Ação da BRF salta mais de 11% após resultado surpreendente – mas dúvidas sobre próximos dias rondam o mercado

Companhia teve um desempenho positivo em praticamente todos os segmentos, mas cenário para o segundo trimestre parece nebuloso

Lara Rizério

Planta da BRF (Divulgação)

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SÃO PAULO – Com um resultado do primeiro trimestre de 2020 bastante positivo em praticamente todas as linhas devido aos maiores volumes e preços no mercado interno e em boa parte do mercado internacional, as ações da BRF (BRFS3), dona das marcas Sadia e Perdigão, dispararam 11,26% na sessão desta segunda-feira (11), a R$ 20,85, sendo o melhor desempenho do Ibovespa em um dia de queda para o benchmark do índice.

Apesar do prejuízo na última linha, os números vieram acima das expectativas em termos de lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (Ebitda), com margem Ebitda, ou a relação entre o Ebitda e a receita líquida, de 14%.

O prejuízo líquido no trimestre foi de R$ 38 milhões, impactado principalmente pela variação cambial na dívida e pela linha de “outros resultados operacionais”, com resultado negativo de R$ 239 milhões por conta da provisão com acordos coletivos nos Estados Unidos.

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O principal destaque foi o resultado operacional medido pelo Ebitda ajustado, que alcançou R$ 1,2 bilhão, alta de 67% na comparação com o mesmo período de 2019. Outro ponto positivo ficou para a receita líquida, que fechou o trimestre com R$ 8,9 bilhões, 21% acima do registrado no primeiro trimestre de 2019.

O que guiou o forte crescimento de receita foi o aumento dos volumes vendidos, que cresceu 8,1% no período na comparação anual e a alta de 12,5% dos preços médios, possibilitando mitigar o efeito do aumento do Custo de Produtos Vendidos (CPV) de 6,1%.

O destaque do volume de vendas ficou para o segmento internacional, excluindo Halal, com a contribuição das novas plantas habilitadas para a China, devido às implicações da peste suína, que dizimou boa parte do seu rebanho. Desta forma, a BRF tem se beneficiado de maiores margens e volumes exportados para a região.

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A peste suína africana segue afetando a oferta de proteínas em vários países asiáticos, particularmente na China, resultando em maior demanda por produtos importados. Somente na China, os volumes aumentaram 89,5%. De acordo com a BRF, Japão e Singapura também passaram por melhoras na dinâmica comercial, tendo em vista o receio dos importadores com a possível falta de frango no mercado, dado o aumento da demanda chinesa.

“Já no Brasil, no primeiro trimestre de 2019, a companhia fez uma renegociação de descontos com alguns clientes, que acarretou queda de volume, resultando em um efeito de base fraca no comparativo anual. Mesmo assim, avaliamos o aumento de 10,7% ao ano, com destaque para processados, com crescimento de 14,9%, no volume vendido como positivo, mostrando um evidente avanço na gestão da BRF”, destaca a Eleven Financial, enquanto a XP Investimentos também aponta as campanhas de marketing e uma demanda mais forte como razões para o forte desempenho no segmento de industrializados.

Mesmo sendo ofuscado pelo resultado de outros segmentos, o segmento Halal teve um desempenho acima do esperado pela equipe de análise da XP. O Ebitda ajustado do Halal de R$ 237 milhões ficou acima da expectativa de Betina Roxo, analista da XP, de R$ 201 milhões, com uma margem Ebitda de 10%. Anualmente, os volumes cresceram 3% e os preços tiveram alta de 12%.

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Os preços começaram a reagir à restrição de oferta estabelecida desde janeiro de 2019, quando as autoridades da Arábia Saudita decidiram reduzir o número de plantas brasileiras habilitadas para exportar para o país, incluindo algumas da BRF. Além disso, o mercado iraquiano ainda está parcialmente restrito à importação de produtos da Turquia, afetando negativamente os preços tanto no mercado turco quanto nos países vizinhos. Por outro lado, aponta a XP, entre os pontos positivos, na Turquia, a participação de mercado da BRF cresceu 4 pontos percentuais na comparação anual, a 20,6%, como resultado da estratégia de fortalecimento da marca Banvit.

“Em relação ao mercado Halal, do Oriente Médio, como um todo, a BRF encerrou o trimestre com uma participação de mercado de 35,4%, mantendo uma ampla posição de liderança de mercado, segundo dados da Nielsen”, destaca a XP.

