Exterior pode reduzir ritmo, mas não evitará ânimo da bolsa brasileira em 2019
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*José Carlos Carvalho é economista-chefe da Paineiras Investimentos
Milton Friedman foi o primeiro a observar que a política monetária “opera com lags longos e incertos”. O desempenho recente da economia americana (principalmente no que se refere aos mercados) comprovou isto mais uma vez.
O Fed iniciou a alta nas taxas de juro americanas em dezembro de 2015. Paradoxalmente, este movimento se iniciou em um ambiente de afrouxamento das condições financeiras – redução dos spreads de crédito, alta nas bolsas, baixa volatilidade e até mesmo enfraquecimento do dólar ao longo de 2017. Foi apenas no início de 2018 que os efeitos contracionistas da política monetária apareceram e vêm se tornando mais intensos desde então – a exemplo da queda recente na bolsa americana.
As condições financeiras, anteriormente frouxas, se transformaram rapidamente num forte aperto monetário, o que pode levar a uma redução do crescimento americano em 2019. Embora não possamos afirmar que uma recessão é iminente, temos que lembrar que as duas últimas recessões começaram de forma semelhante – o furo da bolha da Nasdaq em 2000 e do Subprime em 2007.
No momento estamos passando por um processo de correção que não sabemos como irá terminar. Caso persista, sabemos que com a queda no preço dos ativos, os consumidores americanos se sentirão mais pobres e reduzirão o consumo. Se a percepção de desaquecimento se alastrar, o nível de investimento produtivo das empresas será afetado – por que investir mais, se há medo de que uma recessão esteja chegando?
De fato, essa piora generalizada nas expectativas de crescimento pode resultar em uma recessão. Felizmente o nível atual de crescimento da economia americana ainda é bastante elevado. Isso aumenta a probabilidade de que o processo que descrevemos acima resulte numa queda do crescimento sem que haja recessão no horizonte próximo.
Em resumo, estamos vendo na economia americana uma briga entre duas poderosas forças antagônicas: a força expansionista do pacote fiscal de Trump e a força contracionista da política monetária do Fed. Dessa briga devemos esperar dois prováveis desenvolvimentos ao longo de 2019. O Fed deve moderar o aperto monetário, o que contribuiria para a estabilização da economia americana. Por outro lado, o impulso fiscal deve perder força a partir de 2020, com a consequente piora das expectativas de crescimento. Certamente teremos volatilidade à frente!
A esse ponto cabe uma pergunta retórica: por que o Fed estava subindo as taxas de juro? A resposta é óbvia: como a economia americana estava crescendo acima do seu potencial e a taxa de desemprego estava abaixo da taxa natural, poderia haver uma alta na taxa de inflação num futuro não muito distante.
O objetivo declarado do Fed foi cumprido e a economia americana está no limiar de desaquecer. Por que a surpresa então? O motivo são os lags longos e incertos da política monetária. Quando “menos se espera” os efeitos cumulativos de três anos de alta de juros e contração do balanço do Fed aparecem. Como dizia Rudiger Dornbusch, o ciclo econômico nunca morreu de “morte-morrida” – foi sempre assassinado pelo Fed. Como argumentamos acima, ainda é cedo para decretar o fim deste ciclo.
Essa mudança no cenário internacional certamente configura, a princípio, um cenário adverso para as políticas acertadas que o Brasil promete adotar nos próximos meses e anos. Mas, apesar de requerer maior cuidado, esperamos que os mercados reajam bem no Brasil à retomada do equilíbrio macroeconômico. O Brasil está numa fase do ciclo completamente distinta dos demais países do mundo. Estamos saindo de uma profunda recessão com elevada capacidade ociosa e taxa de desemprego de dois dígitos. O resto do mundo se encontra perto do final do ciclo, com baixa capacidade ociosa e taxas de desemprego abaixo da taxa natural em vários países. Essa diferença já foi sinalizada em alguns mercados. O desempenho positivo recente da bolsa brasileira, se comparado à forte queda da bolsa americana no mesmo período, é um exemplo.
Outra diferença importante poderá ser vista na política monetária. O Brasil deverá observar um efeito similar ao americano, mas em direção diametralmente oposta. A queda na taxa de juro no Brasil – de 14,25% para 6,5% ao longo de 2017/18 – praticamente não levou a nenhum efeito significativo sobre o crescimento do PIB brasileiro até o momento. A incerteza eleitoral, a necessidade de retomar o equilíbrio fiscal e o consequente aperto de crédito dos bancos públicos certamente colaboraram para que a defasagem da política monetária fosse mais longa nesse ciclo.
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No entanto o novo direcionamento da política econômica no Brasil deve impulsionar o “animal spirit” empresarial e certamente fará com que o crescimento econômico brasileiro se acelere em consequência de todo o estímulo monetário do passado recente. Adicionalmente, com a perspectiva de um ajuste fiscal sustentado, deveremos observar uma queda ainda maior nas taxas de juro de longo prazo, potencializando o vento a favor da política monetária brasileira.
A bolsa brasileira pode se beneficiar de diversas maneiras desse novo cenário. O maior crescimento do PIB deve levar a uma alta nos lucros das empresas. Com os efeitos defasados positivos da política monetária no Brasil, é provável que a taxa de crescimento da economia surpreenda positivamente nos próximos anos, levando a uma geração de lucro das empresas acima daquela que é hoje esperada pelo mercado.
A bolsa também deve se beneficiar da queda nas taxas de juro de longo prazo, com a redução na taxa de desconto dos lucros futuros – em outras palavras, com menos juros teremos “múltiplos” mais altos. A perspectiva de privatizações e uma gestão eficiente das empresas estatais devem ajudar na boa performance da bolsa de valores.
A perspectiva de privatizações e retomada de um crescimento forte também deve intensificar a entrada de investimento estrangeiro no Brasil. Esse aumento deve se dar tanto pela via do investimento estrangeiro direto (FDI) quanto pelo investimento em carteira (bolsa e renda fixa). No passado o investimento em carteira no Brasil teve uma participação significativa em renda fixa em função de taxas de juro elevadas.
No futuro é provável que a participação do investimento em bolsa seja mais significativa – até mesmo pela redução nas taxas de juro no Brasil. Dessa forma, partindo de uma balança comercial superavitária acima de US$ 60 bilhões por ano e com um baixo déficit em conta corrente, uma aceleração do investimento estrangeiro no Brasil deve levar a uma apreciação do real.
Roberto Campos costumava dizer que “o Brasil não perde uma oportunidade de perder uma boa oportunidade”. De fato, ao descrevermos o cenário acima, é difícil não lamentar que toda a correção de rumo macroeconômico que está sendo feita agora não tenha sido feita antes, quando a liquidez internacional era abundante.
Mas, apesar do cenário internacional mais adverso, ainda há tempo para reverter o conjunto de desequilíbrios que fizeram a dívida pública crescer exponencialmente. A retomada do crescimento local certamente será o catalisador para o início de um ciclo virtuoso com externalidades positivas para diversos setores. O aumento da arrecadação e a melhora do desequilíbrio são algumas delas. O ambiente externo será um vento contrário que pode reduzir a velocidade do ajuste, mas certamente não alterará a direção.
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