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100 anos de história do Brasil – e o futuro de Bolsonaro – em 1 gráfico

"É a economia, estúpido!", diz um famoso bordão da política americana, segundo o qual o bem-estar material da população é mais importante do que o falatório que rodeia a política. Com um gráfico, é possível mostrar como a política também tem regido a política na história do Brasil. O clichê dos americanos é muito útil para prever o que acontece por aqui. E o futuro de Bolsonaro não deve fugir à regra.
Por  Pedro Menezes
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Eu já escrevi textos sobre gráficos aqui no blog, mas nunca sobre um gráfico só. Mas acho que esse vale a pena. Com uma imagem, é possível entender uma das principais engrenagens da história brasileira – e, ao mesmo tempo, compreender o que mais importa para o futuro de Bolsonaro. Numa imagem, há mais informação do que em muitas páginas de livros. 

Se você é craque em ler gráficos, basta prestar atenção e boa parte do texto será dispensável. Caso o leitor tenha dificuldade com o assunto, fique tranquilo: a comunicação escrita resiste bravamente e, nas linhas abaixo, explico o gráfico e a relevância dele em maiores detalhes.

O gráfico

O PIB per capita, a renda média produzida num país num dado ano, é uma das melhores métricas que temos para o bem-estar material de uma nação. Portanto, o crescimento do PIB per capita é uma espécie de velocímetro do bem-estar nacional médio, um medidor dos avanços (ou retrocessos) num ano.

Pena que não dá pra entender muita coisa a partir de um gráfico da taxa anual de crescimento. Em 2009, o PIB per capita brasileiro caiu 1,34%; em 2010, cresceu 6,2%. Variações bruscas ano-a-ano tornariam o gráfico da taxa anual simples muito poluído, com uma linha subindo e descendo e atrapalhando a visualização dos padrões que importam.

Por isso, usei a taxa média de crescimento do PIB em 5 anos. Para o ano de 2018, por exemplo, o eixo y mostra a taxa anualizada de crescimento entre 2013 e 2018 – matematicamente, é a raiz quinta do crescimento total em 5 anos. Assim, é possível suavizar o gráfico e a análise fica mais precisa.

O gráfico vai de 1923 a 2023, abarcando 100 anos de história do Brasil – 95 anos do passado e 5 de projeções para os próximos anos. As projeções se baseiam num estudo do Ministério da Economia, que explico melhor na última parte do texto.

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Resumindo: a variável-chave do gráfico é o avanço ou retrocesso da renda média do brasileiro nos anos anteriores. E, como ficará claro na próxima parte do texto, essas idas e vindas são muito valiosas para entender a história política do Brasil.

Sem mais enrolação, eis:

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É a economia, estúpido: todos os “vales” de crescimento dos últimos 100 anos levaram a grandes mudanças jogo do poder

As economias costumam funcionar em ciclos de crescimento, como o do Brasil nos anos 2000, seguidos por pioras, como a crise recente. A taxa média de crescimento cai até atingir um piso, depois sobe até um pico, cai de novo e assim sucessivamente, de modo que o gráfico final parece ser formado por várias letras “v”, lado-a-lado, cada qual com uma forma.

Todos os “vales” de crescimento – ou seja, na parte de baixo de cada letra “v”, os maus momentos na economia – estão associados a grandes acontecimentos históricos que mudaram, ainda que parcialmente, os donos do poder.

É a visualização de um famoso bordão da política, muito bem resumido pela famosa frase de James Carville, estrategista da campanha vitoriosa de Bill Clinton à presidência dos EUA em 1992: “É a economia, estúpido!”. O grande determinante da força política seria o dinheiro, as variações na renda do cidadão médio.

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É possível contar boa parte da história do Brasil com o gráfico.

Nos primeiros 10 anos entre 1923 e 1933, a taxa média de crescimento do PIB brasileiro cai de quase 6% para menos de 0,5%. Não por acaso, a elite política naqueles tempos sofreu duros golpes. Os anos 20 começaram com revoltas contra a República Velha, como o tenentismo e a coluna Prestes. Após a crise de 1929, veio a Revolução de 1930 liderada por Getulio Vargas, que depôs os antigos donos do poder.

