Relojoeiro e costureira: jovens não se interessam por profissões técnicas

Elas perderam o glamour e os profissionais em início de carreira preferem ganhar menos em cargos administrativos

Flávia Furlan Nunes

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SÃO PAULO – Se, no passado, uma relojoaria era mantida por uma família por gerações, hoje esse ciclo já é quebrado. Isso porque profissões técnicas, como a de relojoeiro e costureira, que eram vistas com glamour, não atraem mais o interesse dos jovens. Eles preferem ganhar menos em cargos administrativos a encará-las.

Embora nenhuma estatística sobre o assunto tenha sido levantada, o desinteresse é facilmente notado em locais como o Centro de Solidariedade do Trabalhador (CST), mantido pela Prefeitura de São Paulo. Dados mostram que, das 2 mil pessoas que passam por lá procurando emprego diariamente, somente uma se interessa pelo tipo de cargo. Os mais requisitados são os administrativos, de telemarketing e motoristas.

“Chamo de ‘eiros’ as vagas que não conseguimos preencher, que são para açougueiros e padeiros, e ninguém quer. Não importa o salário. Tenho uma vaga há um ano para peixeiro, com salário de R$ 1 mil por mês e nenhuma exigência escolar, mas não consigo preenchê-la”, disse o gerente do posto do CST, Enoch Romano, de acordo com o Diário do Comércio.

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Conforto e glamour

Ainda segundo Romano, os jovens preferem ganhar R$ 400 por mês em uma sala com ar-condicionado. “Não pensam em concorrência nem no desenvolvimento para se manter nessas funções”. São ofertadas aproximadamente 20 mil vagas no CST em administração e telemarketing, mas elas não são preenchidas facilmente.

Para o superintendente da Fecap (Fundação Escola Álvares Penteado) e especialista em sociologia do trabalho, Luiz Guilherme Brom, a percepção dos jovens muda com o tempo e as profissões que antes eram consideradas glamourosas perdem o brilho, como as de contador e secretária executiva.

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O fato é que essas mudanças podem causar excesso de mão-de-obra. Conforme o superintendente, com base em dados do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), do Ministério da Educação, apenas 27% dos formandos em comunicações social conseguem trabalhar na área.

Interesse

As tendências das carreiras podem ser analisadas pelas inscrições nos vestibulares. “Algumas profissões viram moda por um período, como já aconteceu com publicidade. É o caso também de turismo, que teve um boom há alguns anos – chegou a 63 candidatos por vaga no ano de 2000 na Fuvest – e hoje está em decadência – 18,53 candidatos por vaga”, disse Brom.

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As profissões menos glamourosas do momento têm recolocação garantida. Segundo o superintendente, todos os alunos de contabilidade conseguem trabalhar na área, antes mesmo de concluir o curso. “É também uma questão de propaganda. O que os jovens acreditam ser sucesso é o que fazem. Depois, muitas vezes mudam de opinião ou não conseguem vaga e acabam migrando para outras funções”.