Governo está dando um “tiro no pé” ao abusar do seu poder de controlador

Leonardo Viega, associado do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, afirma que os abusos de poder estão destruindo o valor das estatais

Paula Barra

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SÃO PAULO – A função do papel dos conselhos de administração voltou à tona no mês passado, com as revelações sobre a compra da refinaria de Pasadena pela Petrobras (PETR3; PETR4), em 2006, que foi aprovada pelo conselheiros da estatal por um preço muito acima do que valia. A questão abriu caminho para discussão de até que ponto um conselho independente pode garantir a melhor prática de governança corporativa e gerar mais valor aos acionistas. No caso da Petrobras, por exemplo, somente um conselheiro é independente.

Segundo Leonardo Viegas, associado do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa), em entrevista ao InfoMoney, o governo está dando um “tiro no pé” quando abusa do seu poder de controlador para decidir questões cruciais ao futuro das estatais. “Quando o mercado percebe isso, e cada vez mais as informações estão sendo disseminadas ao mercado, o investidor se assusta e retrai”, disse. 

De acordo com levantamento da consultoria Economatica, desde o início do governo da presidente Dilma Rousseff, o Banco do Brasil (BBAS3), Eletrobras (ELET3; ELET6) e a Petrobras (PETR3; PETR4) perderam juntas R$ 262,1 bilhões em valor de mercado, até a semana passada. Isso significa uma queda de 52% do valor somado das três companhias. A reação à percepção do mercado quanto a isso foi vista na véspera, quando os papéis dessas ações dispararam na Bolsa por conta de uma pesquisa CNI/Ibope que apontava que a popularidade da presidente Dilma tinha caído entre os eleitores. 

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Segundo Viega, essa é a melhor forma do mercado dizer “não” a essa prática. “O acionista não aceita a forma como está sendo levada a empresa e vai cantar em outra frequesia. E isso é uma pena, porque estamos vendo uma forte retirada de dinheiro de investidores brasileiros da Bolsa”, disse.

Tripé essencial
Viegas defende três pontos essenciais para que ocorram as melhores práticas de governança no mercado: regulação, transparência e boa educação (formação de bons administradores e outros agentes, além do próprio cidadão). A partir desses pontos, as empresas vão conseguir gerar mais valor aos acionistas. Entretanto, o que se vê ultimamente são atuações lamentáveis, tanto do setor privado quanto público, disse.

Um conselho bem formado, com participação de membros independentes, ajuda e muito, comentou, citando que a BM&FBovespa exige que as empresas listadas no Novo Mercado tenham ao menos 20% do conselheiros independentes. Entretanto, quando olha-se para estatais ainda vê-se uma certa resistência à entrada de indepentes.

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Faria bem a essas empresas aceitarem um conselho mais independente e faria bem ao Estado também, pois o valor dessas companhias tenderia a subir. “Até para captar recursos no mercado fica mais caro para elas, porque elas maltratam tanto os acionistas que eles vão buscar outros ativos”, complementou.

Petrobras é um exemplo
Na Petrobras (PETR3; PETR4), por exemplo, o conselho possui apenas um membro independente. Nos últimos dias, têm-se visto uma forte atuação dele em questões cruciais à empresa. Mauro da Cunha busca maior transparência dentro da empresa. Nos últimos dias, ele entrou com duas queixas na CVM (Comissão de Valores Mobiliárias): uma para que tornasse público seu voto contrário ao resultado da empresa e outra para que fosse divulgada sua manifestação contrária à política de preços de derivados da empresa. 

Segundo Viegas, faria bem a essas empresas e ao Estado abrir espaço para mais independência do seu conselho, lembrando que uma de suas funções é fiscalizar a atuação da diretoria para ver como a área executiva está se saindo. “Os conselheiros devem verificar, questionar e cobrar resultados. Eles precisam trabalhar para gerar valor à empresa”, disse. 

Nesse sentido, Viegas aponta que os minoritários estão cada vez mais alertas a essas questões. Nos últimos anos, o mercado evoluiu muito na regulamentação, embora na prática algumas questões ainda emperrem. “O que precisamos agora é policiar o mercado para que se atente ainda mais a essas questões, exigindo práticas transparentes. Precisamos que as informações sejam divulgadas na hora para manter um mercado bem informado e precisamos de conselheiros e diretores que sejam íntegros, éticos e atuem em benefício do mercado”, disse.

A Petrobras também está no centro do furacão quando o assunto é conselho de administração por conta das denúncias sobre a compra da refinaria de Pasadena pela Petrobras, em 2006, por um valor muito superior ao que valia – a petrolífera acabou pagando à Astra Oil US$ 1,18 bilhão pela refinaria, após a mesma Astra ter adquirido Pasadena por US$ 42 milhões anos atrás. Na época presidente do conselho da Petrobras, a atual presidente da República, Dilma Rousseff, afirmou na semana passada por meio de nota que se baseou em um parecer “falho” quando votou favoravelmente à compra da primeira parte da refinaria.

Ainda não está claro se os conselheiros da Petrobras na época, incluindo Dilma, poderão ser responsabilizados no caso de Pasadena, uma vez que o conselheiro não é responsável pela decisão, a não ser que tenha sido negligente ou não tenha respeitado o que está previsto em lei, que inclui questionar a diretoria da empresa. A estatal já vem sendo investigada pelo TCU (Tribunal de Contas da União), Polícia Federal e Ministério Público Federal, além de ter promovido apuração interna sobre denúncias de pagamento de propina a seus funcionários. Há também uma movimentação para criação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da estatal.