade desnecessária no fundo. Por isso o viés de você ter essa arbitragem. Você entra em um direcional maior só quando tem alguma convicção.

IM: A Mirae é muito forte em pessoas físicas na Coreia do Sul. Vocês têm algum plano para deixar a marca mais conhecida do grande público no Brasil?
AP: A gente fez bastante propaganda no passado. Hoje não é nosso foco. Temos o nosso plano de marketing e o mínimo de CPFs que a gente trabalha é de 10 mil.

O que a gente percebe na nossa grade é que nossos fundos, principalmente o macro, tem muita atratividade à pessoa física principalmente pela liquidez. Comparado com outros fundos, a maioria é “d+30” e o nosso é “d+2”.

Via Mirae e XP a gente dá muito acesso a pessoa física. Acessar investidor institucional é mais difícil visto que a gente não é tão grande aqui no Brasil.

IM: Qual é a principal característica dos seus fundos?
AP: Nós não temos medo de operar na contramão do mercado. Muitas vezes temos uma correlação negativa com os outros fundos, então somos uma alternativa interessante para usar com outro que tem resultado positivo também. Se olhar historicamente, 2014 foi um ano em que fomos muito bem. Entregamos 150% do CDI e a indústria foi muito mal. Ano passado a gente não foi tão bem. Fizemos 88% do CDI e a indústria foi muito bem. E este ano a gente foi muito bem e a indústria não está tão bem. Então tem uma correlação negativa. Se você comprar o nosso fundo, você tem uma espécie de hedge, e ele oferece 135% de CDI desde que foi lançado. Este ano entregamos, até agora, 221% do CDI, sendo 416% só em março.

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