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Você é cliente ou dono de uma empresa? Ou as duas coisas?

As estruturas de governança autônomas e descentralizadas (DAOs) podem ter um impacto imenso nas empresas. O mundo binário que divide capital e trabalho, ou patrão e funcionário, está ultrapassado
Por  Gustavo Cunha -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

De todas as experiências que estão acontecendo em DEFI (finanças descentralizadas), talvez a que mais vá impactar o mundo é migração de modelos de governança centralizados, com a relação dono-empregado bem explícita, para um modelo autogerido, de características meritocráticas e que estimula a colaboração e participação.

Algumas empresas já têm testado isso no ambiente de DEFI. Em geral, elas são criadas por um programador, ou um grupo deles. As decisões iniciais e os modelos de negócio são baseados em suas experiências e na resolução de um problema real que eles têm.

Outros são visionários e têm uma compreensão do funcionamento do mercado financeiro que se assemelha à dos grandes líderes das Big five de tecnologia.

Independentemente da origem dessas empresas, elas nascem com um objetivo claro de transferência de governança para os usuários e colaboradores. Mas por que isso é importante?

Em primeiro lugar, porque, por serem plataformas abertas (qualquer um pode ir lá copiar tudo, mudar algumas linhas e lançar um produto teoricamente melhor), elas têm a necessidade de promover o engajamento das pessoas em dois níveis: do colaborador-trabalhador e no do colaborador-usuário.

O colaborador-trabalhador é o usuário que está lá usando a plataforma, testando o código, sugerindo melhorias, apontando pontos de falha e tudo mais que um “funcionário” estaria pronto a fazer.

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Mas essa pessoa não é um funcionário. Ela, muitas vezes, faz isso sem nenhuma compensação financeira.

Mas, se ela não faz isso por dinheiro, por que faria? Reconhecimento da comunidade, prazer por fazer algo maior e ter seu nome escrito/reconhecido em algumas das linhas do código da plataforma são algumas das razões.

Assim, a comunidade e a capacidade dela de ter voz nas decisões, entre outros aspectos, são muito importantes.

Do ponto de vista do criador dessa plataforma, nada mais lógico que ir passando um pedaço dessa governança para ele, à medida que ele se envolva com a plataforma.

De tal forma que, no extremo, se for tomando as decisões certas, ele terá a possibilidade de influenciar muito a direção da plataforma.

Por outro lado, temos os colaboradores-usuários. Gente que usa a plataforma pela sua funcionalidade. Sua participação é essencial, pois ela vai dar corpo para que a plataforma cresça e seja importante no longo prazo.

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Do ponto de vista do criador da plataforma, esse usuário é muito importante. Não preciso me estender muito aqui. Afinal, sem clientes, não há negócio.

Ao passar um pedaço da governança para esse usuário, o que está sendo feito é dar voz para ele influenciar a solução que ele já usa e de que gosta.

O que está no cerne da questão é como obter o engajamento dos “funcionários” e “clientes” de forma organizada, meritocrática, autogerenciável e sustentável no longo prazo.

É isso que está sendo testado nessas formas de organização que estão sendo colocadas dentro do guarda-chuva das DAOs (descentralized authonomous organizations) – organizações descentralizadas e com governança autônoma.

Para exemplificar como isso tem sido feito, nada melhor que entrar em um caso prático. Na semana passada, uma das principais plataformas de DEFI, a UNISWAP, resolveu distribuir sua governança entre seus usuários.

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Para se ter uma ideia da magnitude dessa decisão, após a emissão do seu token de governança (UNI), já é possível calcular o valor de mercado dessa empresa. Quando escrevo esse texto, ele já passa dos US$ 2 bilhões, considerando o total de tokens emitidos.

O primeiro passo dessa transferência de governança é a definição do total de tokens que seriam emitidos (1 bilhão), seguido da maneira como esses tokens seriam distribuídos: 40% do total foi distribuído entre o time, investidores e consultores que estão lá desde o início; e os demais 60% foi separado para a comunidade de usuários.

Desses 60%, 15% foi distribuído entre os usuários que já tiveram alguma interação com a plataforma e o restante será distribuído ao longo dos próximos anos por uma regra previamente definida.

Se você, como eu, está entre os usuários que interagiram com a plataforma nos últimos meses, você foi contemplado com ao menos 400 UNIs, que hoje valem perto de US$ 1.500, e terá o poder de influenciar as votações sobre a estratégia da plataforma nos próximos anos.

Ou você também pode tomar a decisão de vender esses tokens e embolsar esse valor. A decisão é toda sua.

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Uma curiosidade é que a distribuição desses tokens foi muito comparada com uma renda mínima, um tema econômico muito quente por conta das iniciativas dos governos (os R$ 600 do Brasil entram aqui), porque foi muito próxima do valor do incentivo da pandemia aplicado nos EUA.

Essa distribuição, para os que têm a cabeça mais tradicional, é vista como uma loucura completa. Um garoto que cria uma empresa que vale bilhões começa a dar “ações” dessa empresa para os seus clientes.

Fazendo um paralelo, é como se, quanto mais usássemos o Google ou o Facebook, mais ações deles ganharíamos e mais conseguiríamos influenciar suas decisões e seu futuro.

Mas, se abrirmos um pouco mais a cabeça, esse mundo binário que divide capital e trabalho, patrão e funcionário, dono e empregado está ultrapassado.

A geração que está entrando no mercado de trabalho hoje tem na sua essência conceitos de colaboração, empreendedorismo, participação, flexibilidade, comunidade e outros que não se encaixam nesse formato.

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Uma questão ainda em aberto para mim é o valor dessa governança. Em alguns pontos, esses tokens parecem ações de empresas, em outros, um prêmio para incentivar usuários a utilizar as plataformas.

Talvez seja melhor não colocar isso nas caixinhas fechadas que conhecemos hoje e tentar ver de uma forma mais ampla.

Outro ponto de discussão constante é o papel da regulação nesse ambiente, principalmente porque esses tokens de governança começam cada vez mais a se aproximar de valores mobiliários.

Como são ativos que estão na rede da Ethereum, eles transcendem os limites geográficos das legislações.

Tecnologia não está restrita a área geográfica faz tempo e, cada vez mais, ela entra no mercado financeiro. Tenho bastante dificuldade em ver como essas regulações deixarão de ser ligadas a áreas geográficas.

Sendo esse o meu terceiro texto aqui sobre assuntos relacionados a iniciativas de DEFI, acho que já está claro o quanto tenho aprendido e me surpreendido com essas iniciativas, ou experiências, que estão tocando em pontos importantes, não somente do mercado financeiro, mas de como as empresas serão no futuro.

Gostou? Algum ponto que não considerei? Me diga o que achou. 

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Gustavo Cunha Autor do livro A tokenização do Dinheiro, fundador da Fintrender.com, profissional com mais de 20 anos de atuação no mercado financeiro tradicional, tendo sido diretor do Rabobank no Brasil e mais de oito anos de atuação em inovação (majoritariamente cripto e blockchain)

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