IPCA menor do que o esperado traz alívio para curva de juros, mas inflação “galopante” segue preocupando

"Será preciso acompanhar os dados de inflação de outubro para avaliar se a a alta de preços vai de fato perder força", aponta João Leal, da Rio Bravo

Lara Rizério

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SÃO PAULO – O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), inflação oficial do Brasil, veio em setembro abaixo do esperado pelo mercado. O indicador, em conjunto com os dados de emprego abaixo do esperado nos EUA, leva a uma forte queda dos principais contratos de juros futuros.

Às 14h24 (horário de Brasília), os juros dos contratos para janeiro de 2023 recuam 16 pontos-base a 9,04%, enquanto o DI para janeiro de 2025 tem baixa de 16 pontos-base a 10,04% e o DI para janeiro de 2027 registra variação negativa também de 16 pontos-base, a 10,45%.

Apesar do IPCA de gerar um certo alívio também por conta da dinâmica menos preocupante, economistas ainda se mostram bastante reticentes e veem fortes desafios para o cumprimento da meta de inflação pelo Banco Central também em 2022.

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Isso porque, ainda que a expectativa do mercado fosse de alta de 1,25%, a variação positiva do índice foi de 1,16% em setembro, a maior para o mês desde 1994.  O IPCA acumula alta de 6,9% no ano e de 10,25% nos últimos doze meses.

O indicador foi puxado, principalmente, pela alta de preço dos bens administrados, sobretudo energia elétrica residencial e gasolina. “Como são preços administrados, determinados por agências regulatórias, estabelecidos contratualmente, o Banco Central não tem condições de atingir esses preços através da política monetária”, afirma Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital.

A difusão (número de itens que tiveram aumentos de preços mensais) diminuiu para 65,0% em setembro (contra 71,9% em agosto).

A inflação de setembro veio em uma semana de dados fracos da economia brasileira, como o indicador de produção industrial e as vendas no varejo, que vieram piores do que o esperado.

João Leal, economista da Rio Bravo Investimentos, ressalta que a surpresa para baixo do IPCA de setembro não foi concentrada em um único setor.

“Alimentação, artigos de residência, vestuário e transportes, foram os que mais contribuíram para essa surpresa e podem já refletir o efeito de uma demanda mais baixa como mostrado nos dados de vendas no varejo de agosto”, avalia.

Os principais desvios vieram de carnes, reparação de automóveis e combustíveis para veículos. Já a inflação de serviços acelerou para 0,64%, ante 0,39% em agosto, mas ficou abaixo do projetado (0,78%). E os serviços básicos, medida monitorada pelo BC, desacelerou de 0,64% em agosto para 0,37% em setembro – a expectativa da XP era de alta de 0,56%. Os preços dos bens industriais subiram 1,04%, ligeiramente acima do registrado em agosto (alta de 1,03%).

A média dos núcleos ficou estável em 0,65%, e o acumulado em 12 meses já atingiu 6,37%, acima da meta de inflação do BC (3,75%).

Contudo, “embora (o número) tenha sido abaixo do projetado, não traz elementos tão confortáveis assim. Aquele cenário que a gente traçava no começo do ano de que o IPCA seria forte no meio e depois ia arrefecendo ao longo do segundo semestre não está se concretizando”, destaca Gustavo Cruz, economista e estrategista da RB Investimentos.

Após ter aberto o ano com a Selic na mínima histórica de 2%, o Banco Central já elevou a taxa básica de juros em 4,25 pontos de março até agora, ao patamar atual de 6,25% ao ano, indicando mais recentemente que irá avançar em “território contracionista”.

O BC descreve a inflação como “intensa e disseminada”, e alerta que o ciclo de elevação da Selic para domá-la vai afetar a atividade no ano que vem. As contas do BC são de IPCA em 8,5% neste ano.

Leal, da Rio Bravo, também destaca que, apesar da surpresa negativa, os núcleos continuam pressionados, indicando que a inflação mais alta permanece afetando um grande número de setores. “Será preciso acompanhar os dados de inflação de outubro para avaliar se a a alta de preços vai de fato perder força”, aponta.

Tatiana Nogueira, economista da XP, avalia assim, em resumo, que o número foi abaixo do esperado e com desagregação positiva, principalmente nos preços de serviços. Por outro lado, alimentos e combustíveis (itens que surpreenderam para baixo) têm pressão de alta no final deste ano. Os preços dos bens industriais também devem permanecer sob pressão.

Assim, os riscos continuam, conforme destacou em nota Alberto Ramos, economista-chefe para América Latina do banco Goldman Sachs. Segundo ele, a aceleração da inflação ao consumidor em setembro ameaça a meta estabelecida pelo Banco Central para 2022.

“Pressões significativas de custos e insumos, aumento da inflação de serviços, risco político e fiscal persistentes, (…) e forças inerciais estão contaminando as perspectivas para a inflação em 2022 e devem levar o Banco Central a conduzir a [taxa de juros] Selic para território contracionista. Em um cenário de intensas pressões inflacionárias, a probabilidade de o banco central conseguir conduzir a inflação para a meta de 3,50% em 2022 é baixa.”

O Morgan Stanley, por sua vez, aponta que o dado de setembro não altera o plano de voo do Banco Central neste momento, mantendo o ritmo de elevação da Selic em 100 pontos-base na próxima reunião. “Acreditamos que a taxa terminal será de 9,25% na reunião de março”, avaliam os economistas.

 Relatório de emprego nos EUA

Além do IPCA, o dado de emprego nos EUA também levou a uma queda dos juros futuros, como já destacado acima.

O resultado veio muito abaixo das expectativas de mercado, apresentando a criação de 194 mil de empregos, sendo que a projeção de mercado era de criação de 500 mil vagas, ainda que cabendo destacar que a medição anterior, de agosto, que também surpreendeu negativamente, foi revisada, passando de 235 mil vagas para a criação de 366 mil vagas.

“Isso é uma sinalização de que a atividade econômica está reagindo abaixo das expectativas de mercado e que talvez isso impacte no horizonte de política monetária do Federal Reserve”, afirma Alexandre Almeida, economista da CM Capital. Na última decisão de política monetária do Fed, a autoridade afirmou que poderia antecipar o fim dos estímulos a economia por meio de compra ativos, eliminando a injeção de liquidez na economia.

“Entretanto com esse dado de folha de pagamentos muito pior do que o esperado isso tende a colocar uma necessidade de continuar esse programa”, afirma Almeida.

O payroll é visto como um importante indicador de recuperação da economia americana e que deve ser levada em consideração pelo Federal Reserve na decisão de retirada de estímulos e aumento das taxas de juros.

Conforme destaca a CM Capital, em geral, a percepção é de uma brusca desaceleração tanto nos dados do setor de serviços, passando de 295 mil vagas para 265 mil. Os setores de varejo e atacado, apesar de apresentarem recuperação relevante frente à medição anterior, não compensou a desaceleração dos setores de transporte, atividade financeira, serviços profissionais, além dos dados de serviços apontarem queda importante do setor de educação.

“O dado de hoje traz cautela para as expectativas de mercado, que depende desse tipo de sinalização como justificativa para poder esperar uma antecipação de alta dos juros pelo Federal Reserve. Levando em consideração que cada vez mais diretores do FED apresentam uma inclinação maior para antecipação do tapering, além do fato da inflação ao consumidor causar preocupação no mercado, o Payroll divulgado hoje pode contribuir para uma decisão de postergação na política de restrição monetária”, aponta a equipe de análise da casa.

(com informações da Reuters)

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.