Fomc deve elevar juros na 4ª feira e apontar que futuras decisões dependerão dos dados, dizem analistas

Ainda que projeções tenham apontado para duas altas até o final do ano, indicadores de inflação e atividade podem antecipar fim do ciclo

Roberto de Lira

Prédio do Federal Reserve em Washington (REUTERS/Joshua Roberts/File Photo)
Prédio do Federal Reserve em Washington (REUTERS/Joshua Roberts/File Photo)

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A reunião do Comitê de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) do Federal Reserve concentra as atenções do mundo financeiro nesta 3ª e 4ª feira menos pela decisão da autoridade monetária em si e mais pelo teor do comunicado e pelos recados que o presidente Jerome Powell passará na coletiva de imprensa. Há uma unanimidade entre os analistas que o Fed deve optar por uma alta de 25 pontos-base amanhã.

A expectativa também é que o banco central americano deve deixar a porta aberta para outro incremento à frente, mas que isso pode nem acontecer caso os dados macroeconômicos sigam a atual tendência, de desinflação e esfriamento da atividade. Por outro lado, a resiliência do mercado de trabalho ainda preocupa e coloca um risco de outra alta até o final do ano.

Kaian Oliveira, economista internacional da Parcitas Investimentos, acredita que o Fomc deve adotar a mesma estratégia de comunicação do último encontro em junho, quando Powell sinalizou um estado de reunião permanente (“live meeting”). Ou seja, aguardar e avaliar os dados que serão divulgados até a reunião de 20 de setembro.

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Apesar de trabalhar com uma taxa terminal de 5,4%, que representa apenas mais uma alta de juros, Oliveira não está prevendo uma sinalização mais clara por parte dos diretores do Fed.

“Qualquer coisa nesse sentido geraria um grande alívio de condições financeiras e seria contraproducente para um BC que está lutando contra inflação. Ele deve sinalizar que setembro é um ‘live meeting’ que dependera dos dados de inflação e atividade no tempo. Mas coloco mais peso em inflação”, diz.

Até a próximo reunião, devem ser divulgadas, entrou outros, a prévia do PIB para o 2º trimestre, dois dados de inflação ao consumidor (CPI), ou dois de folha de pagamento (Payroll) e dois PCE, que é a inflação do consumo.

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O economista da Parcitas destaca que Christopher Waller, um dos membros votante do Fomc, disse recentemente que se até setembro houver mais dois números de inflação mais fraca, eles poderiam pensar em não subir os juros.

Para amanhã, a expectativa de o Fed subiu os juros em 0,25%, uma vez que as projeções (“dots”) dos diretores em junho apontaram para mais duas altas nesse ritmo até o final do ano. “Já ‘pulou’ a última reunião e seria bem estranho não subir nessa. Inclusive já foi estranho ele ter feito uma revisão pra cima nas previsões em junho e não ter vindo com alta, gerando a necessidade de algum contorcionismo para explicar”, comenta.

André Cordeiro, economista-sênior do Banco Inter, analisa que os membros do Fomc deixaram claro desde a última reunião que não veem a política monetária contracionista o suficiente, por isso anteciparam em suas projeções de mais duas altas de 25 p.b. até o fim do ano.

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Sobre o comportamento dos indicadores desde junho, Cordeiro destacou que tanto Payroll como a inflação vieram abaixo do esperado, mas que o dado do mercado de trabalho ainda se encontra em um patamar muito elevado, com a taxa de desemprego em nível historicamente baixo. “Além disso, os salários ainda crescem a uma taxa anualizada acima dos 4%, o que é inconsistente com a convergência da inflação à meta de 2%”, destaca.

Outro ponto a ponderar, diz o economista, é que o índice cheio da inflação já está na faixa dos 3% em termos anualizados, mas que o núcleo da variação dos preços está em patamar elevado, de 4,8%, ainda distante da convergência, indicando uma persistência elevada da inflação.

Sobre a comunicação do Federal Reserve, o economista do Inter não acredita que vai haver sinalização clara de quando pretende pausar o ciclo. “Esperamos que o comunicado da decisão venha num tom ainda duro, deixando em aberto novas altas, mas enfatizando que o comitê irá tomar as decisões com base no fluxo dos dados econômicos divulgados entre as reuniões”, pondera.

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No entanto a avaliação é que a última alta projetada pode não acontecer. “Acreditamos que, em novembro, a economia americana sentirá de maneira mais intensa os efeitos do atual aperto monetário, retirando a necessidade dessa última alta. Portanto, vemos com grande probabilidade que a alta da próxima reunião seja a última deste ciclo”, estima Cordeiro.

Dúvida para setembro

Claudia Rodrigues, economista do C6 Bank, também projeta uma alta de 25 pontos-base nessa reunião de julho, por conta do núcleo da inflação persistente e pelo mercado de trabalho aquecido, com a taxa de desemprego próxima da mínima dos últimos 50 anos, o que causa pressão sobre salários e sobre a inflação à frente.

