Foreign Affair: deficiências estruturais minam trajetória de crescimento do Brasil

Publicação aponta dependência de commodities, juros altos e infraestrutura como umas das "falhas" da política brasileira

Marcel Teixeira

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SÃO PAULO – Após The Economist e Wall Street Journal, a publicação internacional Foreign Affairs é mais uma a mostrar cautela em relação à economia brasileira, ao apontar algumas deficiências estruturais do país que podem minar sua trajetória de crescimento.

Até recentemente investidores e especialistas eram praticamente unânimes em sua visão otimista para o Brasil, se tornando como parâmetro de responsabilidade financeira entre os países emergentes durante o governo Lula, afirma a Foreign Affaris. Conter a inflação ao mesmo tempo que reduzir suas dívidas, a boa resposta à crise de 2008, crescente entrada de estrangeiros no mercado de capitais doméstico e o crescimento médio da economia de 4% ao ano desde 2007 são alguns dos fatores apontados que contribuíram para construção dessa imagem positiva.

Entretanto, este conceito vem mudando com o difícil momento da economia global e as políticas econômicas adotadas pelo governo do país, entre elas, a certa dependência do mercado de commodities. “O país tem crescido em grande parte em conjunto com a crescente demanda por suas reservas de petróleo, cobre, minério de ferro e outros recursos naturais. O problema é que o apetite global por esses produtos está começando a cair. Se o Brasil não tomar medidas para diversificar e aumentar o seu crescimento, pode cair em breve com eles”, constata a publicação.

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Dependência da China
O elevado crescimento chinês na última década e suas dimensões continentais fizeram com que o país se tornasse um dos maiores consumidores de commodities e também um “alvo” para as exportações brasileiras. Em 2009, a China ultrapassou os EUA como principal parceiro comercial do Brasil.

Neste cenário, a publicação norte-americana afirma que a dependência da China deve afetar o Brasil, uma vez que a economia chinesa vem dado sinais de arrefecimento e os investimentos estrangeiros em países emergentes tendem a ficarem mais escassos em uma época de menor crescimento econômico por todo o mundo.

Juros altos: uma faca de dois gumes
Nos últimos dez anos, os mercados globais desenvolveram o desejo de investir em países emergentes, particularmente naqueles dos quais a China estava adquirindo fornecimento de energia e recursos naturais, aponta a Foreign Affairs. “Com uma democracia estável, o Brasil parecia um investimento seguro, com o descobrimento de bacias de petróleo ao longo de sua costa adicionando brilho a essa figura”, aponta.

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Apesar do momento positivo, a postura cautelosa brasileira também trouxe problemas para o país. Para proteger sua população do turbilhão econômico que assolava o mundo no final do século XX, o Brasil desenvolveu duas políticas: altas taxas de juros para controlar a inflação e um Estado de bem-estar social.

“Altas taxas de juros dificultam o crescimento do país por tornar muito caro para fazer qualquer coisa no Brasil. Elevadas taxas atraem capital estrangeiro, mas o fluxo de investimentos tem impulsionado o valor do Real, fazendo com que virasse uma das moedas mais caras do mundo. Ao mesmo tempo, Real caro aumenta os preços das exportações brasileiras, afetando a competitividade desses produtos no mercado global”, aponta a Foreign Affairs como um dos principais efeitos dessa política.

Pesada carga tributária
A adoção do Real encerrou a espiral de superinflação brasileira, mas não eliminou a vulnerabilidade à inflação regular, graças ao antigo vício brasileiro de gastos públicos excessivos, segundo a Foreign Affairs, fazendo com que o trauma da era pré-Real aprofunda-se o compromisso do país em investir no bem-estar social.

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Programas como o Bolsa Família, criado no governo Lula, foram implementados. Entretanto, na tentativa de garantir esses direitos garantidos pela Constituição à população, o governo tentou aliviar a carga financeira sobre os cidadãos associando o aumento dos salários aos aumentos dos preços, gerando um “ciclo vicioso”, avalia a publicação dos EUA.

“Desde a época da hiperinflação, o governo brasileiro financiou esta crescente rede de segurança pelo aumento das despesas como parte da economia do país. Assim, o governo se comprometeu com essa expansão com o aumento de impostos. A pesada carga tributária deixa as empresas com menos dinheiro para investir em nova formação, tecnologia e equipamentos, comprometendo a eficiência empresarial brasileira”, conclui.

Infraestrutura e educação deficitárias
“A falta de investimentos em infraestrutura é uma razão importante pela qual a economia brasileira é tão letárgica e cara”, afirma a publicação, que aponta a falha na simples tarefa de construir estradas e portos, como uma das principais razões para a perda de produtividade da indústria do país.

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No âmbito da educação os gastos menores do que os necessários resultaram em uma escassez de mão de obra especializada. “Como resultado, embora o desemprego esteja abaixo de 6%, as empresas reclamam que não têm escolha a não ser contratar candidatos desqualificados. Nos setores industrial e de serviços, a falta de engenheiros e técnicos já está comprometendo a economia”, complementa a publicação.