O que está ruim pode ficar ainda pior: março promete mais dificuldade na Bolsa

Entre os fatores de risco, gestores apontam desde possível corte de rating e desdobramentos da crise Ucrânia até um racionamento de energia no Brasil

Paula Barra

(Shutterstock)

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SÃO PAULO – O início de ano não tem se mostrado nada fácil para o mercado brasileiro. Com cinco meses consecutivos de quedas, o Ibovespa marca seu pior começo de ano desde 1995, com recuo acumulado de 12,20% até 12 de março de 2014. Há 19 anos, o índice apresentava perdas de 38% no mesmo período. O pessimismo, no entanto, ainda perdura no mercado e parece que esse tempo fechado na Bolsa não deve aliviar tão cedo.

Após conversas com gestores e especialistas, a conclusão é de que o momento é de cautela para a possibilidade de ainda mais turbulência no mercado – ou seja, o que está ruim promete ficar ainda pior -, principalmente porque março inicia com a bagagem carregada de indicadores negativos que pressionaram o Ibovespa nos dois primeiros meses. 

Depois de queda forte no mês de janeiro (-7,51%), a Bovespa passou todo o mês de fevereiro sem mostrar sinais de recuperação, com uma clara percepção de que os investidores não estão convencidos de que o cenário macroeconômico no Brasil possa melhorar no curto prazo. 

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Segundo o gestor Maurício Pedrosa, da Queluz Investimentos, o ambiente ruim acaba tirando a atratividade da bolsa mesmo que o preço das ações esteja atualmente em patamares convidativos para investidores interessados em barganhas. “A política econômica do Brasil está passando por um teste. A economia parou de ajudar, somado a uma possível desaceleração na China, preço da energia em alta e dólar em disparada. Colocamos tudo isso no radar e temos um mar complicado pela frente”, disse Pedrosa.

Com o conjunto inteiro repleto de incertezas, chegamos a 7 fatores tratados como cruciais pelos entrevistados. São eles:

Por que a Bolsa pode piorar em março?
1) Possível corte de rating
2) Risco de racionamento
3) Dólar em alta
4) Continuidade do ciclo de altas da Selic
5) Desaceleração da economia chinesa
6) Desdobramentos da crise Ucrânia 
7) Correção nas bolsas dos EUA

1) Possível corte de rating

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O Brasil vai receber nesta semana a agência de classificação de risco Standard & Poor’s, que vai avaliar a situação da economia brasileira. No final de fevereiro, o governo anunciou a meta fiscal para 2014, de 1,9% do PIB (Produto Interno Bruto), agora é preciso ver se esse patamar sustentará a situação fiscal do País. Para a equipe da Empiricus Research, o mínimo sensato para a meta seria 2%, o que é preocupante pois as agências de rating têm colocado grande peso sobre o indicador, afirmam.

Segundo um gestor que pediu para não ser identificado, pelas conversas que já foram publicadas com a S&P, o risco de corte no rating não é tão grande, mas como a agência normalmente toma a frente nessas decisões, uma revisão para baixo não deve ser descartada. Durante evento realizado na última quarta-feira (12), o ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, disse o corte de rating não é só iminente como o próprio mercado já precificou o impacto no mercado brasileiro.

2) Risco de racionamento

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Aliado ao possível corte de rating, o risco de um racionamento cresce a cada dia no Brasil. Em abril, começa no Sudeste o período seco, em que o volume de precipitação diminui. Se as águas de março não chegarem e o nível dos reservatórios continuar caindo, o risco de ocorrer no segundo semestre deste ano é alto, alertam especialistas. A chuva em janeiro e fevereiro ficou em 54% e 39% da média histórica, respectivamente. O índice no mês passado foi o segundo pior para fevereiro em 84 anos, e o janeiro foi o terceiro pior.

Em relatório recente, analistas do Brasil Plural já derão como certo que haverá um racionamento. A probabilidade é de 100%, disseram, apontando como preocupante a queda no reservatório da hidrelétrica de Itaipu, que está 4 ou 5 metros abaixo do normal, enquanto o Paraguai está adquirindo mais energia da usina. 

3) Dólar em alta

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Junta-se a esses fatores a expectativa de que o dólar siga em tendência de alta frente ao real em 2014, depois de subir 15,35% no ano passado – a maior desde 2008. O sentimento de aversão ao risco em meio aos percalços da economia brasileira, somado aos sinais de recuperação emitidos pelas maiores economias do mundo – que há pouco tempo atrás estavam afundadas em crises -, colabora para que investidores estrangeiros retirem seu dinheiro daqui e levem para destinos mais “seguros”. Com a fuga de dólar, a moeda naturalmente ganha valor em relação ao real.

