Cielo tem “lua de mel” com mercado em 2019, mas investidor deve segurar entusiasmo

A ação parece ressurgir das cinzas com alta acumulada de cerca de 25% nos primeiros sete pregões do ano

Weruska Goeking

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SÃO PAULO – A Cielo (CIEL3) viveu uma espécie de “inferno astral” na bolsa em 2018 e viu sua ação despencar 58,15%, o maior tombo entre os ativos do Ibovespa. A empresa lidera o setor de maquininhas e processamento de operações com cartões, mas perdeu de participação no mercado para novos concorrentes. Na tentativa de voltar a ganhar mercado, passou a praticar uma agressiva política de preços,e assim sacrificou margens.

Em uma olhada rápida no Ibovespa neste ano, a Cielo parece ressurgir das cinzas como a segunda melhor ação do índice com alta acumulada de cerca de 25% nos primeiros sete pregões do ano. Será que a sorte mudou de mão? O tombo de mais de 3% no pregão desta sexta-feira (11) indica que não houve melhora “da noite para o dia” nos fundamentos da empresa. Mas o que justifica ganhos tão significativos em um curto período?

Short squeeze?
Alguns analistas viram chances de que o movimento de forte alta tenha sido causado por um fenômeno chamado short squeeze, que na tradução livre seria um “sufocamento dos vendidos”. Mas o que é isso? Digamos que um investidor queira montar uma operação apostando na queda do preço de determinada ação. Para isso, ele pode fazer uma venda a descoberto ou uma venda a seco.

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Quando esse investidor monta uma posição “short” (vendida), ele depende da oferta destas ações no banco de aluguel – o BTC. Caso não tenha disponibilidade de muitos ativos para cobrirem as posições vendidas, os “shorters” acabam correndo para zerarem suas operações – que no caso seria comprar estes papéis -, provocando uma forte pressão compradora. 

Geralmente um “short squeeze” ocorre quando a quantidade de ações alugadas de uma empresa está próxima do limite estipulado pela B3, que mantém como regra inicial um total de 20% das ações em circulação no mercado como teto inicial para o máximo de ações “shorteadas”.

No entanto, a Cielo passa longe de um short squeeze neste começo de ano. O aluguel de suas ações atingiu seu ponto máximo em maio do ano passado e vinha desacelerando desde então. A quantidade de aluguel voltou a subir, mas ainda está longe do teto. Do outro lado, há muitos doadores (quem tem a ação e aluga) no mercado. 

Hora de comprar?
A avaliação ainda é de que o movimento de alta tenha sido apenas técnico, com investidores “indo atrás de ações que ficaram para trás” na retomada do Ibovespa no ano passado. Para o mercado como um todo, o otimismo é generalizado e há quem veja o índice da B3 superando os 100 mil pontos em breve.

Mas isso não significa que o acionista de Cielo fez exatamente um bom negócio. O time de análise do Santander é enfático ao recomendar que investidores “segurem seu entusiasmo” com a Cielo.

Os analistas veem a ação da Cielo como a mais barata em relação a seus pares, como a PagSeguro e a Stone. No entanto, eles alertam para “uma erosão contínua do modelo de negócios da Cielo”. Parte disso, dizem os analistas, é decorrente da falta de capacidade de usar a estrutura de bancos que alguns de seus concorrentes têm acesso. 

A empresa ainda lidera o setor de maquininhas e processamento de operações com cartões, mas sofre com a perda de participação de mercado para novos concorrentes. A participação de mercado da Cielo já caiu cerca de 12 pontos percentuais nos últimos seis anos, desde o pico de 56,5% no segundo trimestre de 2012.

Nova regulação = mais riscos
Vale destacar ainda que o CMN (Conselho Monetário Nacional) anunciou em 19 de dezembro a regulação do uso de recebíveis como colateral de crédito. Todas as adquirentes obrigatoriamente terão de seguir as novas definições, que, entre outras novidades, impedem uso excessivo de colateral.

A partir de 31 de janeiro, quando entra em vigor a resolução, o saldo dos recebíveis antecipados necessariamente será depositado em uma conta no domicilio bancário, e o banco terá dois dias uteis para decidir se repassa ao lojista ou se vai exercer o colateral.

As regras novas abrem espaço para mais concorrência, já que os lojistas deixarão de ser obrigados a fazer operações que antecipam o recebimento do dinheiro de vendas por cartões de crédito com uma única instituição financeira. Essa exclusividade antes era conhecida como “trava bancária”.

Na época do anúncio os analistas do Credit Suisse já avisaram que empresas como Cielo (CIEL3), Stone e Pagseguro tinham mais a perder que a ganhar com estas novidades.

“Acreditamos que o varejista não terá incentivo [para antecipar recebíveis], dada a transferência do saldo ao domicilio bancário”, escreveram os especialistas no setor em relatório. O Bradesco BBI estimou uma queda brusca no yield da empresa com retomada apenas no quarto trimestre deste ano. 

Para o Santander, a ação ainda não absorveu todas as pressões negativas no entorno da empresa e, neste cenário, tudo indica que a lua de mel da Cielo com os investidores tende a durar pouco.