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Derrubando o clichê “tem que investir em educação”

Os investimentos em educação não Brasil não são pequenos, muito pelo contrário. Os números mostram que os investimentos em educação praticamente dobraram, mas nossos alunos continuam a ocupar as piores posições nos rankings internacionais de avaliação de ensino. Portanto, a pergunta chave a ser feita é: se os investimentos em educação são relativamente altos, por que os alunos brasileiros ocupam algumas das piores colocações nos rankings internacionais?
Por  Alan Ghani
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

“Tem que investir em educação” é uma das frases mais propaladas como solução para melhorar o Brasil.  A frase é quase como um mantra unânime: bastaria investir em educação e, pronto, todos os problemas brasileiros estariam resolvidos.

Acontece que essa frase não passa de um clichê por dois motivos básicos. Primeiro, porque o Brasil já investe uma parcela significativa do seu orçamento em educação. Segundo, porque geralmente quem fala essa frase não busca o seu próprio conhecimento, acreditando que “se educar” é um processo passivo, e não ativo. 

Os investimentos em educação no Brasil não são pequenos, muito pelo contrário. Conforme relatório da OCDE, os gastos com educação passaram a representar 8,3% do orçamento federal em 2018 contra 4,7% em 2008.

Os números mostram que os investimentos em educação praticamente dobraram, mas nossos alunos continuam a ocupar as piores posições nos rankings internacionais de avaliação de ensino.

Na comparação internacional, de acordo com o mesmo estudo, o gasto com educação no Brasil também é elevado em proporção do PIB (6%), ultrapassando países como Argentina (5,3%), Colômbia (4,7%), Chile (4,8%), México (5,3%) e Estados Unidos (5,4%).

Embora o número seja significativo, muitos argumentam que o investimento por aluno deveria ser maior. De fato. Mas não conseguimos magicamente colocar mais dinheiro na educação por uma razão básica: os recursos são escassos.

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Os recursos do governo advêm da arrecadação de impostos da sociedade. E o dinheiro dos impostos vem da incidência de tributos sobre a renda gerada na sociedade pela produção de bens e serviços finais (PIB). 

Acontece que a arrecadação do governo é limitada porque a renda gerada pela produção de bens em serviços também é finita. Assim, o governo tem um orçamento limitado e não tem dinheiro abundante para fazer o que  quiser. Como o orçamento é limitado, para investir mais em educação, deve-se cortar recursos de outras áreas, gerando o que os economistas chamam de tradeoffs.

Mas, mesmo diante dessa limitação orçamentária, os gastos com educação no Brasil não são pequenos, conforme apontou o relatório da OCDE (aqui). Portanto, a pergunta chave a ser feita é: se os investimentos em educação, no país, são relativamente altos, por que os alunos brasileiros ocupam algumas das piores colocações nos rankings internacionais?

Conforme os números mostram, a questão não é de quantidade, mas da qualidade do gasto educacional. No Brasil, há uma ênfase muito grande de direcionamento de recursos públicos para o ensino universitário, e não para a formação básica escolar. Acontece que a maior deficiência educacional, de acordo com o próprio estudo da OCDE, está na base, e não na formação universitária.

O problema se agrava, pois muitos alunos ingressam em universidades com deficiências básicas de interpretação de texto e matemática. Além disso, os cursos universitários das faculdades públicas formam centenas de alunos de profissões que não conseguem ser absorvidas pelo mercado de trabalho (filosofia e sociologia, por exemplo).

De outro modo, as universidades geram pessoas que se tornaram muito mais tomadoras do que doadoras do sistema. Não se trata de ser contra essas áreas do conhecimento, pelo contrário, mas entender que há um excesso de recursos públicos (seu dinheiro) para campos deficitários para a sociedade. Pior, conforme argumentado por Theodore Dalrymple, por vezes, é necessário encontrar posições no governo para acomodar pessoas formadas nessas áreas por absoluta falta de mercado. 

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Se o problema está na base, por que existe este fetiche com o estudo universitário? Essa valorização excessiva de profissões intelectualizadas, em vez da formação de técnicos por exemplo? O fenômeno parece ser mundial e, inclusive, essa hipervalorização academicista  é criticada por intelectuais de peso, como Thomas Sowell  e Nassim Taleb.

Outro ponto que chama a atenção é a crença de que basta colocar mais dinheiro numa área e, de repente, todo mundo passa a ser mais inteligente e produtivo, e o país passa a se desenvolver.

O psiquiatra Theodore Dalrymple mostra em seu livro Podres de Mimados que as melhorias nos níveis educacionais em alguns países africanos, como  Tanzânia, Guiné Equatorial e Congo, não contribuíram em nada para o desenvolvimento econômico desses países. Isso não quer dizer que a educação não seja importante, pelo contrário.

O que o livro mostra é que colocar dinheiro apenas na educação, desprezando outros fatores como agricultura, infraestrutura etc., não levou ao crescimento econômico nos países analisados.

É óbvio que, nas nações mais ricas, o nível educacional é maior. No entanto, deve-se avaliar a eficiência do gasto educacional, ou seja, o quanto de retorno ele trará para a sociedade.

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Em outras palavras: aumentar os gastos educacionais não significa necessariamente elevar o nível educacional da população, tampouco é garantia de desenvolvimento econômico, principalmente quando a política educacional não leva em conta outros fatores como a infraestrutura, a agricultura etc.    

Curiosamente, as pessoas que propagam a frase “tem que investir em educação”, como saída para todos os males, desconhecem esses números e esses fatos. Pior, acreditam que educação é um processo passivo, e não uma conquista pessoal.

No mundo de hoje, todo mundo quer fórmulas prontas e pouca dedicação. No entanto, o processo de aprendizado é o oposto disso; pressupõe abdicação, esforço pessoal, aceitação, enfrentamento de suas próprias limitações e convivência angustiante com a dúvida, entre outros aspectos.

Não basta simplesmente colocar mais dinheiro na educação, se não houver um ambiente cultural de valorização do conhecimento, que desperte nos alunos o apreço pelo conhecimento, independentemente de títulos, rótulos ou incentivos financeiros.

Se tem dúvida, basta ver a quantidade de gente com dinheiro, com acesso à informação – aliás, hoje cada vez mais fácil e barata devido à internet – e que são as primeiras a trocar uma prazer imediato (horas no Instagram, por exemplo)  pela leitura de um bom livro. Diante dessa triste realidade, só podemos constatar que a frase “tem que investir em educação” é apenas uma clichê vazio, uma necessidade de afetação de pseudo-intelectualismo com bom mocismo, nada mais que isso.

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Alan Ghani É economista, mestre e doutor em Finanças pela FEA-USP, com especialização na UTSA (University of Texas at San Antonio). Trabalhou como economista na MCM Consultores e hoje atua como consultor em finanças e economia e também como professor de pós-graduação, MBAs e treinamentos in company.

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