Mercado torce por PEC desidratada e pode ter “voo de galinha” no rali de fim de ano, diz Mollica, do Opportunity

Diante das incertezas, casa está sem posição em juros e acredita que melhor aposta agora é na queda do dólar contra o real

Bruna Furlani

Marcos Mollica, gestor do Opportunity Total. Crédito: Divulgação

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As semanas de intensa negociação ficaram para trás e a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição foi protocolada no Senado nesta segunda-feira (28) sem grandes novidades. Após uma disputa de discursos, o foco agora estará na dificuldade que o novo governo eleito demonstrou em termos de articulação para aprovar o texto, na avaliação de Marcos Mollica, gestor do fundo multimercado Opportunity Total.

“Existe uma dificuldade de articulação. O mercado está enxergando que vai ser difícil aprovar a PEC do jeito que ela está. Ela deve ser desidratada consideravelmente. Agentes estão se apegando a isso”, diz o gestor ao InfoMoney.

Não à toa, o dia seguinte à entrega do texto é marcado pela queda dos juros futuros e pelo recuo do dólar, na avaliação de Mollica. Se o texto tivesse trazido novidades e o novo governo eleito tivesse maior capacidade de virar o jogo e aprová-lo da forma como está, ele acredita que o mercado poderia voltar a piorar.

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As dificuldades de negociação ficaram explícitas, especialmente depois que o governo demorou cerca de duas semanas para protocolar o texto definitivo no Senado com poucas novidades em relação à minuta apresentada por Geraldo Alckmin, vice-presidente eleito, semanas antes.

A versão apresentada agora inclui uma autorização para gastar pelo menos R$ 198 bilhões acima do teto por ano, valor que engloba despesas com o novo Bolsa Família e investimentos públicos. No novo texto, o governo também limita o período de retirada do novo Bolsa Família por quatro anos, a partir de 2023, e não mais por prazo indeterminado.

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Outra mudança está na permissão para usar até R$ 22,9 bilhões de excesso de arrecadação com investimentos apenas a partir de 2023, e não mais a partir deste ano.

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“A PEC em si está dizendo muito pouco. Esse conteúdo já foi analisado [pelo mercado]. A conclusão é que é um valor muito alto e ruim do ponto de vista da credibilidade fiscal”, afirma o executivo, ao destacar que o aumento do risco fiscal poderia reverberar para o câmbio e a desancoragem das expectativas de inflação.

Na avaliação de Mollica, um gasto extra entre R$ 80 bilhões e R$ 100 bilhões já seria suficiente para cumprir algumas promessas de campanha como a renovação do novo Bolsa Família de R$ 600 por mês, com adicional de R$ 150 por filho menor de seis anos, além do reajuste do salário mínimo.

“É suficiente. É palatável para o mercado. Mesmo se fosse o outro governo que tivesse ganhado a eleição, isso já iria ocorrer de qualquer jeito. O mercado sacodiria a poeira e seguiria em frente”, afirma. Para ele, o problema está em valores muito acima de R$ 150 bilhões, caso de agora, em que o cenário fica mais negativo.

De qualquer forma, Mollica avalia que há espaço para “agradar” os agentes , que estão em “compasso” de espera para ver como começa a tramitação da PEC.

Próximo Copom

Embora a proposta possa sofrer desidratação, como acredita Mollica, as projeções de economistas consultados pelo Banco Central no Relatório Focus apresentam piora desde a apresentação da PEC. Nesta semana, o ponto médio das estimativas para a inflação em 2023 estava em 5,02%, acima dos 5,01% vistos na semana passada e dos 4,94% registrados um mês antes.

Também houve piora nas projeções para a Selic do ano que vem, que agora estão em 11,50% ao ano, acima dos 11,25% vistos cerca de um mês antes, conforme o último Focus.

O gestor afirma que a piora das projeções de inflação tende a colocar uma pressão sobre o Banco Central, com a expectativa de uma retomada das altas de juros no ano que vem. A poucos dias da próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, ele observa que a autoridade monetária deve trazer um discurso bem duro, em linha com o que Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, tem sinalizado.