Os primeiros anos de Vargas foram de crise econômica e revoltas como a de São Paulo em 1932. Mas a economia voltou a crescer, aproximando-se novamente dos 6% ao ano entre 1932 e 1937. O ano de 1937 não representa apenas o auge econômico do primeiro Getúlio: naquele ano, ele aproveitou a popularidade conquistada com os anos de crescimento para implantar a ditadura do Estado Novo.

Mas a economia voltou a desacelerar na nova ditadura, chegando a um novo piso em 1942, o mais baixo do gráfico até o momento, chegando pela primeira vez a valores negativos. Foi também o início do fim para Vargas, que se enfraqueceu e saiu do poder assim que a Segunda Guerra Mundial permitiu.

O suicídio de Getúlio em 1954, assim como o golpe preventivo que garantiu a posse de JK em 1955, aconteceram num ‘vale’ de crescimento econômico, embora o nível do crescimento tenha sido bem alto no período.

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A situação começa a melhorar até 1959, mas então piora rapidamente. O PIB per capita brasileiro cresceu 7,5% em 1958 e caiu -2,5% em 1963. Essa rápida deterioração econômica nos conturbados anos de Jânio e Jango, que também vinha acompanhada por inflação crescente, foi fundamental para o golpe de 64.

A partir da ditadura, o padrão fica ainda mais claro. Desde o pico em 1973, a taxa média de crescimento em 5 anos teve quatro pisos: em 1985, 1992, 2001 e 2018. São os anos do final da ditadura, do impeachment de Collor e da eleição de Bolsonaro, além do ano que precedeu a derrota tucana contra Lula em 2002. Não pode ser coincidência.

O futuro de Bolsonaro

Como já disse, 5% do gráfico se refere a anos ainda incompletos, de 2019 e 2023. Só é possível falar do PIB per capita em anos futuros por conta de um estudo do Ministério da Economia sobre os impactos da reforma previdenciária no crescimento do PIB. Por isso, as linhas estão tracejadas e em outra cor: tratam-se de outros dados, com outras fontes e outra natureza.

Já discuti esse estudo do Ministério da Economia noutro texto do blog. Para ler, basta clicar neste link.

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Mesmo que se discorde frontalmente das conclusões e premissas adotadas, os resultados podem ser vistos como os cenários otimista e pessimista para a economia brasileira.

No cenário da linha azul, a reforma da previdência é aprovada, as contas públicas voltam rapidamente ao superávit, os juros caem, investimento e emprego voltam. A linha vermelha representa o cenário oposto.

A grande conclusão que se pode tirar, na minha opinião, é que polêmicas vazias da ministra Damares, dos filhos do presidente ou de outros suspeitos habituais serão irrelevantes para o futuro político do presidente. O que importa é Paulo Guedes e a agenda de reformas.

Nenhuma estratégica de comunicação ou apelo a valores morais será eficaz caso o desemprego volte a subir. É isto o que importa.

Repare, leitor, em algo que quase não falei sobre o gráfico: os momentos de rápida aceleração. Grandes subidas levam a grandes personagens da história brasileira: Médici, Getúlio, JK, Lula e os outros recordistas de fotos em livros de história. O Bolsonaro da linha azul teria tudo nas mãos para entrar na lista.

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Já a linha vermelha seria o puro fracasso. Time de Dilma e Collor, que saíram por impeachment. Também o time de Sarney, Temer e FHC, que terminaram seus mandatos com a economia em queda e se tornaram tóxicos na eleição. Sem reforma, esse será Bolsonaro em 2022.

Não importa quanto os olavistas falem em resgatar a identidade moral do brasileiro, eles são secundários para o sucesso do presidente. Pelo contrário, é a reforma que se mostra fundamental para o sucesso deles. É a economia, estúpido!

Pedro Menezes Pedro Menezes é fundador e editor do Instituto Mercado Popular, um grupo de pesquisadores focado em políticas públicas e desigualdade social.

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