Sinais de retorno do crédito e impacto de precatórios aceleraram varejo em janeiro

Alta foi mais disseminada no mês, o que sugere um início de recuperação nas concessões de crédito para as famílias, dizem economistas; projeções para o PIB do trimestre devem subir

Roberto de Lira

Vendas de automóveis foram destaque em janeiro

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O crescimento nas vendas varejistas brasileiras acima das previsões em janeiro tiveram como novidade a disseminação da melhora tanto nas categorias mais sensíveis à renda como naquelas que dependem mais do crédito, destacam os economistas. Além dos contínuos ganhos da massa salarial, podem ter surgido no mês os primeiros efeitos do pagamento de precatórios pelo governo.

Ainda que reconheça a continuidade do comportamento volátil do comércio – a alta de 2,5% em janeiro anunciada hoje, por exemplo, foi precedida por uma queda de 1,4% em dezembro -, Lucas Barbosa, economista do AZ Quest, comenta que o dado do IBGE é inegavelmente forte, uma vez que todos os setores principais mostraram algum crescimento.

Ele lembra que houve alguns efeitos de rebotes – como no caso do setor de vestuário, que subiu 8,5% após uma queda de 6,9%, e de móveis e eletrodomésticos, com +3,6% em janeiro, depois de -7,4% em dezembro – mas afirma que o comércio começa a dar algum sinal de reaceleração, tanto nos itens mais ligados à renda quanto aos itens ligados ao crédito.

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Ele explica que, de um lado, existem os efeitos de mercado de trabalho aquecido, o que faz com que os itens ligados à renda, como supermercados e itens farmacêuticos apresentem crescimento. Do outro, há sinais de retorno das  concessões de crédito para as famílias, o que faz com que os setores de material de construção, automóveis, computadores e celulares comecem a mostrar alguma alta na ponta.

“A alta no mês e a revisão dos números anteriores faz com que o varejo passe a ter, no ampliado, uma carrego estatístico de 1,9% para o primeiro trimestre de 2024, ante os 0,5% negativos com os dados disponíveis até dezembro”, prevê. Para o varejo restrito, ele estima uma alta 1,6%, ante projeção anterior de -0,9%.

Selic em queda

Rafael Perez, economista da Suno Research, também acredita que o aumento da renda das famílias, com o mercado de trabalho aquecido, e o crescimento dos salários explicam essa melhora em diversos segmentos.

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“Além disso, uma retomada do consumo, após vendas mais concentradas na Black Friday e queimas de estoque em janeiro explicam essa alta mais acentuada no mês”, afirma Perez. Para ele, a continuidade do ciclo de cortes da Selic pelo BC e o cenário mais favorável para o consumo e para o crédito devem impulsionar o varejo este ano, principalmente os segmentos mais dependentes de financiamentos.

A XP destaca a forte influência no mês das vendas de veículos, nos supermercados e no atacarejo, atribuindo a esses dois últimos grande parte da diferença entre a expectativa e o resultado real divulgado.

“No geral, estes números reforçam a nossa visão de que o consumo das famílias avançará de forma constante ao longo deste ano, apoiado por outra expansão acentuada do rendimento disponível real e por uma melhoria gradual nas condições do mercado de crédito”, diz o economista Rodolfo Margato em relatório.

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A expectativa da XP para o crescimento do PIB do 1º trimestre subiu para 0,65% na comparação trimestral e para 2,3% na anual.     

Precatórios

Além da renda mais alta, alguns economistas citaram estímulos fiscais como fatores que aceleraram as vendas em janeiro. Claudia Moreno, economista do C6 Bank, cita esse fator ao avaliar que o varejo começou o ano com força. 

“O aquecimento do mercado de trabalho e o aumento da massa salarial ajudam a explicar o bom desempenho do comércio neste começo de ano. Os estímulos fiscais, como o pagamento de precatórios, também podem estar impulsionando a atividade econômica”, comenta.

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Agora, ela diz que o varejo ampliado deve fechar o ano com crescimento de 2,6%, contribuindo positivamente para a expansão do PIB. “Dados mais fortes vindos de alguns setores sugerem que a atividade pode crescer além do que projetávamos. Por isso, revisamos nossa projeção de crescimento do PIB de 2,2% para 2,4% em 2024”, estima.

André Cordeiro, economista-sênior do Inter, afirma que o resultado anunciado hoje é uma surpresa positiva, com boa parte da alta vindo de setores discricionários, sugerindo maior fôlego por parte do consumidor.

“Nota-se uma influência da melhora no crédito na margem, com as atividades mais sensíveis ao crédito tendo uma notável melhora em janeiro. Portanto, à medida que a política monetária se torna menos restritiva, poderemos ver maior alívio nas vendas do varejo”, explica, ponderando que não dá para descartar a possibilidade de o forte desempenho ter sido um acontecimento pontual.

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Na análise do Santander Brasil, a surpresa positiva do varejo em janeiro, foi em parte devido à recuperação de dezembro, mas também provavelmente sofreu impulsionada do pagamento de precatórios.

Na visão de Igor Cadilhac, economista do PicPay, a perspectiva é que o mercado de trabalho aquecido, a regra de valorização do salário-mínimo e a inflação comportada devem contrabalançar um juro real ainda elevado. “Projetamos uma alta de 0,6% para o varejo ampliado neste ano.”

João Savignon, chefe de pesquisa macroeconômica da Kínitro Capital, é outro economista a destacar a alta disseminada entre as atividades que compõem o varejo, com taxas positivas atingindo 6 das 10 atividades pesquisadas que temos variações mensais. “ Após um dezembro muito ruim, com queda abaixo do piso e disseminada entre as atividades, tivemos uma reversão desse resultado em janeiro, com alta acima do teto das projeções e disseminada”, detalha.

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Essa “cara melhor”, entanto, pode ter sido um reflexo de um dezembro mais fraco e não como uma nova tendência, segundo o economista. De qualquer maneira, Savignon acredita em um cenário de crescimento moderado.

“Há maior espaço na renda e capacidade de endividamento das famílias, o mercado de trabalho segue apertado e o processo de desinflação da economia mantém o afrouxamento das condições monetárias e creditícias no país. Devemos observar algumas atividades mais ligadas ao crédito tendo um desempenho melhor do que o do ano passado”, prevê.