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Eleições Americanas: “buy or sell”?

O mercado comprou a tese do Trump “paz e amor” e do impacto positivo de suas medidas econômicas.  O efeito para ativos Brasileiros (bolsa, câmbio e juros) foram negativos. Como se posicionar diante disso tudo?
Por  Cid Oliveira
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

 

“Judge a man by his questions rather than his answers.”, Voltaire 

“Julgue um homem por suas perguntas e não por suas respostas.”, Voltaire 
 
As implicações e desdobramentos fruto da eleição de Trump são de uma complexidade enorme. Não tenho a ambição de ter todas as respostas, mas me darei por satisfeito se os possíveis desdobramentos apontados fizerem o leitor refletir.  
 
Trump candidato versus Trump presidente 
 
A primeira pergunta que vem a mente é se o Trump presidente se comportará como Trump candidato. De tudo que ele falou e pregou durante a campanha quantas e quais medidas realmente serão levadas adiante? Quais terão apoio político? Ele delegará poder aos membros da sua equipe? Ele dará espaço para congressistas Republicanos participarem de seu governo? Como será sua relação com seus oponentes, confrontador ou conciliador? 
O discurso da vitória em conjunto com as declarações recentes do Trump presidente mostram tom conciliador. O Trump presidente elogiou o jornal The New York Times, notadamente um de seus arquirrivais ao longo da campanha. Além disso, ele se posicionou contrario a uma caça às bruxas a Hillary Clinton, com relação aos escândalos dos e-mails e à relação “toma-lá-dá-cá” entre a Fundação Clinton e doadores no período em que ela era Secretária de Estado. Vale lembrar que no último debate da campanha presidencial o Trump candidato disse que se fosse presidente Hillary estaria presa. O mais surpreendente, entretanto, foi o que o Trump presidente disse a respeito do atual presidente Americano Barack Obama: 
“… I probably thought that maybe I wouldn’t, but I did, I did like him. I really enjoyed him a lot. I’ve spoken to him since the meeting.”, Donald Trump 
“… Eu pensei que talvez não gostaria dele, mas eu gostei, eu gostei dele. Eu realmente gostei muito dele. E tenho falado com ele desde o nossa reunião.”, Donald Trump 
Com relação às nomeações, o Trump presidente conseguiu agradar (ou desagradar) a gregos e troianos. Dentre as nomeações destaca-se Reince Priebus, tido como conciliador, como Chief of Staff. Entretanto, o procurador geral Jeff Sessions e o estrategista chefe Steve Bannon são conservadores de carteirinha com comprovado histórico anti-imigração.
 
Em resumo, existe uma enorme diferença entre o Trump candidato e o Trump presidente. O Trump presidente tem se mostrado mais moderado e conciliador. Dito isso, as nomeações do núcleo de seu governo mostram que ele mantém intacto valores conservadores. Tanto ele quanto seu time estão cientes do mandato populista anti-imigração e anti-livre-comércio que lhe foi dado pela classe trabalhadora Americana.  
 
Plano Econômico de Trump e seus impactos 
 
As bases e diretrizes do plano econômico de Donald Trump foram apresentadas no final de Setembro de 2016 pelo documento “Scoring the Trump Economic Plan: Trade, Regulatory & Energy Policy Impacts”, Peter Navarro e Wilbur Ross. O plano propõe medidas que terão impactos positivos e negativos para o crescimento econômico dos EUA. O resultado desta queda de braço é o que importa para os investidores. 
O mercado comprou a tese do Trump “paz e amor” e do impacto positivo de suas medidas econômicas: redução de impostos, desregulamentação, redução no custo de energia e investimento em infraestrutura. A bolsa americana se valorizou de forma significativa, o dólar se valorizou frente às demais moedas do mundo e as taxas dos títulos da dívida americana aumentaram. Este é o efeito da volta da inflação sendo precificado pelo mercado. Como consequência, ativos de risco no resto do mundo sofreram quedas como contrapartida dessa valorização do dólar e desvalorização dos títulos do governo americano. Por essa razão a bolsa no Brasil caiu, o Real se desvalorizou e as taxas dos títulos do governo Brasileiro aumentaram. 
O mercado não parece preocupado com possíveis desdobramentos negativos que a prometida renegociação dos acordos comerciais possa trazer para a economia mundial.
Das duas uma, ou o mercado acredita que Trump “paz e amor” não levará a cabo a renegociação dos acordos comerciais (NAFTA e com a Ásia), ou que o resultado desta renegociação, se houver, será marginal para comércio e fluxos de capitais globais. 
Num mundo que, nas últimas três décadas, passou por uma intensificação da globalização, acordos comerciais entre nações são de uma importância ímpar. Impactos de um potencial aumento de impostos de importação e barreiras alfandegárias seriam de enorme extensão: passando por investimento estrangeiro direto, fluxos financeiros, cadeias produtivas globais, nível de equilíbrio entre moedas, demanda por combustível (petróleo), entre outros. Apesar de ainda estar cedo para se ter uma clara definição dos impactos que uma onda global nacionalista traria, uma coisa é certa, teríamos uma configuração diferente do que o mundo se acostumou nos últimos trinta anos. 
Em 1928, as vésperas da Grande Depressão, Hebert Hoover foi eleito presidente americano sob uma plataforma eleitoral calcada na promessa de aumentar tarifas alfandegárias sobre produtos agrícolas para defender os produtores locais. Os maiores parceiros comerciais dos EUA da época responderam rapidamente aumentando as tarifas de importação de produtos americanos além do estabelecimento de quotas. O resultado do contágio dessa guerra de tarifas comerciais é bem conhecido de todos nós: a intensificação da maior crise econômica da história recente. Não quero deixar a entender que o resultado das renegociações comerciais da administração Trump trará uma depressão como a de 1929. Entretanto, ter como premissa que esse processo de renegociação não terá o menor impacto no comércio e crescimento global é otimista demais.
   
