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A Sabesp vai ao mercado de capitais em breve — mas ainda não será a privatização

Empresa estuda emissão de títulos de dívida “verdes” em 2024, em uma sinalização a fundos focados em ESG

Rikardy Tooge Lucinda Pinto

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Prestes a completar seu terceiro trimestre no comando da maior empresa de saneamento da América Latina, André Salcedo tem o propósito firme de deixar a Sabesp preparada para a privatização — e mostrar que ainda há upside para a ação, mesmo que o mercado já tenha antecipado o efeito positivo desse movimento. Diante da intenção do governo de São Paulo, atual controlador da companhia, de passar o comando para a iniciativa privada antes das eleições municipais de outubro de 2024, o executivo opera em diversas frentes para enxugar despesas e identificar outras fontes de receita. E estreita a interlocução com grandes investidores brasileiros e estrangeiros com potencial para participar de uma das ofertas de ações mais aguardadas pelo mercado.

Nas conversas com os investidores, o CEO da Sabesp costuma destacar a essência sustentável da empresa, discurso que vai ao encontro do anseio de grandes fundos que têm seus mandatos cada vez mais focados na pauta ESG. “Nós somos um exemplo de economia circular e de empresa verticalizada. Eu capto a água dos mananciais, que eu preciso protegê-los, levo essa água ao consumidor e faço o tratamento para devolvê-la à natureza”, exemplifica Salcedo, em conversa com o IM Business.

Para firmar essa marca ESG junto ao mercado — e também reforçar o caixa — a companhia planeja uma incursão no mercado local de dívidas no ano que vem. “Estamos pensando em algum tipo de captação, seja por meio de debêntures ‘verdes’ ou financiamentos atrelados a metas ambientais [sustainability linked loans]”, explica Salcedo. A empresa chegou a planejar uma emissão de dívida no início do ano, mas acabou adiando por causa do fechamento do mercado. Para a próxima captação, não há ainda um valor definido, mas a ideia é que a operação dê mais visibilidade à empresa junto a investidores, especialmente os globais, antes da privatização.

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Para este ano, o CEO diz que o funding já está contemplado após a Sabesp fechar uma operação também com características “verdes” de R$ 1 bilhão com a IFC (International Finance Corporation), instituição do Grupo Banco Mundial. Outro financiamento, de R$ 470 milhões com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ajudou a completar o caixa.

Novos serviços e corte de custos

André Salcedo quer mostrar também ao mercado que a Sabesp está estruturada para a dinâmica do setor privado. Novas diretorias foram criadas, a gestão operacional unificada e o corpo de funcionários foi enxugado. Uma demonstração desta nova fase foi a conclusão de um programa de demissão voluntária de 1.862 funcionários, significando uma redução de quase 15% nas despesas com salários, que atualmente beira a casa dos R$ 3 bilhões — a saída dos profissionais que aderiram ao PDV deverá ocorrer até junho do ano que vem. A geração própria de energia, por meio da construção de usinas solares, também é outro projeto em curso.

A despeito dos ajustes, Salcedo reconhece que há alguns pontos de questionamento por parte do mercado em relação à Sabesp. Uma delas é o nível de perda de água na operação, em torno de 27%. Existe um esforço para reduzir esse nível, mas o executivo pondera que se trata de um dos menores percentuais do país: em outras regiões, diz ele, que as perdas chegam a superar os 40%. “Nosso nível está dentro do combinado nos contratos com os municípios, mas nós não estamos satisfeitos. Nosso objetivo é atuar para evitar as perdas comerciais, seja aumentando nossa base de clientes ou encontrando formas de evitar a inadimplência”, explica.

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Outro aspecto pós-privatização tem a ver com a capacidade de ampliação da receita, em um cenário em que a empresa deverá encontrar meios de elevar investimento e também reduzir a tarifa ao consumidor final. Para fazer frente a esse desafio, foi criada no primeiro semestre deste ano uma diretoria de novos negócios, dedicada a buscar serviços que possam trazer faturamento extra à companhia.

A ideia é aproveitar a base de dados de que a companhia dispõe para estruturar uma visão mais próxima desses consumidores e identificar pontos a serem explorados, desde o atendimento até o faturamento. “Estamos estudando a oferta de produtos que podem ou não estar associados ao saneamento. Pode ser uma limpeza de caixa d’água, um bombeiro hidráulico. São coisas que podemos oferecer para nossa extensa base de clientes [cerca de 28 milhões] que hoje não oferecemos”.

No core business, André Salcedo diz que a companhia também avalia participar dos leilões de água e esgoto de outros municípios paulistas – Marília, Ourinhos, Bauru e Brodowski estão no radar para ampliar a lista de 376 cidades já atendidas pela Sabesp.

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André Salcedo, CEO da Sabesp: executivo prepara empresa para nova fase (Divulgação)

Vista como uma das principais operações do próximo ano, a privatização da Sabesp ocorrerá por uma oferta subsequente de ações (“follow-on”), em que o governo de São Paulo venderá boa parte de sua posição de 50,3% na companhia de saneamento – o percentual ainda não foi definido. O avanço da operação depende, além do convencimento do mercado, da sua aprovação pela Assembleia Legislativa de São Paulo e concordância de todos os municípios atendidos pela Sabesp – desafios que já travaram a privatização da empresa outras vezes. Para Salcedo, desta vez será diferente: “O governador Tarcísio [de Freitas] está muito empenhado no projeto, ele tem a sensibilidade de entender a importância deste tema.”

A Sabesp deve iniciar seu road show junto aos investidores já no início do ano que vem, com o objetivo de atrair para o ‘book‘ investidores de peso para o negócio. “O [próximo] investidor de referência tem que ser de longo prazo, que entenda como funciona o mercado de infraestrutura e a dinâmica regulatória brasileira”, avalia Salcedo. “É um ativo que trará remuneração ao longo dos anos, eventualmente décadas, então tem que ser um investidor que queira participar desse processo [de crescimento].”

Com um valor de mercado estimado em R$ 41,6 bilhões na Bolsa, a Sabesp vem sendo negociada a múltiplos menores que outros pares, na avaliação da gestora Miles. Em relatório publicado recentemente, a casa aponta que, considerando um cenário sem privatização e restrição de investimentos, a ação teria um valor-justo de R$ 85, ante os atuais R$ 60 na tela. Caso a privatização avance, o potencial de upside é ainda maior: com preço-alvo para o papel em R$ 140.

Rikardy Tooge

Repórter de Negócios do InfoMoney, já passou por g1, Valor Econômico e Exame. Jornalista com pós-graduação em Ciência Política (FESPSP) e extensão em Economia (FAAP). Para sugestões e dicas: rikardy.tooge@infomoney.com.br