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Ciro Gomes: não entende de economia ou confunde os números por má fé?

Pagamos muitos juros - embora menor do que o truque de Ciro Gomes ou do seu erro conceitual grotesco –, porque o endividamento do Estado brasileiro é brutal, e não por uma escolha administrativa.  E por que é tão elevado? Porque o tamanho do Estado brasileiro é gigantesco e pagamos pela irresponsabilidade fiscal de governos passados.
Por  Alan Ghani
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Ciro Gomes, candidato à presidência da república, andou falando besteiras sobre economia. Como é bom orador e fala com convicção, muitos leigos embarcam no discurso do advogado metido a economista.

Ciro Gomes disse que as despesas da dívida pública representam metade dos gastos do governo. Mentira! A despesa financeira, ou seja, os juros, representou, em 2017, 340 bilhões de reais, enquanto o gasto primário do governo chegou a quase 1,3 trilhão de reais (relatório oficial aqui). Como demonstrou precisamente o economista Alexandre Schwartsman (aqui), o que Ciro Gomes faz é misturar os conceitos de despesa financeira (juro) com amortização de dívida, tratando-os como sinônimos, seja por ignorância ou por má fé, conforme observou Schwartsman.

Um exemplo ajuda a esclarecer. Quando pegamos um empréstimo de R$1.000 por 1 ano a 10% a.a, o pagamento referente à devolução do principal (R$1.000) é chamado de amortização. Os R$100 (10% de R$1.000) são os juros. O que Ciro faz é dizer, num jogo retórico, que pagamos R$1.100 de despesas financeiras como se fossem R$1.100 de juros. Entendeu o truque? Com isso, ao misturar os conceitos de juros com amortização, ele dá a entender que pagamos muito mais juros do que é mostrado no relatório fiscal do governo.  

Independentemente da falta de conhecimento de princípios básicos de economia e finanças, o que Ciro Gomes parece não entender é que pagamos muitos juros e amortizações, porque temos um elevado endividamento. E por que o endividamento é alto?  Porque o governo não consegue fechar as suas contas. De outra forma, a receita do governo advinda de impostos da sociedade não é suficiente para cobrir os seus gastos (saúde, educação, segurança, aposentadoria, juros da dívida, etc.). Assim, para cobrir este déficit, o governo empresta dinheiro da sociedade emitindo títulos públicos.

De fato, pagamos muitos juros – embora menor do que o truque de Ciro Gomes ou do seu erro conceitual grotesco –, porque o endividamento do Estado brasileiro é brutal, e não por uma escolha administrativa.  E por que é tão elevado? Porque o tamanho do Estado brasileiro é gigantesco e pagamos pela irresponsabilidade fiscal de governos passados.  

A elevada taxa de juros real da economia brasileira não é uma escolha para agradar banqueiro, mas uma consequência direta de desequilíbrios fiscais crônicos no país. Alguns dos seus eleitores e de outros candidatos de esquerda flertam com a ideia de calote da dívida pública, acreditando ingenuamente que o “default” se dará no banqueiro, e não na população brasileira.  Conforme afirmou para o InfoMoney (aqui) o economista do IPEA, Paulo Tafner, um dos maiores especialistas em finanças públicas do Brasil, “quem diz isso não conhece a composição da dívida pública”.

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Além dos próprios brasileiros, os bancos também são credores da dívida pública federal. Acontece que um calote da dívida não significa um calote na pessoa física do banqueiro, mas, no banco. O banco tem em seus ativos títulos públicos. Se, por acaso, o banco não receber o fluxo de pagamento deste ativo, o banco pode quebrar. Se o banco falir, o seu dinheiro em conta corrente ou em aplicações financeiras deixa de existir. Simples assim. Essa é apenas a consequência direta de um calote da dívida pública.

E quais seriam as consequências indiretas? Numa situação de calote, os investidores ficam temerosos em investir (emprestar) seu dinheiro. Sem poupança, não há crédito. Sem crédito, não há investimento por parte das empresas. Sem investimento, não emprego. Sem emprego, não há renda.  Advinha que arcará com essa consequência? 

Alan Ghani é PhD em Finanças pela FEA-USP com especialização nos EUA (UTSA), economista e professor de pós graduação.

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Alan Ghani É economista, mestre e doutor em Finanças pela FEA-USP, com especialização na UTSA (University of Texas at San Antonio). Trabalhou como economista na MCM Consultores e hoje atua como consultor em finanças e economia e também como professor de pós-graduação, MBAs e treinamentos in company.

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