Sobre as decisões futuras, Claudia afirma que o Fed deve optar por um novo aumento nas taxas, mesmo após alguns dados positivos em termos de política monetária, com alguma chance de um nova parada para avaliação.

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“Acreditamos que a inflação deve seguir alta e persistente, com o núcleo acima da meta, e o mercado de trabalho aquecido. É possível, no entanto, que o Fed opte por não fazer as duas altas seguidas, pausando novamente depois de julho para avaliar a resposta da economia ao aperto monetário.”

Gabriela Sporch, analista da Toro Investimentos, é outra especialista a destacar a importância da avaliação dos dados entre as reuniões do Fomc. “Tivemos dados positivos de PCE e CPI, apesar da parte de referente ao mercado de trabalho, que segue apertada. Porém, tivemos prévia do PMI de serviços, que desacelerou bem mais do que o esperado, mais um ponto positivo para essa questão que segue sendo um ponto de atenção dos Bancos Centrais”, comenta.

Ela discorda que o Fed possa optar por sinalizar uma parada e depois, dependendo dos dados, voltar a subir. “Acredito que eles irão reforçar que continuam a acompanhar os dados a serem divulgados e que qualquer possibilidade ainda é levada em consideração”, afirma.

Igor Barenboim, sócio e economista chefe da Reach Capital, também observa que o quadro melhorou desde a última reunião. “O que a gente viu foi uma série de dados melhores, inflação, uma desaceleração um pouco maior da economia. A única coisa que ainda está forte é mercado de trabalho”, poderá.

O economista alerta que, mesmo com o mercado de trabalho apertado, a inflação pode cair. “Então o Fed vai falar que olhará para os dados. E o mercado vai gostar disso e entender que essa foi a última (alta). Não vai escrever isso, mas o Powell na coletiva de imprensa vai falar isso”, prevê.

Para Raphael Camargo, analista da Neo Investimentos, o comunicado que envolve a decisão não deve trazer grandes surpresas e alterações significativas. “O destaque continuará sendo o ‘forward guidance’, mantendo a postura dependente dos dados e levando em conta o aperto monetário acumulado até então.

Sobre a entrevista de Powell, Camargo espera que o presidente do Fed vai reforçar o argumento de que os últimos “dots”, que indicam mais uma alta em 2023 (além dessa de julho) ainda são relevantes, mas com um aviso de que as futuras decisões não são pré-determinadas e, portanto, ainda vão depender dos dados.

Isso irá na linha de deixar a porta aberta para pausar em setembro, afirma o analista da Neo. “O ponto referente ao número positivo de inflação de junho ainda deve ser tratado com cautela por Powell na conferência, para não ser interpretado como um otimismo exagerado. Sendo assim, as duas próximas leituras de inflação serão cruciais para determinar o movimento para além da reunião desta semana.”

Demanda ainda aquecida

Ariane Benedito, economista e RI da Esh Capital, afirma que, considerando as últimas comunicações dos dirigentes do Fed, o entendimento mais duro deve continuar após dados de mercado de trabalho que permanecem nas máximas, apesar do arrefecimento em relação aos meses anteriores.

“Conforme o último documento divulgado pela instituição, o Livro Bege, que trata da leitura e expectativas econômicas da autarquia, a percepção para a inflação é de desaceleração, mas os preços ao consumidor seguem pressionados por demanda elevada”, destaca.

Ariane diz ainda que o mercado ficará atento à sinalização do Fed sobre os próximos passos da autarquia monetária, especialmente sobre a espera pelo anúncio do fim do ciclo de alta. “No entanto, existe a probabilidade do Banco Central americano continuar o aperto em mais um ajuste de 0,25%, caso os dados de mercado de trabalho e atividade permanecerem resilientes à demanda aquecida e melhora na renda”, afirma a economista da Esh.

Andressa Durão, economista da ASA Investments, também não espera que o Fed vá sinalizar o fim do ciclo, apenas que deixará a porta aberta para novas altas, se mantendo dependente dos dados.

“Powell já havia indicado que o Fed estaria adotando a estratégia de ‘skip’ (pular) como forma de reduzir o ritmo de alta e deve manter o mesmo discurso. Ou seja, a ideia de que uma possível nova alta após a alta de julho aconteceria em novembro, e não em setembro, será mantida.”

Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, também projeta que a alta de 25 pontos-base a ser anunciada na quarta-feira terá como motivação as medidas de inflação ainda pressionadas e acima das expectativas. E pelos indicadores de emprego, que continuam mostrando resiliência. Por outra lado, a atividade econômica já mostra uma certa desaceleração.

“A gente já começa a enxergar um pouso suave. Cada vez mais os EUA estão tirando o risco de recessão. Pelo menos é o cenário que está sendo construído para os próximos meses. Passado o período de maior preocupação, que foi o risco no sistema bancário, tudo está numa situação mais positiva”, comenta.

Sobre os próximos passos, Agostini lembra que, na última reunião, Jerome Powell falou que poderia parar, mas que depois voltou a abrir a porta. Ou seja, o cenário ainda está de definição. “Pode vir com discurso ameno. Nem sempre o discurso está sendo condizente com as decisões do Fed.”