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O que não ensinam em Hogwarts

A redução dos juros ajuda a conter a dívida, mas não é suficiente: o desempenho fiscal esperado sugere que ela continuará crescendo na ausência de novas reformas que permitam reduzir os gastos obrigatórios
Por  Alexandre Schwartsman -
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SÃO PAULO – A inflação baixa possibilita ao Banco Central testar novos limites para a taxa de juros, processo que ainda não se encerrou. A Selic se encontra em 5,5% e, segundo o Boletim Focus, deve fechar o ano em 4,75%, permanecendo neste nível até o final de 2020. Apenas em 2022 a Selic atingiria 7% e lá ficaria.

Essa visão é compartilhada pelo mercado de renda fixa, que expressa as projeções de quem põe dinheiro a risco.

A partir dos números publicados pela Anbima, é possível inferir que o mercado antecipa a taxa de juros ao redor de 4,75% ao ano para os próximos 12 meses, subindo para a vizinhança de 7-7,5% ao ano entre o final de 2021 e o final de 2022. Há seis meses, esse mesmo mercado projetava a manutenção dos juros em 6,5% ao ano até meados de 2020, elevando-se para 9-9,5% ao ano ao longo de 2022.

Uma mudança dessa magnitude reduz a pressão de aumento sobre a relação dívida-PIB, principal medida de solvência do setor público.

Essa razão é influenciada pelas taxas reais de juros (isto é, o excesso de taxa de juros sobre a inflação) e pelo crescimento do PIB. Juros superiores à inflação aumentam o numerador da fração, enquanto o crescimento do produto eleva seu denominador, reduzindo, portanto, a fração.

É possível mostrar que a estabilização da relação dívida-PIB requer um resultado primário (antes do pagamento de juros) aproximadamente igual à diferença entre a taxa real de juros e o crescimento do PIB. Considere, por exemplo, um país cuja relação dívida-PIB seja 80% e que pague uma taxa real de juros de, digamos, 4% ao ano. A cada ano, portanto, o juro real acrescenta 3,2% do PIB à dívida (0,04 x 0,80).

Caso este país cresça 1% ao ano, o aumento da economia tira 0,8% do PIB da dívida a cada ano (0,01 x 0,80), de modo que o resultado líquido da interação entre juro real e crescimento do PIB eleva a dívida ao ritmo de 2,4% do PIB por ano (3,2% – 0,8%). Para impedir que isto aconteça, o governo tem que produzir um superávit primário no mesmo montante, isto é, 2,4% do PIB, neutralizando o efeito da combinação juro-crescimento.

No caso do Brasil hoje, a dívida se encontra próxima a 80% do PIB, enquanto a Selic, como visto, deve ficar em 4,75%, contra a inflação na casa de 3,80%, ou seja, uma taxa real de juros de 0,9%. Assim, o efeito do juro real faria a dívida crescer pouco mais de 0,7% do PIB (0,009 * 0,80) no ano que vem.

Todavia, se o PIB crescer conforme o esperado, 2%, o impacto reduziria a dívida em valor equivalente a 1,6% do PIB (0,02 x 0,80). Neste caso, mesmo um déficit primário até 0,9% do PIB (0,7 – 1,6) bastaria para estabilizar a dívida.

Laura Carvalho fez uma conta semelhante, mas supondo crescimento do PIB de 1,2%, e concluiu que um superávit primário de 0,2% do PIB seria suficiente, o que, segundo ela, já seria obtido com “a reforma da Previdência e a eliminação de subsídios, desonerações e supersalários”. Sugere, assim, que reformas adicionais dos outros gastos obrigatórios seriam, portanto, desnecessárias.

Há, para começar, um erro de conta que revela a pouca intimidade com o tema.

Caso o crescimento seja 1,2%, seu impacto reduziria a dívida em pouco menos de 1% do PIB (0,012 x 0,80), enquanto a taxa de juros elevaria a relação em 0,7% do PIB. Isto significa que mesmo um déficit do 0,2% do PIB seria suficiente para manter a dívida na casa de 80% do PIB, no ano que vem. O erro mais grave, contudo, não é este.

Ocorre que o orçamento de 2020 projeta déficit primário de 1,6% do PIB, bem maior do que o valor consistente com a estabilidade da dívida. Assim, mesmo com a taxa de juros bem mais baixa, o fraco resultado primário não evitará que a dívida suba em 2020, elevando o sarrafo fiscal para os anos seguintes.

Aliás, como previsto pela Lei de Diretrizes Orçamentárias publicada em abril, os resultados primários em 2021 (-0,8% do PIB) e 2022 (-0,3% do PIB) também não seriam suficientes para impedir o crescimento da dívida naqueles anos, mesmo se a taxa de juros não subisse.

No entanto, como mencionado no começo do artigo, a Selic deverá subir para perto de 7% em 2021, contra uma meta de inflação de 3,75%, ou seja, a taxa real de juros atingiria um pouco mais de 3% ao ano.

Caso o crescimento da economia fique ao redor de 2% ao ano, o governo teria que gerar um superávit primário de 0,6% do PIB em 2022, também acima do projetado pela LDO. Mesmo se o crescimento médio fosse mais alto, 2,5-3,0%, a trajetória de resultados primários previstos na LDO ficaria aquém do requerido para estabilizar a dívida.

Apesar, portanto, da queda da taxa real de juros em comparação ao esperado meses atrás, o desempenho fiscal projetado – sob a hipótese de manutenção do teto de gastos – ainda não bastará para estabilizar a relação dívida-PIB nos próximos três anos pelo menos.

Engana-se quem acha que a reforma da Previdência (e a eliminação de “supersalários”) resolveria o problema. Seu impacto apenas alinha o crescimento das despesas previdenciárias ao ritmo de expansão do produto, permitindo que o governo federal mantenha os chamados gastos discricionários em nível maior do que seria possível sem a reforma.

Sem reformas adicionais, o gasto federal seguiria determinado pela regra do teto, definindo a trajetória de resultados primários expressa na LDO, insuficiente, como vimos, para estancar o crescimento da relação dívida-PIB. Ou seja, neste caso a dívida seguiria uma trajetória crescente e insustentável.

Não há mágica que faça o Brasil escapar de um sério encontro com sua realidade orçamentária nos próximos anos.

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Alexandre Schwartsman Alexandre Schwartsman foi diretor de assuntos internacionais do Banco Central e economista-chefe dos bancos ABN Amro e Santander. Hoje, comanda a consultoria econômica Schwartsman & Associados. Formou-se em administração pela Fundação Getulio Vargas, fez mestrado em economia na Universidade de São Paulo e doutorado em economia na Universidade da Califórnia em Berkeley.

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