A relação entre a dívida líquida e o Ebitda caiu de 6,1 vezes no primeiro trimestre para 2,7 vezes no primeiro trimestre de 2020, mas cresceu um pouco na comparação trimestral (2,5 vezes no quarto trimestre de 2019 ) devido a efeitos cambiais não-caixa (aumento de 0,36 vez atribuível exclusivamente a esse efeito, de acordo com a empresa), parcialmente compensados pela sólida geração de caixa.

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Enquanto isso, destaca a Levante Ideias de Investimento, o ponto negativo do resultado foi o incremento da sua despesa financeira devido à variação cambial no trimestre, que alcançou R$ 606 milhões, valor 35% superior às despesas do primeiro trimestre de 2019.

Crise e oportunidade

Com esse desempenho positivo e a forte alta das ações, os investidores se questionam principalmente sobre o futuro da companhia, ainda mais em meio ao avanço da Covid-19 em alguns locais, enquanto a doença parece ter se normalizado em outros locais. E a avaliação que se faz é que ela pode gerar tanto riscos como oportunidades.

Durante teleconferência para comentar os resultados nesta segunda-feira, Lorival Luz, CEO da empresa, afirmou ver um cenário desafiador de oferta. Ele apontou que o Brasil está bem posicionado para combater o vírus e evitar grandes interrupções nas plantas como as que vêm ocorrendo nos EUA.

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Contudo, lembrou que a unidade de frango da BRF em Lajeado (RS) fechada após decisão de um juiz em 8 de maio. A unidade é apontada como foco de disseminação da Covid-19 no município.

Luz destacou que a doença também pode interromper parte das operações da BRF no Brasil, enquanto que a recessão e novos padrões de consumo estão afetando a demanda. O impacto da crise, contudo, deverá ser mais evidente nos resultados do segundo trimestre, acrescentou.

A BRF afirmou que antecipou os problemas com a contratação de trabalhadores adicionais, de forma a manter as operações nas fábricas o mais perto do normal possível. Em abril, a empresa disse que contrataria 2 mil funcionários para ajudar a manter as operações da empresa em meio à pandemia.

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O Credit Suisse segue positivo com as operações da BRF no mercado internacional, que deve apresentar forte desempenho principalmente após a forte depreciação do real.

Já no mercado doméstico, a avaliação é de que o desempenho pode deteriorar daqui para frente, tendo em vista o declínio recente nos preços de aves e suínos (queda de 25% e 39%, respectivamente, desde o pico em janeiro) e a recuperação dos preços dos grãos.

O Bradesco BBI, por sua vez, aponta estar preocupado com uma redução do abate e também reforça que a contratação de mais funcionários para compensar as ausências na linha de produção poderia resultar em custos mais altos no segundo trimestre.

Desta forma, o Bradesco BBI possui recomendação neutra para os ativos, com preço-alvo de R$ 22. De acordo com os analistas, a queda do preço das ações até a última sexta-feira, de 46,8%, com desempenho bastante inferior ao do Ibovespa, que apresentou queda de 30,6%, ocorreu em meio à percepção dos investidores de seu balanço mais frágil e maiores preocupações sobre liquidez versus os pares da América Latina no contexto do coronavírus. E a visão do banco para o papel não mudou, apesar dos bons resultados.

Já o Credit Suisse aponta que, apesar do momento mais fraco frente outras empresas de proteína da cobertura, a ação está barata ao ser negociada a um valor de 6,2 vezes o EV (relação entre valor de mercado da empresa, levando em conta a dívida) em relação ao Ebitda esperado para 2020, a BRF continua sendo um case interessante.

Na mesma linha, XP, Itaú BBA e Eleven possuem recomendação equivalente à compra para os ativos. O Morgan Stanley, por sua vez, manteve recomendação underweight (exposição abaixo da média do mercado), também destacando as preocupações com o maior custo de grãos e a expectativa para preços menores de frango à frente.

Por outro lado, Diana Stuhlberger, analista da Eleven, reforça: “ainda que seja difícil prever os efeitos da crise no consumo de proteínas, acreditamos que o resultado do primeiro trimestre mostrou a força da marca da BRF e os frutos da melhora de gestão. Além disso, acreditamos que um eventual movimento de trade down (busca por economia) por parte da população deverá resultar em aumento do consumo da carne de frango em relação a carne bovina, principalmente no Brasil”, o que beneficiaria a BRF.

Os números da companhia de proteína foram comemorados, mas os investidores vão ficar bem atentos sobre os próximos passos para entender se a disparada do papel nesta sessão é sustentável – ou se foi só um voo de galinha.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.