Brasileiro cria startup contra estresse financeiro no Vale do Silício – e capta R$ 290 milhões

A Origin fornece o planejamento financeiro como um benefício corporativo. Fintech fez rodada série B para investir em equipe, produto e expansão

Mariana Fonseca

João de Paula, cofundador da Origin (Divulgação)

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SÃO PAULO – A pandemia do novo coronavírus ressaltou um problema que já era comum antes dessa crise econômica e sanitária: o estresse financeiro. A Origin olhou para esse problema – e decidiu que a resposta era fazer as empresas pagarem para que seus funcionários tenham um bom planejamento das contas.

O resultado também pode ser visto no bolso das próprias companhias: funcionários financeiramente estressados têm 4 vezes mais chances de serem diagnosticados com depressão e 2,2 vezes mais chance de se demitirem, segundo uma pesquisa da consultoria PwC. A proposta da fintech atraiu uma nova injeção de capital: a Origin anunciou nesta segunda-feira (20) uma rodada série B de R$ 290 milhões (US$ 56 milhões). O investimento avaliou o empreendimento em R$ 2 bilhões (US$ 400 milhões).

O empreendimento foi criado pelo brasileiro João de Paula e pelo americano Matthew Watson no Vale do Silício (Estados Unidos), em 2018. De Paula começou sua carreira em tecnologia faz dez anos, com o marketplace de lojas virtuais Glio. A startup passou na aceleradora americana Y Combinator em 2013. O empreendedor brasileiro criou conexões nos Estados Unidos, incluindo a amizade com Watson.

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“Nós éramos empreendedores e tínhamos passado pelo mesmo problema: quebrar na pessoa física. Estourando cartões de crédito ou entrando no cheque especial, praticamente tínhamos um mestrado em estresse financeiro e seus impactos tanto na saúde física e mental quanto na produtividade”, conta de Paula em entrevista ao Do Zero Ao Topo, marca de empreendedorismo do InfoMoney.

As experiências pessoais foram o impulso para criar a Origin em 2019. O objetivo dos empreendedores era ter uma solução escalável para planejamento financeiro e que fosse gratuita aos usuários. A fintech se monetiza por meio de uma mensalidade por funcionário paga pelas empresas, que oferecem o planejamento financeiro como benefício.

A Origin atende empresas em regiões como Canadá, Estados Unidos, Irlanda, Israel e Reino Unido. Alguns exemplos são Docusign, Udemy e Zynga. No Brasil, a Origin está fazendo um piloto com seus próprios funcionários – 42 dos seus 70 membros estão em território nacional.

“Atendemos principalmente empresas que tenham operação e jurídico no formato americano, o que normalmente é o caso das empresas de tecnologia. Elas costumam estar na vanguarda dos benefícios, por estarem em um cenário de muita competição por talentos”, diz de Paula.

Os funcionários colocam informações como idade, estado civil, quantidade de filhos e objetivos de vida (como pagar dívidas, formar uma reserva de emergência, fazer uma viagem, comprar um carro ou uma casa, aposentar-se ou preparar o patrimônio para sucessão). A fintech pede conexão com contas bancárias, de investimento e com dívidas pendentes.

Essas informações são processadas por uma inteligência artificial da fintech e transformadas em conselhos – por exemplo, qual deve ser a reserva e emergência com base nas despesas do funcionário, ou quanto ele deveria juntar por mês para comprar um carro daqui a dois anos.

Tais conclusões podem ser aprofundadas por uma rede de 250 planejadores financeiros certificados, que conversam com os funcionários por mensagem ou vídeo. “Vamos supor que o objetivo do funcionário seja comprar uma casa. O algoritmo dará informações como qual o valor máximo do imóvel, o valor máximo do financiamento, taxas de juros ideais e quais são as taxas ocultas dessa transação. Já os planejadores financeiros podem ajudar a entender se comprar uma residência é a decisão mais acertada para o momento de vida do funcionário”, diz de Paula.

Montar um plano e acompanhar sua execução é o diferencial da fintech para aplicativos de finanças pessoais que apenas acompanham gastos por categoria, segundo o cofundador.

A Origin compartilha com as companhias métricas como capacidade de atração e retenção de funcionários; quanto eles entendem os outros benefícios corporativos; e redução de horas gastas pelo departamento de recursos humanos explicando temas como Imposto de Renda e stock options. A fintech não divulga uma média dessas métricas entre as empresas atendidas. São “centenas” de companhias, com “centenas de milhares” de funcionários.

O empreendimento já havia captado um aporte semente de US$ 3 milhões e um aporte série A de US$ 12 milhões (entenda os estágios de investimento de uma startup).

A rodada série B foi liderada pelo fundo 01 Advisors, criado por ex-executivos do Twitter e que tem no portfólio empresas como a plataforma de ensino MasterClass; pelo fundo General Catalyst, que investiu no Airbnb e no Snapchat; e pelo investidor anjo Lachy Groom, um dos primeiros funcionários na fintech de pagamentos Stripe. Os investidores das rodadas anteriores acompanharam o novo investimento.

“Passamos os últimos três anos comprovando o problema do estresse financeiro, colocando a empresa na rua, encontrando empresas animadas com o produto e mostrando capacidade de execução consistente. Agora é hora de escalar”, diz de Paula.

Os R$ 290 milhões irão para contratações, desenvolvimento e expansão de funcionários atendidos. A Origin vai contratar mais 100 pessoas nos próximos seis a nove meses, com 60% desses funcionários para o escritório no Brasil.

Em produto, a fintech pretende deixar sua solução mais adaptável para a realidade de cada país atendido: enquanto dívida estudantil e hipotecas são problemas recorrentes nos Estados Unidos, boletos e crédito consignado são uma realidade para brasileiros. “Os mecanismos financeiros mudam por região, e tanto nossa análise por algoritmo quanto nossa escolha de planejadores financeiros precisam mudar”, diz de Paula.

A Origin multiplicou seu faturamento em 25 vezes nos últimos 12 meses. O objetivo da fintech é cruzar a marca de 1 milhão de funcionários atendidos com o novo investimento, sem uma estimativa exata de multiplicação do faturamento atual.

“A pandemia impactou muito nossa atuação, que fica na fronteira entre serviços financeiros e recursos humanos. As empresas perceberam que era preciso atacar a saúde mental, e que o estresse financeiro atingiu um recorde durante os últimos meses. Ficou claro que não dá para resolver um sem o outro.”

Mariana Fonseca

Subeditora do InfoMoney, escreve e edita matérias sobre empreendedorismo, gestão e inovação. Coapresentadora do podcast e dos vídeos da marca Do Zero Ao Topo.