Alexandre Ostrowieck, da Multilaser: “O empresário às vezes é parte do problema do sistema brasileiro”

Em novo livro, empresário discute os problemas que afetam as classes mais pobres do país e propõe soluções

Letícia Toledo

Alexandre Ostrowiecki, CEO da Multi, ex- Multilaser

Publicidade

SÃO PAULO – O empresário Alexandre Ostrowieck levou a empresa que preside, Multilaser, para a Bolsa em 2021 em uma oferta de R$ 1,9 bilhão. Mas esse não foi o seu único feito do ano. Quatro meses após a abertura de capital, ele lança um livro para tratar de um outro assunto: a desigualdade no país.

Em “O Moedor de Pobre”, o empreendedor — que transformou a empresa de cartuchos fundada por seu pai em um grupo que fatura R$ 3 bilhões por ano — discute os problemas que afetam as classes mais pobres do país e propõe soluções para redesenhar o Estado. Além da Multilaser (MLSA3), Ostrowieck é um dos criadores do Ranking dos Políticos, rede que monitora o desempenho e eficiência de congressistas.

“Muitas vezes o grande empresário age em prol de seu próprio bolso. É preciso mudar essa política de ‘cada um por si'”, diz Ostrowieck sobre o papel do empresário para resolver os problemas do sistema brasileiro. Confira a entrevista a seguir.

Continua depois da publicidade

Do Zero ao Topo (ZAT) –  Por que resolveu escrever o livro?

Alexandre Ostrowieck (AO) – Eu venho do meio empresarial e, como empreendedor, estou sempre exposto ao Custo Brasil. Se você quer produzir riqueza e gerar empregos no Brasil, você é atrapalhado a cada passo do caminho por um caminhão de burocracias, de regras doidas, de multas e de diversos outros problemas do Custo de Brasil. E eu sempre tive um paradigma errado de que esse caminhão de porcaria afeta os empreendedores e é muito ruim para eles. Mas, de um tempo para cá, caiu uma ficha importante para mim: a de que a verdadeira vítima desse sistema não é o empreendedor — que de uma forma ou de outra repassa seus custos —, a verdadeira vítima do sistema brasileiro são os pobres.

Daí veio o título do livro: “O Moedor de Pobres”. O Brasil como Estado — e não estou falando de nenhum partido específico — é desenhado para saquear os cidadãos comuns e irrigar o dinheiro para grupinhos privilegiados. O objetivo do livro é denunciar esse modelo e propor soluções.

ZAT – E como você chegou a essas propostas de soluções? Pode citar alguma solução que você defende no livro, por favor?

AO – Essas propostas têm basicamente dois ingredientes: a observação da realidade no Brasil e seus dados e a observação da realidade e dos dados no exterior. Sempre com uma análise da forma o mais pragmática possível. O livro tem ideias emprestadas do conservadorismo, do progressismo e do liberalismo. Coisas que funcionam em todos esses lados. Eu tenho várias ideias que eu empresto da esquerda, como, por exemplo, o imposto sobre herança e a descriminalização da maconha. Muitos conservadores ficariam de “cabelo em pé” com um livro que propõe essas ideias. Na parte mais de direita eu proponho a simplificação dos impostos e a redução da quantidade de ministérios e cargos no Governo Federal.

ZAT – Pode falar mais sobre a sua defesa de taxação de herança, por favor?

AO – Eu acho que um governo ele deve: ou ser neutro tributariamente, sem interferir na renda das pessoas, ou ele tem que ser progressista no sentido de que ele cobra mais imposto de rico e menos de pobre. O imposto para mim tem que ser o mais baixo possível, que sustente um Estado que seja bem financiado. Dado que o imposto vai ter que existir de alguma forma, é preferível que ele seja maior para as pessoas de cima e menor para as de baixo. Parece algo razoável, mas o Brasil faz exatamente o contrário: cobra mais imposto, proporcionalmente, do mais pobre e menos do rico.

E aí tem outra questão que é: o imposto sobre o consumo, que é alto no Brasil. Ele varia muito, mas em média está em 40%. O imposto sobre o consumo machuca mais o pobre e ele é desestimulado a consumir. Quanto menos ele consome, menos a indústria produz e isso gera mais desemprego. É um imposto muito nocivo e perverso. A melhor coisa que o Brasil poderia fazer pelos pobres é reduzir a carga tributária.