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“Ele já vai dar o recado que uma piora muda o quadro. Vai manter a porta aberta para a possibilidade de retomar altas. O cenário é incerto, ele [BC] não vai querer se comprometer”, alerta Mollica, que diz que o Copom também vai enfatizar que o balanço de riscos está mudando.

Para o gestor, se tudo ocorrer bem e a PEC for desidratada, prevendo gastos extras em torno de R$ 80 bilhões a R$ 100 bilhões, o BC ainda tem chance de reduzir os juros a partir do segundo semestre do ano que vem. Porém, não é possível descartar que o rombo seja maior. Por essa razão, ele prefere não fazer projeções para a Selic no ano que vem.

Isso porque o gestor alerta que a casa está em processo de revisão de vários indicadores macroeconômicos, mas que aguarda uma definição sobre a PEC para divulgar os novos números.

Sem posição em juros e de olho no fortalecimento do real

Com dificuldade de mensurar qual deve ser a direção para os juros no ano que vem, Mollica diz que está sem posição nessa classe de ativos nos fundos da Opportunity atualmente.

O gestor explica que, um pouco antes das eleições, a casa estava com uma alocação aplicada (que se beneficia do recuo) em juros do Brasil. Após o período eleitoral, com a piora do quadro fiscal, a gestora chegou a montar uma exposição tomada (que aposta na alta) em juros, mas afirma que se desfez da alocação recentemente.

“Mesmo com uma PEC mais enxuta, vai ficar um problema de credibilidade [fiscal]. Acho que vai ser difícil o BC cortar os juros”, pondera.

Com o olhar mais cauteloso sobre os juros, o gestor acredita que a melhor aposta no momento é na queda do dólar contra o real. Mollica vê o carry (carrego) como favorável. A posição é montada juntamente com uma alocação que se beneficia da queda da Bolsa brasileira (vendida).

Isso ocorre porque a expectativa de que a Selic permanecerá elevada por mais tempo alimenta a entrada de dólares de operadores de carry, que tomam empréstimos em dólares para investir em títulos brasileiros de maior rendimento. Esse movimento tende a favorecer o real frente ao dólar.

“Estamos com uma posição neutra em Brasil, vendidos em dólar e na Bolsa brasileira. Acreditamos que tem um diferencial de performance e um ganho com o diferencial de juros”, destaca.

Rali da Bolsa

Para ele, o viés é negativo para a Bolsa, que deve ser afetada por um cenário de juros elevados e grandes incertezas na China. Nesse sentido, o profissional acredita que a chance para que haja um rali de fim de ano é menor em 2022. “Se tiver, vai ser voo de galinha. Vai ser um rali de alívio porque o mercado eliminou os cenários mais extremos”, avalia.

Do ponto de vista externo, Mollica diz que o cenário não é muito construtivo, porque a perspectiva é de desaceleração da economia global e há problemas na China com a imposição de restrições contra a Covid-19.

Já do ponto de vista local, ele destaca que as taxas longas devem ficar pressionadas e isso deve pesar sobre a atividade, mesmo que seja aprovado um pacote mais enxuto com a PEC, o que deve penalizar a Bolsa local.

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Enquanto isso, no portfólio internacional, a casa diz que diminuiu as posições tomadas em juros e acredita que o Federal Reserve (Fed, banco central americano) está entrando na última “milha” do ajuste monetário, fazendo com que a taxa terminal encerre o ano que vem entre 5% e 5,25%.

Ao mesmo tempo, a casa está com posições vendidas em Bolsa americana, porque acredita que as expectativas de lucro ainda não são condizentes com a desaceleração esperada para a atividade econômica do País.

Apesar de ter se desfeito de posições aplicadas em juros no Brasil, Mollica conta que a casa iniciou exposição aplicada em países já próximos do fim do ciclo de aperto, caso de Canadá, Austrália, México e Chile.