Empresa é condenada a indenizar trabalhadora obrigada a rezar o ‘Pai-Nosso’

Vítima relatou discriminação religiosa e por gravidez, agressão física e até intimidação; processo já está em fase de execução

Equipe InfoMoney

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A Justiça do Trabalho de Minas Gerais condenou uma empresa de Belo Horizonte a pagar R$ 10 mil de indenização a uma ex-empregada que relatou diversas circunstâncias de assédio moral no trabalho e que era obrigada a rezar o “Pai Nosso” antes da jornada.

A decisão da 11ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-MG) manteve sem divergência a sentença da 16ª Vara do Trabalho da capital mineira. O processo já está em fase de execução.

Entre as situações relatadas pela vítima estavam discriminação religiosa, agressão física, discriminação por gravidez, exposição de lista de atrasos e faltas e intimidação para dificultar o ajuizamento de ação trabalhista contra a empresa (veja mais abaixo).

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Duas empresas que atuam no ramo atacadista de produtos para saúde foram processadas na ação (elas fazem parte do mesmo grupo econômico e foram condenadas solidariamente). Ambas negaram os fatos e disseram que a profissional tentou a todo custo ser dispensada sem motivo, para receber um valor alto de indenização.

“A empresa sempre foi extremamente tolerante com os erros e abusos cometidos, solidarizando-se com os problemas de saúde que a ex-empregada vinha sofrendo somados à gravidez”, afirmou a defesa. “Como a estratégia ardilosa da trabalhadora não se concretizou, ela resolveu pedir demissão, pois já não queria mais trabalhar”.

As acusações da ex-funcionária

A ex-empregada contou no processo que os problemas pioraram nos últimos 2 anos do emprego, quando a relação de trabalho tornou-se insuportável, pois passou a sofrer constante assédio moral da diretora da empresa.

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Disse também que não é adepta a nenhuma religião, mas todos os empregados eram obrigados a rezar antes de começar a jornada. “Acontecia que, antes de iniciar o dia de trabalho, a diretora reunia os colaboradores e os obrigavam a participar de um momento chamado ‘Reza do Pai-Nosso’.”

A trabalhadora afirmou ainda que se sentia constrangida em professar uma fé na qual não acreditava — e que inclusive chegou atrasada à empresa para evitar a “Reza do Pai-Nosso” —, mas era alvo de xingamentos da diretora, que ameaçava diminuir o valor da sua comissão.

A vítima alegou também que, desde o momento em que comunicou estar grávida, começou a sofrer mais perseguições. A gestação foi de alto risco, e a diretora a assediava, com xingamentos e gritos, sempre que ela entregava um atestado médico. Em uma ocasião, a chefe chegou a dizer que “gravidez não é doença”.

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Ela relatou ainda uma agressão física da diretora, que também expunha os empregados que chegavam atrasados. “A atitude era de envergonhar, constranger e humilhar os empregados diante de todos da empresa”.

Áudio e testemunha como provas

Os magistrados da 11ª Turma do TRT-MG deram razão à trabalhadora. A relatora do processo, Juliana Vignoli Cordeiro, afirmou que um áudio juntado à ação mostra a repreensão sofrida pela funcionária pela ausência em um treinamento.

Em um trecho é possível ouvir a chefe dizer as frases: “depois que você ficou grávida, você ficou desinteressada com o negócio da empresa”, “gravidez não é doença para ninguém” e “não acha que gravidez é seu meio de vida”.

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Cordeiro também afirmou que o áudio mostra que a diretora intimidava os empregados, fazendo alertas sobre supostas “desvantagens do ajuizamento de ações contra a empresa”. “Verifica-se que, na reunião dos empregados, a representante da empresa destacava que aqueles que ajuízam ação estão saindo devendo”.

Liberdade de crença

A magistrada destacou o depoimento de uma testemunha, que apontou a ocorrência de todas as denúncias (inclusive a obrigatoriedade de participação na oração). Por isso, entendeu que a trabalhadora conseguiu provar as circunstâncias de assédio narradas, tendo em vista o conjunto de provas produzidas.

Cordeiro afirmou que a Constituição é expressa ao garantir que a liberdade de consciência e de crença é inviolável, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos. “A liberdade religiosa deve ser respeitada, devendo ser considerada a opção do trabalhador de cultuar e também de ser ateu ou agnóstico, não podendo a religião servir como instrumento de opressão a ser usado pelo empregador”.

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(Com informações do TRT-MG)