Para o Itaú Unibanco, a projeção é que o câmbio termine 2014 em R$ 2,55, frente ao patamar atual próximo de R$ 2,35. Contudo, há quem aposte em uma disparada ainda mais forte da moeda, principalmente se os eventos peculiares a essa data trouxerem uma pitada a mais de risco no mercado, como é o caso do apagão e das próprias eleições presidenciais – especialistas acreditam que a disputa pelo novo presidente em 2014 será mais acirrada que nas últimas duas ocasiões.

4) Continuidade do ciclo de altas da Selic

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Além disso, a Selic ainda deverá seguir em trajetória de alta, tendo em vista a preocupação com a inflação resilientemente próxima do teto da meta do governo, de 6,5%. Para a LCA Consultores, mais duas elevações ocorrerão na escala de 0,25 ponto percentual, levando os juros para 11,25% ao ano. A próxima reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) ocorre nos dois primeiros dias de abril.

Segundo eles, a ata da última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) publicada recentemente reforçou a percepção de que o Banco Central ainda não deu por encerrado o ciclo de aperto das condições monetárias, que já se aproxima de um ano. 

5) Desaceleração na China

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Entra na conta pessimista também as preocupações do mercado com uma desaceleração da economia chinesa. Os primeiros dados sobre a atividade industrial no país apontam para um nível menor de produção das empresas, o que indica que a economia chinesa vai sofrer mais uma freada este ano. A perda de ímpeto limitou o crescimento anual da China em 7,7%, mínima em seis meses, no trimestre de outubro a dezembro de 2013, uma desaceleração que, segundo alguns analistas, pode se aprofundar neste ano conforme o país suporta o fardo de curto prazo de reorganizar seu modelo de crescimento para o benefício no longo prazo. 

Soma-se a essa percepção negativa sobre a China a forte queda do preço do minério de ferro. Na última terça-feira, os preços do insumo caíram impressionantes 8,3%, negociados a US$ 104,7 a tonelada, atingindo a maior baixa em 18 meses. A derrapada refletiu os indicadores econômicos do país, que divulgou queda de 18,1% nas exportações em fevereiro sobre o mesmo período do ano anterior. 

Tudo isso tem impacto direto na Vale (VALE3, VALE5), mineradora brasileira que tem a China como principal destino de suas exportações. Como as ações da empresa dividem com a Petrobras a maior participação dentro da composição do Ibovespa, um movimento negativo da companhia na Bovespa acaba tendo efeito direto no desempenho do principal índice de ações brasileiro.

6) Desdobramentos da crise na Ucrânia

Juntamente com isso, pesa ainda os desdobramentos da crise na Ucrânia, ainda deve trazer forte volatilidade ao mercado em março. “Realmente, acho que março será bastante agitado. A Ucrânia vai dar bastante pano para manga. As notícias por lá estão correndo muito rápido e parece que a União Europeia tem todo o interesse em se mexer para não ter uma nova volta da União Soviética. Vamos ter muito volatilidade na Bolsa ainda, em um cenário de conjuntura econômica negativa. A sensação é que o Brasil seguirá em dificuldade até o restante do ano”, disse um gestor que pediu anonimato. 

No início desta semana, o governo interino da Ucrânia anunciou que pode assinar entre 17 e 21 de março o acordo político de associação com a União Europeia. A decisão, uma resposta ao risco iminente de divisão de território, foi comunicada pelo Ministério de Relações Exteriores, em meio a crise causada pela invasão da Crimeia por tropas russas e pelo pedido de secessão feito pelo Parlamento da república autônoma, que deve ser avaliado em referendo no próximo domingo, dia 16. 

7) Correção das bolsas dos EUA

Por fim, ainda há o risco de que as bolsas dos EUA sofram uma forte correção depois de terem completado no início dessa semana o 5° ano de “bull market” (expressão usada para definir uma valorização de pelo menos 20% em relação ao seu menor nível atingido durante o período anterior marcado por fortes quedas). Desde 2009, o S&P 500, um dos principais índices acionários norte-americanos, já saltaram mais de 170%. Especialistas vêm se divididindo entre a continuidade do movimento e a projeções alarmantes. 

Enquanto a Black Rock, maior gestora de fundos do mundo, destacou recentemente seu otimismo em relação a Wall Street, cresce uma corrente de peso com visão contrária. Um gráfico chamada “Paralelo Assustador” tem causado burburinho. O estudo, que faz uma relação com o comportamento do mercado atual e o registrado no crash de 1929, mostra que uma correção de pelo menos 10% nas bolsas dos EUA estaria próxima.

Além disso, outro reforço de peso ao time “bearish” veio depois que o gestor norte-americano George Soros, que administra US$ 28,6 bilhões, revelou que aumentou em US$ 1,3 bilhão no quarto trimestre do ano passado sua aposta na queda do S&P 500.