IPCA em linha com esperado não alivia preocupação com alta de alimentos; Camex zera alíquota de importação de arroz

Segmento de alimentos e bebidas tiveram alta de 0,78% no mês; segundo jornais, expectativa é que a Camex zere tarifa de importação de arroz

Lara Rizério

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SÃO PAULO – A inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de agosto, divulgada nesta quarta-feira, foi em linha com o esperado ao subir 0,24% e representando uma desaceleração frente ao mês de julho, quando houve uma alta de 0,36% na comparação mensal.

Porém, ao contrário do que poderia indicar, o dado não aliviou as preocupações sobre o aumento de preços em alguns segmentos, principalmente levando em conta os componentes que levaram a esse aumento, caso de transportes e alimentação.

Esses itens pressionaram o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que atinge a população de renda mais baixa e deve manter a preocupação do presidente Jair Bolsonaro com os valores dos produtos básicos. O índice, que se refere às famílias com rendimento de um a cinco salários
mínimos, apresentou alta de 0,36% em agosto, sendo o maior resultado para o mês desde 2012, conforme destacou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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Os preços de alimentos e bebidas tiveram alta de 0,78% no mês, ante 0,01% no mês anterior; o arroz subiu 3,08% e acumula alta de 19,25% no ano. Destaque ainda para as altas de tomate (12,98%), do óleo de soja (9,48%), do leite longa vida (4,84%), das frutas (3,37%) e das carnes (3,33%) na comparação mensal. A gasolina, por sua vez, subiu 3,22%, o que fez com que os Transportes, com alta de 0,82%, apresentassem o maior impacto positivo no índice do mês passado, destacou o IBGE.

Em meio a esse cenário, no final da tarde desta quarta-feira, a Câmara de Comércio Exterior (Camex) reduziu a zero a alíquota de importação de arroz, de forma a conter os preços. A redução está restrita a uma quota de 400 mil toneladas de arroz com casca não parboilizado e arroz semibranqueado e branqueado, não parboilizado.

Na semana passada, a Abras disse por meio de comunicado que o setor supermercadista tem sofrido forte pressão de aumento nos preços. “Conforme apuramos, isso se deve ao aumento das exportações destes produtos e sua matéria-prima e a diminuição das importações desses itens”, diz a associação. “Somando-se a isso a política fiscal de incentivo às exportações, e o crescimento da demanda interna impulsionado pelo auxílio emergencial do governo federal.”

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Assim, embora o Brasil esteja colhendo uma safra recorde de grãos em 2020, alguns itens estão mais caros para o consumidor doméstico. Reforçando a visão, Pedro Kislanov, gerente do Sistema Nacional de Índices de Preços do IBGE, aponta que o câmbio mais alto estimula as exportações e reduz a oferta de produtos no mercado doméstico.

“Essa alta nos alimentícios tem a ver com vários fatores, um deles é demanda externa, principalmente chinesa. Outro é câmbio, porque com dólar alto é interessante para o produtor exportar. E o auxílio emergencial ajudou a sustentar preços de alimentos, especialmente arroz e feijão, produtos mais básicos. Aumenta demanda também de laticínios. Mas tem alguns alimentos que estão caindo. Não é como se todos os alimentos estivessem subindo conjuntamente”, justificou Kislanov.

“O auxílio emergencial foi importante para sustentar a demanda por alguns produtos da cesta mais básica, e pode continuar sustentando nos próximos meses”, completou.

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Na véspera, o presidente Jair Bolsonaro descartou a possibilidade de “tabelar” preços com o intuito de conter a alta acelerada do arroz nos supermercados brasileiros e disse estar conversando com os comerciantes para tentar convencê-los a “colaborar nesse momento”. A colaboração seria com os supermercados abrindo mão da margem de lucro obtida com a venda de produtos essenciais para, com isso, empurrar o preço para baixo, o que também foi visto com muitas ressalvas pelo mercado.

Inflação segue controlada

Nesse cenário, alguns economistas estão revisando suas previsões de inflação para cima, ainda que não vejam uma alta generalizada de preços, como é o caso da equipe da XP Investimentos.

“Com as surpresas inflacionárias vindas principalmente de alimentação no domicílio e com a perspectiva de que as diversas fontes de estímulos atualmente vigentes na economia (creditícias, monetárias e fiscais) continuem pressionando os preços de alimentos nos próximos meses, revisamos a nossa projeção de IPCA para o final de 2020 de 1,4% para 1,7%. Para o ano que vem, motivados pelo cenário de devolução dos preços de alimentos, revisamos de 2,7% para 2,6%”, destacou em relatório.

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Contudo, apontam, apesar da revisão, o cenário inflacionário continua benigno e os principais núcleos de inflação, que expurgam da contabilização os itens com os preços mais voláteis, seguem bem-comportados e alinhados com o cenário de Selic a 2,0% ao ano até meados de 2021.

Para o Goldman Sachs, de modo geral, as perspectivas de fraco crescimento e as perspectivas benignas para a inflação corrente poderiam inclusive balizar um corte adicional da Selic. No entanto, preocupações com relação à volatilidade do câmbio, fluxos de capital, riscos político e fiscal de médio prazo e o fato de que a taxa básica de juros já está em um nível sem precedentes virtualmente elimina a possibilidade de atenuação adicional, avalia o economista Alberto Ramos.

A Capital Economics reforça ainda que as notícias de corte das tarifas de importação de produtos alimentícios também poderiam ajudar a amenizar as pressões inflacionárias. Com isso, o Copom não terá pressa de subir os juros, devendo fazer com que eles permaneçam em 2% até 2022 – enquanto os investidores já estão precificando um aperto monetário a partir do início do próximo ano.

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Vale destacar ainda, conforme aponta o Bradesco BBI, que o IPCA foi mais ameno por conta da categoria educação, devido à redução nas mensalidades escolares impulsionada pela pandemia. Não fossem os descontos em cursos regulares, a inflação oficial do país teria subido 0,48% em agosto (ou seja, o dobro do registrado).

A inflação de serviços, por sua vez, continuou apresentando um comportamento bastante benigno, em linha com o desempenho do setor nos últimos tempos, ainda demorando a se recuperar dos impactos da pandemia. “Por ora, mantemos nossa projeção de IPCA de 1,8% para o ano de 2020, lembrando que, agora, ele tem um viés de alta principalmente em função da inflação de alimentos em casa”, avalia.

O Bank of America, por sua vez, espera uma inflação de 2% ao ano e ressalta que, apesar da recuperação inicial da demanda global, do lado doméstico espera-se que o PIB ainda bem abaixo do potencial mantenha a inflação benigna. Contudo, reforça, a pressão sobre os custos demonstrada pela alta de  preços no atacado será observada de perto.

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Com isso, os economistas seguem vendo a inflação a níveis controlados e que reforçam a Selic baixa, ainda mais considerando que a alta tem ocorrido em setores pontuais. Contudo, a alta de alimentos e os anúncios do governo para atenuar esse movimento serão observados de perto pelo mercado. Por mais que o núcleo da inflação esteja controlado, o aumento de preços de alimentos gera grande preocupação, principalmente por afetar as camadas mais vulneráveis da população brasileira.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.