Dentre as opções de imposto disponíveis, o imposto sobre a herança é o que menos impacta na atividade econômica. Ninguém vai deixar de produzir, ninguém vai deixar de realizar algo na vida, porque lá na frente, depois que morrer, vai ter um imposto. É um imposto mais neutro em relação à atividade econômica. Eu também acho ele bastante justo no sentido de que, se o cara deixou um patrimônio, o herdeiro vai receber uma parte e a outra parte vai ajudar a financiar filhos de outras pessoas que não tiveram essa oportunidade. É um imposto que ajuda na equalização da sociedade.

O Imposto de Renda também é necessário, mas poderia ser da ordem de 20% e cobrado a partir de um certo patamar. Então, por exemplo, quem ganha até R$ 3.000 não paga nada. Se a renda passar disso, a pessoa paga o percentual em cima do que ultrapassou. E eu proponho o imposto negativo que é um conceito que substitui e melhora algo como o Bolsa Família. Por exemplo: se você ganha menos que R$ 3.000, ao invés de você ter que pagar esse imposto de 20%, o governo tem que te pagar o percentual sobre a diferença. Então, se você ganha, por exemplo R$ 1.000, o governo teria que te pagar 20% da diferença, ou seja, R$ 400.

O código tributário brasileiro poderia ser extremamente simples: produto é tributado em 10%, renda em 20% e herança, em 30%.

ZAT – E isso fecharia a conta de um país que precisa de tantos recursos?

AO – O Estado tem que caber dentro dessa conta, tem que enxugar um monte de coisa. Dá para fazer o básico como ter um sistema educacional legal, um bom sistema de saúde e cuidar da segurança pública. Agora, não cabe lagosta do STF, motorista oficial de senador, auxílio paletó e auxílio moradia e estatal deficitária. Nada disso cabe.

ZAT – Você mencionou que, antes, sua visão era a de que os empresários eram vítimas e agora você vê que os pobres é que são. Como ficam os grandes empresários nessa nova visão? O que eles podem e devem fazer?

AO – O grande empresário no Brasil é parte do problema, em alguns casos. Isso porque tem setores protegidos pelo Estado, que tem seus lobbies e suas formas de criar reservas de mercado. Então, muitas vezes, o grande empresário age em prol do seu próprio bolso. É preciso mudar essa política de “cada um por si“.

ZAT – E você vê o empresário brasileiro de alguma forma se movimentando para mudar que isso mude? Nessa pandemia, temas mais ligados à sociedade entraram em discussão com o crescimento das medidas ESG(com melhores práticas ambientais, sociais e de governança)…

AO – Eu não vejo o ESG resolvendo os reais problemas do Brasil. São temas importantes, não estão negando isso. Mas são diferentes do grande problema no Brasil que é a forma como o Estado brasileiro opera. Eu vejo alguns empresários se movimentando como o Salim Mattar [fundador da Localiza e ex-secretário de Desestatização do Governo Bolsonaro] que atuou no governo federal e o meu sócio Renato Feder, que foi para a secretaria educação do Paraná. Mas ainda é uma minoria.

ZAT – E você acha que, para ter mudanças, o empresário precisa atuar em cargos públicos?

AO – O empresário tem que se engajar mais com a política econômica. Se a agenda da elite financeira é “salve-se quem puder” e o país não vai pra frente. Você precisa ter uma elite política dizendo: “olha, eu quero um país sem miséria. Eu vou para a linha de frente. Eu vou apoiar políticos que pensem de acordo com essa agenda”. Não é necessário que o empresariado vá para a política,.

ZAT – Você mencionou que outro ponto defendido em seu livro é a descriminalização da maconha. Por que essa defesa?

AO – O que eu vejo é que essa questão tem muita demagogia, muita cortina de fumaça. De modo geral as drogas são um enorme problema de saúde pública. Você pode pegar esse problema e tratar como saúde pública ou você pode aumentar o problema e transformá-lo também em uma questão de segurança pública. Quando o Estado coloca a polícia, o recurso público, para impedir o “sujeito a”de vender e o “sujeito b” de comprar, a única coisa que consegue na prática é aumentar o preço da droga. Então, por uma questão pragmática, eu acredito que o Estado não deveria impedir ninguém de comprar ou vender. É mais pragmático e mais sábio um país que explica das consequências e não impede uma pessoa de consumir.

Pablo Spyer, o Tourinho de Ouro, revela 5 investimentos para ganhar dinheiro com a inflação

Letícia Toledo

Repórter especial do InfoMoney, cobre grandes empresas de capital aberto e fechado. É apresentadora e roteirista do podcast Do Zero ao Topo.