Analistas destacam ligeira alta na população ocupada, mas sem previsão de pressões inflacionárias extras

Economistas ponderam que quadro ainda aquecido no mercado de trabalho pode atenuar a desaceleração da inflação de serviços

Roberto de Lira

Fila em busca de emprego no Rio de Janeiro (Mario Tama/Getty Images)

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A queda marginal de 0,1 ponto percentual na taxa média de desemprego no trimestre encerrado em julho – segundo o IBGE, a taxa recuou para 7,9% no período – corrobora a leitura de um mercado de trabalho ainda aquecido, desta vez com algum crescimento na população ocupada. Segundo analistas, os dados do rendimento médio dos trabalhadores e da massa salarial não trazem pressões inflacionárias extras, mas podem interferir no processo de desaceleração dos preços até o final do ano.

O rendimento real habitual ficou em R$ 2.935 no trimestre até julho, o que representou uma ligeira alta de 0,6% em relação ao trimestre entre fevereiro e abril (R$ 2.916), mas mostrou alta de 5,1% na comparação anual – no trimestre de maio a julho de 2022, estava em R$ 2.792.

Já a massa salarial chegou a R$ 286,9 bilhões, um recorde da série histórica, cresceu 2,0% na leitura trimestral e 6,2% na comparação anual. Essa alta está muito ligada ao fato de a taxa de participação ter subido de 61,6% para 61,7%

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Para Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter, essa redução da população fora da força de trabalho foi a boa notícia do período, além da queda no número de desempregados. “Ainda assim, o patamar de participação ainda está abaixo da média pré-pandemia, de cerca de 63%”, pondera.

Para ela, apesar do bom momento do mercado de trabalho, o rendimento médio ficou estável no trimestre e não mostra pressão inflacionária adicional, “o que deve permitir a continuidade do processo de afrouxamento monetário pelo Banco Central”.

João Savignon, head de pesquisa macroeconômica da Kínitro Capital, destaca que a taxa de desemprego em termos dessazonalizados também recuou, de 7,9% para 7,8%, na sexta queda consecutiva. Ele também cita como destaques a estabilidade na margem do rendimento médio real efetivo e o ligeiro crescimento no trimestre da massa salarial real efetiva.

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“Os dados da PNAD vieram em linha com o esperado e seguem corroborando a visão de um mercado de trabalho aquecido, com importante crescimento da população ocupada e da massa salarial”, comenta.

Para ele, com a atual velocidade de queda da taxa de desemprego, devem ser observadas novas revisões para baixo nas previsões para os próximos meses, com o desemprego podendo terminar 2023 mais próximo de 7,5% do que dos 8,0% previstos anteriormente.

“Olhando para a atividade econômica em termos gerais, esse dado corrobora o nosso cenário de que a desaceleração segue em curso, mas em uma perspectiva mais de acomodação do forte crescimento do que queda da atividade”, analisa.

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Savignon acredita que o mercado de trabalho segue dando suporte ao consumo das famílias e mantendo a resiliência do setor de serviços, mesmo considerando a saída do efeito positivo do agronegócio no início do ano e a política monetária ainda restritiva nos próximos meses.

Novo normal

Na avaliação de Marco Caruso e Igor Cadilhac, economistas do PicPay, a melhora na taxa de participação no trimestre se deve principalmente à expansão do número de pessoas trabalhando. “Cada vez mais estamos observando o retorno das características econômicas e sazonais no período de consolidação da recuperação da pandemia”, comentam.

Por outro lado, ele alertam que o impacto pandêmico no mercado de trabalho ainda se faz presente, principalmente nos rendimentos. “Um dos motivos pode ser o fato de a crise da covid-19 ter modificado a forma como grande parte da população se relaciona com o trabalho. As pessoas estão mais dispostas a trocar um aumento salarial por uma maior qualidade de vida, com um trabalho híbrido ou remoto”, explicam

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Na leitura qualitativa do indicador divulgado nesta quinta-feira, eles argumentam que o mercado de trabalho segue forte e com uma composição saudável, recuperando assim suas características intrínsecas.

“Olhando à frente, entendemos que os efeitos defasados da política monetária contribuirão para um aumento da taxa de desemprego, que ainda resistirá em patamares historicamente baixos por mais um bom tempo. Para 2023, projetamos uma taxa média de desemprego de 8,2%.”

Claudia Moreno, economista do C6 Bank, também diz ter observado uma boa dinâmica do mercado de trabalho a partir dos dados da PNAD divulgados hoje. Ela destaca tanto o aumento da população economicamente ativa (PEA) quanto da população ocupada. “Ou seja, aumentou o número de pessoas trabalhando (ocupação) e o de quem está disposto a trabalhar (PEA)”, detalha.

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“Outro fator que reforça nossa visão de mercado de trabalho aquecido é que a renda real habitual, que vinha andando de lado, voltou a subir neste trimestre, retomando o patamar próximo da pré-pandemia”, afirma.

Para a economista, o segundo semestre deste deve ser marcado por uma desaceleração mais acentuada nos dados de atividade, mas essa perda de fôlego não deve ser suficiente para puxar a taxa de desemprego para cima. “Tanto o aumento da real habitual quanto o desemprego baixo devem dificultar a desaceleração da inflação de serviços”, analisa.

A previsão do C6 Bank é que a taxa de desemprego fique abaixo de 8% ao final de 2023. “Para 2024, nossa projeção é que a taxa termine o ano um pouco acima de 8%. A taxa atual já se encontra bem abaixo da média histórica brasileira, que é de cerca de 10%”, compara.

Na avaliação do Itaú, os dados continuaram a mostrar a resiliência do mercado de trabalho. “Apesar do aumento da taxa de participação, o desemprego caiu pelo oitavo mês consecutivo, impulsionado por aumentos nos setores formal e informal”, comentam em relatório os analistas Natalia Cotarelli e Matheus Fuck.

“Os salários reais efetivos permaneceram estáveis ​​em julho, mas dados os sinais de um mercado de trabalho forte, esperamos pressão salarial nos próximos meses. Além disso, mantemos nossa expectativa de que a taxa de desemprego encerre o ano em 8,0%”, afirmam.

Para o Goldman Sachs, a melhoria do mercado de trabalho que tem sido captada pelo IBGE deve desacelerar nos próximos trimestres, dada a expectativa de uma mudança para um crescimento da economia abaixo da tendência nos próximos trimestres.

Segundo relatório assinado pelo economista Alberto Ramos, a taxa de desemprego também poderá ser afetada se o número ainda considerável de trabalhadores desencorajados fora da força de trabalho – de 3,7 milhões, ou 3,4% da força de trabalho ativa – começar a procurar por uma ocupação. “Destacamos que 20,3 milhões de trabalhadores continuam subutilizados, 11,6% da população em idade ativa e 18,8% da força de trabalho economicamente ativa.”

Para Danilo Igliori, economista chefe da Nomad, embora esteja evidente um processo de desaceleração no fluxo de contratações, os ajustes no mercado formal de trabalho continuam ocorrendo de forma gradual.

“Os dados de desemprego evidenciam que o mercado de trabalho não está menos apertado. Não podemos deixar de notar que, com toda a restrição na política monetária, vemos não somente menor taxa de desemprego agregada, mas geração de vagas ocorrendo em todas as regiões do país e espalhadas pelos principais setores de atividade”, comenta Igliori.