Analistas veem ata com tom mais duro e sinal que Fed prefere manter expectativas ‘ancoradas’

Para especialistas, ata do Fomc alertou que flexibilização apressada nas condições financeiras dificultará esforço de estabilidade dos preços

Roberto de Lira

(Crédito: Shutterstock)

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Embora tenham admitido que há riscos a serem pesados se o efeito cumulativo da política monetária mais restritiva pode trazer impactos nocivos à atividade econômica, prevaleceu entre os diretores do Fomc a visão de que o maior risco ainda é de um afrouxamento prematuro do ciclo de alta de juros. Para os analistas, as leituras do Federal Reserve e do mercado ainda estão distantes.

Para Angelo Polydoro, economista da ASA Investments, a ata do Fomc teve o tom mais duro (“hawk”), ficado no risco de desancoragem das expectativas de inflação. “Foi uma ata que deixou muito claro que o Fed ainda não virou a chave. Está mais incomodado com a inflação do que o mercado”, afirmou.

Alguns detalhes expostos na ata, segundo Polydoro, mostram que o avanço dos dados foi até reconhecido pelos integrantes do Fomc – como o núcleo do PCE até outubro em 5% e o CPI de novembro recuando para 7,1% – mas que isso não foi suficiente para que eles acreditassem que a batalha foi vencida. “O mercado vai ter de esperar um pouquinho para ter o Fed ao seu lado e vislumbrar um final de ciclo de aperto dos juros”, afirmou.

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Segundo análise da equipe econômica do Banco Original, a dúvida ante da divulgação era como o Fed poderia comunicar a marcação dos famosos dots (pontos) da última reunião, que sinalizaram um posicionamento um pouco altista dos participantes em relação às metas implícitas dos Fed Funds para 2023.

Nesse sentido, segundo banco alguns trechos da ata foram bem claros. Num dos trechos, o comitê enfatizou a importância de deixar claro que uma desaceleração no ritmo de alta dos juros não era uma indicação de enfraquecimento de sua determinação em atingir a meta ou um julgamento de que a inflação já estava em trajetória de queda.

Em outro ponto, destaca o Original, o Fed diz que, dado que a política monetária funcionou maneira importante por meio dos mercados financeiros, uma flexibilização apressada nas condições financeiras dificultaria o esforço do comitê de restaurar a estabilidade dos preços.

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“De modo geral, a postura do Fomc sinaliza cautela diante das incertezas sobre convergência inflacionária e crescimento da economia, que tem dado sinais mistos no curto prazo”, diz o comentário do Banco Original. “Em termos de gestão de risco, o comitê reconhece a necessidade de manter a política monetária em campo restritivo por mais tempo.”

Previsões agressivas

Para a XP Investimentos, a ata revelou que o Fed precisa de “substancialmente mais evidências” de progresso nas pressões de preços para ter certeza de que a inflação está convergindo para a meta de 2%. “Ainda assim, algumas autoridades reconheceram que os riscos para as perspectivas de inflação estão ‘se tornando mais equilibrados’ e que o risco de aperto excessivo também deve ser compensado”, afirmou o economista Francisco Nobre.

Para Nobre, os formuladores de políticas nas principais economias desenvolvidas parecem estar ignorando as últimas impressões de inflação benigna e sentiram a necessidade de publicar previsões “irracionalmente agressivas” para compensar o erro que aconteceu quando a inflação disparou e os bancos centrais ficaram para trás da curva.

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Um exemplo disso, segundo o economista da XP é que Fomc está prevendo que o núcleo da inflação do PCE terminará 2022 em 4,8% anuais, o que exigiria que os preços do PCE subissem 0,7% na comparação mensal em dezembro, significativamente acima das previsões mais pessimistas.

Além disso, na Europa, o BCE espera que a inflação global permaneça acima de 7% ao longo de 2023, o que para Nobre é muito improvável do ponto de vista estatístico, dado o alívio mostrado nos últimos dados do CPI (especialmente na França e na Alemanha). “Portanto, a única explicação possível por trás dessas previsões é que os bancos centrais estão tentando enviar uma mensagem forte aos mercados”, comentou.

O economista da XP afirma quinda que os mercados estão precificando a taxa terminal dos Fed Funds em 5,0%, “mas mantemos nossa visão de que o Fed não deve continuar a restringir as condições financeiras”. Segundo ele, as taxas já aumentaram em significativos 425 bps desde o início do ciclo de aperto, e aumentos adicionais aumentariam o risco de aperto excessivo, ao mesmo tempo em que forneceriam pouco ou nenhum alívio adicional à inflação.

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“Além disso, praticamente todos os indicadores antecedentes de alta frequência indicam que a inflação está recuando significativamente, e acreditamos que o processo desinflacionário surpreenderá positivamente os mercados ao longo de 2023.”

Para o BTG Pactual, a ata trouxe poucos sinais para os próximos passos que o Fed deve tomar em fevereiro, uma nova alta de 50 pontos base ou menor, de 25 bps). O banco destacou em sua análise a avaliação do Fomc sobre o crescimento e mercado de trabalho, sobre a surpresa baixista de inflação de outubro e novembro e o reforço da determinação do Comitê de atingir sua meta de estabilidade de preços.

Também foi destacado a menção à necessidade de equilibrar os riscos de que uma política monetária mis branda pudesse desancorar as expectativas de forma estrutural e o de que o efeito cumulativo defasado da política pudesse se mostrar muito restritivo e levar a uma redução desnecessária da atividade econômica.

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“O diagnóstico segue em linha com o apresentado na coletiva de imprensa, mas reforçando a baixa inclinação para corte de juros. Dessa forma, seguimos com expectativa de uma taxa terminal no intervalo de 5% a5,25%, permanecendo nesse patamar ao longo de todo 2023”, previu o BTG.