Política monetária: por que um ajuste rápido é recomendável

A prescrição correta de política monetária, nas atuais circunstâncias, seria a de levar a taxa Selic imediatamente para 4%, ou, numa opção mais conservadora e igualmente aceitável, fazê-lo em duas etapas de 100 BP cada uma

Pedro Jobim

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Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

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Na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) da próxima semana, o Banco Central (BC) iniciará um processo de elevação da taxa de juros, que atualmente está em 2%.

A grande maioria dos analistas aposta numa elevação de 50 BP, embora reconheça que o BC devesse iniciar o ciclo num ritmo mais intenso, como 75 BP.

O mercado futuro de juros reflete essa dicotomia, e aponta probabilidades similares de alta de 50 ou 75 BP nas próximas três reuniões que decidirão a taxa de juros.

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O quadro econômico aponta para inflação acima do nível das metas no horizonte relevante da política monetária, que hoje consiste nos anos de 2021 e 2022.

As pressões sobre a inflação são de diversas naturezas, sendo as principais: o disparo do programa de auxílio emergencial superdimensionado – que elevou os gastos das famílias com bens a patamares muito acima do esperado; a elevação global dos preços das commodities em USD, em consequência dos massivos programas de estímulo fiscal em curso, na maior parte das economias; e o mau desempenho do Real, a moeda que mais se depreciou no mundo, nos últimos trimestres.

Como consequência desses fatores, os núcleos de inflação se elevaram e atualmente giram no patamar de 5%, em média.

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As expectativas de inflação medidas pela mediana Focus ainda se situam em 4,0% e 3,5% para 2021 e 2022, respectivamente, mas devem sofrer forte elevação à frente, dadas as surpresas recentes no IPCA e na dinâmica da taxa de câmbio nas últimas semanas.

Nossas próprias projeções de inflação são de 5,5% para 2021 – acima do teto de 5,25%, e de 4% para 2022.

A depreciação da taxa de câmbio tem sido importante fator de pressão sobre a inflação.

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Se, por um lado, parte desse comportamento pode ser explicado pelo regime de risco fiscal quase permanente a que a economia brasileira tem sido submetida, por outro, a manutenção do nível de taxa de juros em patamar incompatível com as diversas vulnerabilidades do país, em um cenário de aceleração global da inflação, também explica parte importante dessa dinâmica.

O quadro da epidemia no Brasil sugere agravamento das condições sanitárias nas próximas semanas, com consequente aumento da incerteza quanto à atividade no curtíssimo prazo. No entanto, a aceleração no ritmo de vacinação à frente é uma realidade palpável.

Apesar de todas as decisões equivocadas na gestão da pandemia, por parte das autoridades, não há motivo para que o Brasil não experimente, a partir de meados do segundo trimestre, quando a maior parte da população de risco estiver imunizada, o mesmo processo de reabertura vivido atualmente pelas economias do hemisfério norte.

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Esse cenário sugere aceleração no mercado de trabalho e nas pressões inflacionárias no setor de serviços num futuro breve.

Em outra frente, e a despeito do importante avanço representado pela aprovação da PEC do marco fiscal, os diversos eventos dos últimos dias mostraram que a incerteza macroeconômica no Brasil permanece enorme, seja no que se refere à condução de políticas correntes de preços administrados, seja quanto à futuras políticas econômicas de forma mais geral, dentro ou para além do atual quadriênio.

É evidente que toda essa incerteza age na direção do aumento das expectativas futuras de inflação.

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Nesse ambiente adverso, em que o teto da meta de inflação de 2021 já se encontra virtualmente rompido, cabe ao Banco Central esforçar-se para que a meta de 2022 seja cumprida.

Ante o exposto, um cenário no qual a taxa de juros desejada fosse inferior a 4% nas próximas semanas nos parece implausível.

Dessa forma, a prescrição correta de política monetária, nas atuais circunstâncias, seria a de levar a taxa Selic imediatamente para este nível, ou, numa opção mais conservadora e igualmente aceitável, fazê-lo em duas etapas de 100 BP cada uma.

Repetimos, aqui, uma sugestão ao Banco Central feita em março de 2020 neste artigo.

Nas atuais circunstâncias, em que existem grandes dificuldades até mesmo na mensuração de variáveis usualmente tidas como observáveis – por exemplo, as informações da PNAD e do Caged apontam para leituras completamente distintas do mercado de trabalho –, nos parece um equívoco dar peso significativo, no processo de calibragem da política monetária, a conceitos e variáveis não observáveis, como hiato do produto e taxa neutra de juros.

Numa situação em que a desorganização da economia e o escape da inflação para além das metas permanecerão por um bom tempo como possibilidades reais, os canais das expectativas e da taxa de câmbio são, de longe, os mais importantes mecanismos de transmissão da política monetária.

O BC precisa fazer sua parte e contribuir para diminuir a probabilidade de voltarmos ao regime de desorganização (vigente, pela última vez, entre 2014 e 2016), elevando rapidamente a Selic para 4% e, uma vez estabelecidas condições monetárias mais adequadas à realidade de nossa economia, dar continuidade ao processo de ajuste de juros num ritmo possivelmente mais moderado.

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Pedro Jobim

É sócio-fundador da Legacy Capital. Atua no mercado financeiro desde 2002, tendo sido economista-chefe do banco Itau BBA e da tesouraria do banco Santander. É engenheiro mecânico-aeronáutico formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), mestre em economia pela PUC-Rio e Ph.D em economia pela Universidade de Chicago.