Outro ponto de atenção é a falácia de que maiores déficits governamentais geram maior crescimento econômico mesmo diante abundante evidência empírica do contrário. Na verdade, inúmeros estudos acadêmicos mostram que quando dívida sobre Produto Interno Bruto (PIB) é maior que 50%, estímulos governamentais trazem impactos negativos para crescimento, e não o contrário. Quando esse nível passa de 70% – caso dos EUA no momento – o efeito negativo no crescimento ganha contornos não-lineares, ou seja, se torna negativo com mais intensidade.  
Por fim, vale a reflexão sobre o impacto das novas medidas econômicas sobre a inflação. Intuitivamente, as medidas propostas são inflacionarias. Aumento de imposto sobre importação, restrição alfandegária, investimento em infraestrutura aumentam a demanda por trabalho, que por sua vez pressionam o preço da mão-de-obra.  
Dito isso, depois da crise de 2008 a taxa de participação da população empregada sobre o total da população caiu vertiginosamente nos EUA. Hoje esta taxa encontra-se em 63%. Na Alemanha, que tem uma pirâmide demográfica similar aos EUA, essa taxa está próxima de 80%. Se houver um aumento pela demanda por trabalho nos EUA, as pessoas que hoje estão fora da força de trabalho não seriam atraídas a voltar ao mercado? Será que o cidadão de mais idade e aposentado não seria atraído pelos novos empregos para complementar sua renda? Se isso for verdade, haveria impacto negativo no preço da mão-de-obra como consequência da maior oferta de trabalhadores.  
O que dizer do impacto do recente avanço na tecnologia (robótica, inteligência artificial, biotecnologia entre outras) na produtividade? Será que uma fábrica na China com 100 funcionários não pode ser substituída por uma instalação de 10 funcionários nos EUA?  
Não quero dizer que as medidas econômicas de Trump não impactarão positivamente a inflação, mas colocar em perspectiva fatores deflacionários que podem impactá-la negativamente. Importante será a resultante dessas forças econômicas inflacionarias e deflacionarias.  
 
Conclusão 
 
O mercado financeiro reagiu à eleição de Trump dando mais peso aos impactos positivos para crescimento nos EUA das medidas econômicas propostas. Entretanto, impactos negativos para crescimento e inflação estão sendo negligenciados.
 
Diante deste pano de fundo, o Brasil encontra-se em uma posição mais confortável que outros países emergentes por ter uma economia mais fechada. A mudança política recente (impeachment) e o avanço na aprovação das reformas apontam para um ambiente favorável para ativos Brasileiros (bolsa, câmbio e juros) no médio e longo prazo. Dito isso, no curto prazo vemos maior volatilidade no preço de ativos. A prudência sugere ter alguma munição guardada para aumentar alocação em bolsa e juros aplicados em momentos de maior volatilidade e pânico de mercado. 

Cid Oliveira Cid Maciel Monteiro de Oliveira CEO e sócio-fundador da startup invest.pro, Cid tem 18 anos de experiência, tendo atuado em instituições financeiras e gestoras no Brasil e no exterior. Graduou-se em Engenharia Civil pela UFRJ e concluiu mestrado em Finanças pela Manchester University na Inglaterra

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