Risco político chega em Vale e Bradespar: boa hora para entender a relação entre holding e controlada

Desconto da Bradespar em relação à Vale vem diminuindo, e melhora do cenário político é apontada como uma das causas para tanto

Thiago Salomão

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SÃO PAULO – Você já deve ter percebido que há três ações no Ibovespa que podem ser olhadas para acompanhar a Vale: as ações ON (VALE3), as PNA (VALE5) e também as da Bradespar (BRAP4). Isso por que a última é holding de investimentos que detém quase todo o seu capital aplicado indiretamente na Vale. Por ser um veículo que investe na Vale, as ações da Bradespar são precificadas com base no valuation da mineradora, porém com um “desconto” extra por ser holding. É justamente a distorção desse desconto que tem chamado a atenção de muitos investidores.

Para entender a relação do valuation entre a holding e empresa: o desconto em uma holding clássica ocorre pelo fato de não ser exatamente o portfólio em que o investidor alocaria o seu capital – no caso da Bradespar, a participação é majoritariamente em Vale, mas ela também possui uma pequena fatia na CPFL Energia (CPFE3) – você pode ver mais detalhes sobre a participação da Bradespar no site de RI dela. Além disso, a holding, tem custos administrativos e financeiros para manter a sua gestão, o que também causa a diferenciação. A holding ainda possui uma dívida – na maioria das vezes justamente para a aquisição da participação que ela detém na subsidiária. Outra questão que afeta o desconto de uma holding é o dividendo (que é basicamente o rendimento dela), assim como a liquidez de suas ações na Bolsa, que costumam ser menores do que de seus controlados. Por fim, outra questão refere-se sobre a influência do investidor quanto às decisões futuras por parte do controlador (a holding) – este caso é bem emblemático para a Bradespar, como veremos mais adiante. 

Um dos métodos para calcular o valuation de uma empresa e descobrir quanto vale uma ação consiste em trazer para o “presente” o fluxo de caixa esperado no futuro, aplicando-se uma taxa de desconto nestes fluxos – o valor de algo no futuro não é o mesmo do que no presente. No caso da holding, o valuation é calculado somado o VPL (valor presente líquido ou NAV na sigla em inglês) dos ativos que ela possui, com todos os descontos realizados pelos motivos citados acima – custos da holding, liquidez, entre outros. Vale destacar que, na Bovespa, há outras duas holdings: a Metalúrgica Gerdau (GOAU4), que investe principalmente em Gerdau (GGBR4) e a Itaúsa (ITSA4), mais diversificada, que detém participações em várias companhias, como Itaú Unibanco (ITUB4), Duratex (DTEX3), Itautec (ITEC3) e Elekeiroz (ELEK4), as últimas três do setor industrial. 

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Como já destacado, a Bradespar é uma holding que detém basicamente dois ativos: 1) Vale, principalmente através da sua participação na Valepar (80% do VPL) e 2) uma participação de 5,25% na CPFL Energia, que atualmente está avaliada em R$ 970 milhões. Assim, boa parte do valuation da Bradespar está baseado nos ativos da mineradora, com o desconto por não representar diretamente o papel da Vale. Esse fator segue uma média histórica e, se esse valor se distancia para cima ou para baixo em relação à mineradora pode representar uma oportunidade de compra ou de venda para o papel da holding. 

O caso Bradespar
O caso da Bradespar tem sido curioso neste sentido. O gráfico abaixo mostra a relação de preço entre a VALE5 e a BRAP4 – na prática, a linha do indica com quantas ações BRAP4 se compra uma ação VALE5. No começo de 2015, a relação era de 1,4 vez mas, com a forte desvalorização dos papéis da holding a relação passou para 2,2 vezes. Em 2016, a relação passou a cair para cerca de 1,6, mas segue acima do observado no início do ano passado.

O aumento do desconto ocorreu principalmente por conta das preocupações dos investidores sobre a renovação do acordo de acionistas da Valepar. As discussões sobre a renovação do acordo de acionistas da companhia aumentaram em meio aos temores de que não houvesse renovação: o acordo, que começou em 1997 na privatização da empresa, expira em abril de 2017. Investidores temiam que uma eventual não renovação do acordo para o bloco de controle poderia levar à “reestatização” da companhia. A reestatização se daria com os fundos de pensão estatais assumindo o controle acionário da mineradora, em detrimento dos sócios privados Bradesco (BBDC4) e a japonesa Mitsui. Se o acordo de acionistas da Valepar vencer, a holding perde seu “prêmio de controle”.

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Contudo, o desconto da Bradespar tendo como base o VPL registrou agora o menor valor em seis meses e, em relatório, o BTG Pactual atribuiu a melhora marginal na política, em decorrência do processo de impeachment de Dilma Rousseff, com o seu afastamento e a entrada do governo interino de Michel Temer, como um motivo para tanto. Atualmente, calcula-se o desconto em torno de 47,5%, o que se compara à média de um mês de 51,4% e de 55,4% nos últimos seis meses. Em março, a média foi de 63,7%.  

“Em nossa opinião, a compressão recente sobre o desconto da Bradespar poderia ser parcialmente creditada à percepção de uma melhoria marginal no cenário político no país, na sequência do processo de impeachment. Por isso, alguns poderiam argumentar que isso reduzisse o ‘risco renovação da Valepar’ para os acionistas da Bradespar, que têm levado à muita especulação nos últimos meses”, afirma o BTG.

Os analistas do banco citam ainda a participação que a companhia detém na CPFL para explicar que a companhia, atualmente, possui uma situação relativamente confortável em relação à sua dívida frente a outras empresas do País. “É essencialmente justo dizer que a venda da participação da Bradespar na CPFL a preços de mercado (ou até mesmo com um ligeiro desconto) seria basicamente o suficiente para amortizar toda carga da dívida da empresa”, afirma. Mas o próprio BTG faz uma ressalva: não há informação de venda da CPFL atualmente sobre a mesa; “apenas acreditamos que este movimento seria bem recebido pelo mercado”. 

Conclusão, o que fazer com a ação?
Se o desconto entre Vale e Bradespar segue muito alto, cabe lembrar também que o investimento na holding só é bom se o investimento em Vale também for. E o BTG Pactual reforça cautela com a Bradespar justamente por conta do cenário para o preço do minério de ferro.

Enquanto a Bradespar está relativamente barata, com um desconto de 47% do NAV frente ao desconto entre 20% e 30% das outras holdings, este diferencial se refere a eventos pontuais e há pouca visibilidade para os papéis tendo em vista o timing/resultado. Porém, em relação estritamente à Bradespar, os analistas reforçam: “tudo depende das condições de renovação do acordo da Valepar e se haverá algum tipo de taxa para os players da empresa”.

Thiago Salomão

Idealizador e apresentador do canal Stock Pickers